Diretores de presídios pedem demissão após documento vazar

Expediente interno citava possibilidade de mortes, motins e rebeliões por falta de pessoal

Por Isabella Sander

Pelz diz não ter condições de garantir uma segurança mínima diante de tal crise
A situação nunca esteve tão precária no sistema prisional gaúcho. De dezembro de 2015 para cá, a população carcerária aumentou em 5 mil presos, chegando ao recorde de 34,2 mil detentos e gerando necessidade de infraestrutura maior. O efetivo de agentes penitenciários, por outro lado, não mudou.
Até o mês passado, o impasse estava sendo parcialmente sanado com o pagamento de horas extras para que os servidores atuassem em mais atividades. Contudo, a verba prevista para o semestre foi zerada e, em junho, os serviços serão reduzidos ao mínimo, diminuindo, na mesma proporção, a segurança da sociedade. Diante da situação, diretores de penitenciárias pediram demissão.
Nesta quinta-feira, a Associação dos Monitores e Agentes Penitenciários do Rio Grande do Sul (Amapergs) divulgou um expediente interno vazado da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe). O documento, escrito pelo diretor do Departamento de Segurança e Execução Penal (Dsep), Mario Pelz, era remetido à superintendente do órgão, Marli Anne Stock.
No texto, Pelz afirma que, sem as horas extras, não haverá condições de levar os apenados a audiências e que atendimentos sociais, pátios de sol, visitações e escoltas hospitalares não serão realizados ou ficarão prejudicados. O diretor fala, ainda, que o quadro pode ser de "catástrofe do sistema prisional, com mortes, motins e rebeliões". O pedido de demissão dos diretores de 10 penitenciárias veio na tarde desta quinta-feira. Entre as justificativas está a "inviabilidade total de gestão", gerada pela falta de recursos, o que compromete a segurança.
O recurso do governo do Estado destinado às horas extras dos agentes penitenciários para este semestre foi de R$ 11,7 milhões. A média mensal gasta pela Susepe, porém, foi de R$ 2,6 milhão, para cerca de 60 mil horas. Entre janeiro e abril, foi possível quitar os pagamentos. Entretanto, a folha de maio será apenas 50% paga, e não sobrará nem um real para os serviços de junho.
Pelos cálculos do diretor do Dsep, seriam necessárias pelo menos 67,7 mil horas extras "para a manutenção de razoável ordem nos presídios e (ainda assim) precária apresentação de audiência e escoltas hospitalares". Para melhorar os índices, as horas extras precisariam aumentar para 71,3 mil, o equivalente à força de trabalho de 443 servidores.
Hoje, a Susepe possui 3.775 agentes penitenciários para cuidar de 104 casas prisionais e 34,2 mil presos. A média de um agente para cada nove detentos é muito inferior à recomendada pela Organização das Nações Unidas (ONU) e pelo Ministério da Justiça, de um agente para cada cinco apenados. O déficit é de 2.911 servidores. 
Segundo nota divulgada pela Susepe, além das horas extras, já está em tratativas a abertura de um novo concurso público, e estuda-se a implantação de videoconferências, para melhor aproveitamento dos recursos públicos, bem como economia e agilidade nas apresentações judiciais.

Amapergs denunciará situação à Organização Internacional do Trabalho

O presidente da Amapergs, Flavio Berneira, reivindica resposta do Estado, como a abertura de concurso público, complemento das horas extras e revisão da maneira como as audiências do Judiciário são feitas. "Nesse quadro, a suspensão de atividades é essencial, pois a Susepe está colocando em alto risco seus servidores, os presos e a sociedade em geral, pois as audiências são feitas fora dos presídios", destaca.
A entidade pretende levar à Organização Internacional do Trabalho (OIT) denúncia sobre a situação no sistema prisional, considerada pelos sindicalistas como "um barril de pólvora". "Os agentes estão levando a instituição nos ombros, trata-se de uma catástrofe anunciada", define Berneira.
Pelz explica que relatou de forma fidedigna, no expediente interno, todos os riscos possíveis, do mínimo ao máximo. A Susepe, através da Secretaria Estadual de Segurança Pública, aguarda autorização da Secretaria Estadual da Fazenda para suplementação da verba para horas extras. "Isso ocorrendo, faremos a distribuição nas cadeias", garante.
Ao final do documento, o diretor do Dsep anuncia que não tem condições de proporcionar o mínimo de segurança diante de tal crise. No entanto, evita falar que deixou o cargo à disposição.