Custos e gargalos do transporte no Brasil

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Um cenário sintético dos desafios logísticos, seus custos e gargalos no Brasil passa obrigatoriamente por três aspectos surgidos na história de desenvolvimento do País e seu modelo socioeconômico:
- Concentração de regiões produtoras e demandantes.
- Custo da estrutura x valor da mão de obra.
- Baixa competitividade multimodal.
Concentração de regiões industriais e de população
A histórica concentração populacional e industrial no Sudeste (com mais de 40% da população e 55% do PIB) é um fator de peso na dinâmica econômica brasileira. Como consequência, a maior parte da produção sai dessa região para ser distribuída em todo o País. Se agregarmos o Sul, a fatia do PIB vai a 65%.
Chamamos esse fluxo de distribuição de radial, porque ele se espalha a partir de um centro, sem permear ou interligar todo o País.
Não obstante a falta de estrutura logística, essa configuração econômica traz uma questão: o caminhão que "sobe" para outras regiões carregado de produtos de alto valor agregado (eletrônicos, alimentos, cigarro, combustível etc.) tem poucas opções para um retorno rentável - a maioria volta com pescado, sal ou grãos, dependendo da região.
Como resultado, um ciclo difícil de quebrar: poucos operadores para atender regiões menos rentáveis, e fretes altos para sair do eixo Sul-Sudeste.
Se compararmos com os Estados Unidos - mencionado aqui por conta das dimensões similares ao Brasil -, encontraremos um modelo cruzado. Embora nos EUA a concentração populacional seja maior na Costa Leste, na Oeste encontramos o estado mais rico do país e do mundo (o PIB californiano é maior do que o brasileiro); o Texas (e sua produção de combustível) no meio do caminho ao Sul; Detroit, em forte recuperação no Nordeste; e cinturões agrícolas no meio do país, entre outras características que ajudam a irradiar as demandas por transporte e logística.
Custo da Estrutura x Valor da Mão de Obra
Se pegarmos um Centro de Distribuição, não necessariamente novo, de uma grande rede varejista norte-americana, encontraremos 100 baias para carga e descarga, sendo que 30 estarão livres. Por aqui, um CD construído nas décadas passadas terá 10, 20, 30 docas, todas ocupadas e dezenas de caminhões na fila (com um custo de R$ 30,00 a R$ 60,00 por hora parada).
O que ocorreu nos EUA foi trabalhar com cenários e demandas futuras - investiu-se na estrutura uma única vez e, quando a alta vier, ela já estará pronta para absorver o crescimento. Assim, ocupa-se esse lugar com mão de obra, bastante valorizada, somente com a demanda existente.
No Brasil, era comum construir para prover a demandava do momento, talvez um pouco mais - o custo alto para estruturas frente ao valor muito baixo da mão de obra fez com que a busca por produtividade focasse no trabalho manual ou braçal.
Resumindo, enquanto lá era mais barato construir do que pagar salários para caminhoneiros parados e operários em excesso, aqui a conta ficava menor colocando mais funcionários em instalações menores - muitas vezes atualizadas ou ampliadas com "puxadinhos" - e motoristas aguardando em fila.
Saia do CD rumo à costa brasileira e verá a mesma situação nas estradas congestionadas e nos próprios portos. Afinal, se o Brasil possui, segundo dados do Ministério dos Transportes (informações de dezembro de 2014), 1,7 milhão de quilômetros de estradas, vale destacar que, de acordo com o próprio ministério, somente 9,5 mil quilômetros estão duplicados, sem contar as não pavimentadas.
Porém, o custo da mão de obra triplicou nos últimos anos, fazendo do modelo pouca estrutura x trabalho humano intenso inviável. Talvez por isso a situação estrutural esteja dando sinais de mudança. Grandes CDs são vistos no interior do País, além de alguma movimentação nos portos - ainda que a situação das estradas continue a mesma em sua grande maioria.
Baixa competitividade multimodal
Além dos fatores apontados como formadores do alto custo com mais frequência - impostos, preço de combustíveis, pedágios, seguros -, existe a falta de competitividade entre diferentes modais.
Tivéssemos uma estrutura hidroferroviária mais desenvolvida, veríamos uma maior pressão por custos melhores. Exemplo: enquanto em outros países o custo de um frete ferroviário chega a ser 40% menor do que no caminhão, aqui essa diferença não passa de 5%, porque os trens têm muita demanda e pouca capacidade para atender tanta carga.
Essa falta de competição afeta o próprio transporte rodoviário, uma vez que menos concorrência multimodal tem como
consequência maior inércia desse segmento, fazendo com que players se desenvolvam menos que o possível, estancados por um cenário que não muda.
No curto prazo
Em ambientes em que a complexidade se dá pelos fatores listados acima, a solução encontrada para desfazer o nó do transporte é o aumento da produtividade pela gestão e controle. Não podemos mais deixar as movimentações de cargas à própria sorte, acreditando que os obstáculos e riscos são intransponíveis ou impossíveis, ao menos, de mitigar.
Posto isso, o desafio do gerenciamento logístico é enorme, assim como seu papel. Cabe a ele lubrificar essa engrenagem um tanto emperrada do transporte brasileiro, fazendo com que custos altos e gargalos deem lugar a previsibilidade, custos adequados e motoristas cumprindo padrões. Há diversos meios e modos de fazê-lo, mas isso é assunto para uma próxima oportunidade.
Engenheiro, diretor de Operações da AngelLira, empresa especializada em gerenciamento de riscos e de logística do Brasil (www.angellira.com.br)

