Dependência de transferências oficiais acentua o cenário crítico

Gramado tem a melhor gestão fiscal do Estado e a sexta do País

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Gramado tem a melhor gestão fiscal do Estado e a sexta do País
Entre os melhores e os piores desempenhos do ranking no Estado é possível identificar o calcanhar de Aquiles das contas públicas: a elevada dependência de transferências. Esse é um ponto que, com o contexto econômico desfavorável como o atual, compromete as finanças de maneira devastadora. Por outro lado, municípios que conseguem obter um nível adequado de receitas próprias tendem a enfrentar o momento com um pouco mais de tranquilidade.
O melhor exemplo do quanto esse aspecto faz diferença na realidade municipal é Gramado, primeiro IFGF do Estado e o sexto no ranking nacional. Polo turístico, a cidade da Serra gaúcha tem buscado manter contínua a geração de receitas próprias durante todo o ano, explica o prefeito Nestor Tissot. Além de evitar a dependência de repasses, o gestor reforça que também evita ficar refém do fluxo turístico, situação que levou a prefeitura a adquirir, por exemplo, um centro de eventos. "Estamos usando esse espaço e fomentando a realização de congressos e feiras para manter a receita em um nível contínuo."
A origem das receitas próprias são os tributos de competência municipal, como IPTU, ISSQN, ITBI, além de taxas e contribuição de melhoria, esclarece a secretária da Fazenda municipal, Sônia Molon. "A receita própria de nosso município alcança um alto índice, algo em torno de 60% da receita total", dimensiona. Ela frisa que a equipe econômica busca não desprezar ou desperdiçar receitas.
"Trabalhamos cada tributo, individualmente, melhorando os processos e com investimentos principalmente em ferramentas de controles, softwares de cruzamento de dados, como o mapeamento das receitas de cartão de crédito, que alavancaram o ISS, além do treinamento das equipes, contratação de pessoal qualificado e investimentos na estrutura fazendária", detalha.
O empenho no combate à sonegação fiscal, sobretudo em meio à recessão, tem gerado efeito positivo na arrecadação própria, sublinha. "Nossa bandeira é aumentar a base de contribuintes, e conseguir desta forma o crescimento das receitas, sem precisar aumentar impostos." Tissot reforça que também foi feito um mapeamento das construções para a base do IPTU e que os tributos em áreas nobres foram corrigidos.
Para o gestor, que está em seu segundo mandato, um detalhe faz a diferença na gestão: a presença de funcionários de carreira à frente das secretarias, algo que é buscado pela administração municipal. Um exemplo, cita, é a própria secretária da Fazenda. "Ela é extremamente competente, não é quadro político. Nunca militou."
Gramado se destacou no índice como município com gestão fiscal de excelência, obtendo pontuações elevadas, sobretudo, em receitas próprias e investimentos. Em 2014, o município investiu em infraestrutura R$ 16 milhões (12% do gasto total), demonstra Sônia. No ano passado, o aporte em infraestrutura foi dobrado, alcançando R$ 33 milhões.
Na outra ponta do estudo da Firjan, cidades com gestão fiscal crítica sofrem com a incapacidade de investir, e ainda dar conta dos gastos correntes. É o caso de Dezesseis de Novembro, município gaúcho com a pior colocação estadual. O secretário da Fazenda da cidade, Diego Aloísio Hilgert, recebeu a notícia com surpresa, mas apresentou pontos que justificam a classificação.
Entre o final de 2014 e o início de 2015, a administração municipal pagou um precatório de R$ 500 mil. "Isso impactou muito nas nossas contas", cita. A receita corrente líquida da cidade, em 2015, foi de R$ 10,87 milhões. Quase metade desse valor (46%) foi usada para pagamento com pessoal.
"Quando foi assumido o mandato, não existia taxa de lixo, foi tudo implantado agora", argumenta. Dezesseis de Novembro tem 28 anos e uma população de 3 mil habitantes, composta, principalmente, por pequenos produtores, que vivem da produção de alfafa. O desafio, demonstra Hilgert, é cobrar os impostos em um município "pequeno e pobre".
Para completar, os repasses estão em queda, acrescenta. "Mais de R$ 600 mil não vieram para área da saúde e, para manter as necessidades essenciais, estamos usando nossos recursos." A projeção para 2016 é de que este ano será encerrado em situação ainda pior do que em 2015. "Acho que vai piorar, pelo fato de os repasses estarem vindo atrasados."

Gasto médio com pessoal atingirá teto da LRF até 2020

Com a gestão fiscal em declínio, tem aumentado o número de prefeituras que já não conseguem nem mesmo adequação às exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Nesta edição do estudo, 740 cidades ultrapassaram o teto de 60% da receita líquida corrente no gasto com pessoal, ferindo a LRF.
Atualmente, a média nacional é de 54,1%, percentual que, observando a trajetória identificada na série histórica, nos próximos cinco anos atingirá o teto da LRF, quando mil prefeituras romperão o limite estabelecido. "No Rio Grande do Sul, 57 prefeituras estão fora da Lei de Responsabilidade Fiscal", detalha o economista Jonathas Goulart sobre a realidade estadual.
O chefe de estudos econômicos da Firjan apresenta outro descumprimento à Lei de Responsabilidade Fiscal: 815 municípios brasileiros não foram avaliados porque até 12 de julho não haviam declarado as contas à Secretaria do Tesouro Nacional. Outras 65 cidades foram excluídas do estudo por inconsistências nas informações prestadas. No Rio Grande do Sul, 16 prefeituras não haviam enviado os dados, e três ficaram de fora do levantamento por dados incompletos ou inconsistentes.
A LRF, em seu artigo 51, determina que os municípios brasileiros devem encaminhar suas contas públicas até o dia 30 de abril do ano seguinte ao exercício de referência, a partir de quando o órgão dispõe de 60 dias para disponibilizá-las ao público. A reportagem do Jornal do Comércio entrou em contato com a STN e constatou que apenas 2.740 municípios (49,2% do total) enviaram e homologaram as declarações no prazo. Em geral, no decorrer dos próximos dias e meses, essas entregas vão sendo feitas. A reportagem consultou, nesta quinta-feira, a base de dados da STN e identificou que o número de declarações feitas chegou a 4.833. Assim, 735 cidades ainda não cumpriram com a obrigação.
A STN explica que "o descumprimento do prazo, impedirá, até a regularização, que o ente da Federação receba transferências voluntárias e contrate crédito, exceto os destinadas ao refinanciamento do principal da dívida mobiliária".
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