Nova Lei dos Motoristas triplicou uso de drogas pelos profissionais

Uma operação realizada na Central de Abastecimento de Mato Grosso do Sul (Ceasa-MS) e no posto da Polícia Rodoviária Federal (PRF) da BR-163 apontou que 33% dos caminhoneiros submetidos aos exames toxicológicos usaram algum tipo de droga, com prevalência para a cocaína. Quanto aos motoristas testados na Ceasa, constou-se 56% de positividade. Os exames ocorreram nos dias 6 e 7 de outubro e foram realizados pelo Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul (MPT-MS) com apoio da PRF, do Instituto de Análises Laboratoriais Forenses (Ialf) da Secretaria de Segurança Pública do estado e do laboratório americano Labet.
Em comparação com dados obtidos antes da sanção da nova Lei do Descanso (Lei nº 13.103/15), houve um aumento de resultados positivos para uso de drogas, o que reflete a precarização das condições de trabalho de motoristas a partir da nova legislação. Os testes de queratina, realizados a partir da coleta de cabelo e pelos, constataram ainda que mais de 80% dos caminhoneiros usuários de cocaína possuem perfil de dependentes químicos.
O procurador do Trabalho Paulo Douglas de Almeida Moraes ressaltou a grave conclusão apontada no exame. "Os testes demonstram que a nova legislação legitimou a negação da dignidade dos motoristas, na medida em que uma expressiva parcela destes trabalhadores precisa usar drogas para suportar a desumana carga de trabalho dela exigida. Os motoristas representam uma categoria reduzida à condição análoga à de escravo, em especial daqueles motoristas que transportam carga viva e perecíveis."
O teste de queratina atende à Lei nº 13.103/15, que regulamentou as condições de trabalho dos motoristas profissionais e prevê a realização de exames toxicológicos com período mínimo de detecção de 90 dias para substâncias psicoativas que causam dependência ou comprometa a capacidade de direção.
Segundo Moraes, a realização de testes toxicológicos associados à exigência de sobrejornada é uma perigosa contradição.
"As alterações na legislação promovidas através dessa lei representaram retrocesso sem precedentes para os direitos trabalhistas. A nova legislação, em termos práticos, autoriza a jornada de até 12 horas diárias e, em diversas hipóteses, não há qualquer limite de jornada."
Ele finaliza esclarecendo que as novas regras desvirtuaram a Lei nº 12.619/2012, que ficou conhecida como "Lei do Descanso", que assegurava aos motoristas tempo maior de repouso, vedação do pagamento por comissão e efetiva limitação de jornada.