Um dos municípios mais afetados no Estado pelas enxurradas de maio, Canoas, na Região Metropolitana, ainda tem 471 pessoas que dependem de abrigos seis meses depois da principal tragédia climática do Rio Grande do Sul. É a cidade com maior número de pessoas ainda fora de casa no Estado. Destas, 180 estão abrigadas no Centro Humanitário de Acolhimento (CHA) Esperança, no bairro Igara, conhecida popularmente como "cidade temporária". Inaugurado em julho, o local tem capacidade de acolher até 850 pessoas.
O Centro Esperança tem mais de nove mil metros quadrados de área total. As estruturas foram montadas em forma de tendas, que abrigam instalações habitacionais e complementares. Há 122 dormitórios distribuídos em quatro alas: grupos familiares, homens, mulheres e a ala LGBTQIA .
Ao longo do dia, são ofertadas três refeições por dia, além de um lanche da tarde. Os abrigados podem retirar itens como roupas, toalhas, cobertores, fraldas, itens de higiene, água, produtos de limpeza, ração para animais e alimentos, como leite em pó, conforme necessidade.
O local de acolhimento conta também com saneamento básico, energia elétrica, Wi-Fi gratuita, assistência médica e social, atividades de integração e apoio psicológico. Também são ofertados serviços de mutirões de documentação para recuperação e orientação acerca de documentos perdidos nas enchentes, cadastro para vagas e entrevistas de emprego, oficinas culinárias para crianças e adultos, cursos de empreendedorismo. Foram promovidas, também, ações voltadas para prevenção à violência baseada em gênero, exploração sexual e acolhimento familiar.
Local para os abrigados tem espaço destinado para as crianças
THAYNÁ WEISSBACH/JC
O local vai receber mais pessoas nos próximos meses. Isso porque o Centro Humanitário de Acolhimento Recomeço, que fica próximo à passarela da Refinaria Alberto Pasqualini, no bairro São Luís, será desativado e as 291 pessoas serão transferidas para o Esperança - a data ainda não foi divulgada. O funcionamento dos CHAs Esperanças e o Vida foram renovados até junho, segundo a Organizações Internacional para as Migrações (OIM) da Organização das Nações Unidas (ONU), entidade que gere o local.
A equipe do Jornal Cidades visitou o CHA Esperança nesta segunda-feira (25). Além da higiene adequada, há espaço para circulação harmoniosa para os passantes no local. Entre as problemáticas apontadas pelos moradores estão o calor, que dificulta a vida sobretudo à noite. Por causa disso, nos CHAs Vida e Esperança, foram instalados 15 climatizadores evaporativos verticais, e está sendo feito resfriamento duas vezes por dia, em dias de calor excessivo, do teto da estrutura com jatos de água, em parceira com o Corpo de Bombeiros, de acordo com a OIM. A organização também aponta que realizada a duplicação dos exaustores, ampliando a capacidade de exaustão do ar quente nas tendas principais.
Desalentadas, famílias pedem por maior celeridade do Estado
Casal Roger e Franciele teve casa totalmente alagada no bairro Harmonia
THAYNÁ WEISSBACH/JCO casal Franciele da Silva Diniz, que está grávida de seis meses, e Roger Cruz Valasco, junto com as filhas, residem no Centro Humanitário de Acolhimento Esperança. A casa onde a família morava, no bairro Harmonia, foi tomada pelas águas em maio, chegando até o teto. A família perdeu todos eletrodomésticos e móveis da casa.
"Não deu três horas e encheu tudo de água. E nós fomos para a escola Marechal Rondon e depois ficamos dois meses com a minha irmã ", relembra Roger. Depois disso, foi possível o retorno para a limpeza da residência. Neste tempo, Roger ficou desempregado e o dono do imóvel solicitou a rescisão do aluguel. Com isso, eles foram para o Centro Humanitário assim que foi aberto, em julho.
Franciele está em gestação de alto risco, o que dificulta a inserção de Roger no mercado de trabalho. O marido precisa acompanhar frequentemente a esposa para consultas médicas ou o cuidado com as crianças, que têm 14 e dois anos. "Nossa única renda é o Bolsa Família. Na semana passada, passei mal fui para o hospital e ele ficou cuidando das crianças. Ele perdeu dois serviços de carteira assinada porque tenho problemas constantemente (por conta da gestação). A gente tem parente, mas não temos a ajuda deles nesses momento", conta Franciele
Outro morador que almeja conseguir a sua residência própria é José Homero, que perdeu a moradia, bens e o comércio próprio nas enchentes na Praia do Paquetá. "Eu tenho 63 anos e tinha aum patamar de vida bom, com o meu carro, a minha casa e o meu bar. Agora, não tenho mais nada, tenho dificuldade em dormir r frequentemente eu tenho que ir para UPA", relata Homero.
Já outros beneficiários Bruna e José (nome fictício) que também perderam tudo nas inundações, reclamam da morosidade e falta de retorno do poder público. "O Paulo Pimenta (então ministro extraordinário da Reconstrução do RS) e o vice-governador, Gabriel Souza prometeram, em período de 90 dias, uma casa para os abrigados. E já faz meses que estamos aqui", reclama José.
Em nota, o governo estadual afirmou que não houve promessa de moradias. Todas as ações de habitação são feitas integradas com as demandas das prefeituras. A cidade de Canoas não recebeu moradias temporárias por ter o Centro Humanitário, segundo o Estado.
Centros Humanitários de Acolhimento devem ser encerrados junho de 2025
Além da Canoas, Porto Alegre também tem estrutura semelhante
THAYNÁ WEISSBACH/JCOs Centros Humanitários de Acolhimento (CHA) devem ser desativados nos primeiros seis meses de 2025, segundo a secretaria de Desenvolvimento Social do Rio Grande do Sul. Atualmente são 831 beneficiários no três Centro Humanitários de Acolhimento (CHAs), em Canoas e Porto Alegre. De acordo com o secretário de Desenvolvimento Social, Beto Fantinel, há uma articulação do Estado com as prefeituras e o governo federal para oportunizar residência fixa- aluguel social, estádia solidária ou compra assistida - para os atingidos pelas enchentes de maio.
Além disso, as pessoas mais atingidas pela catástrofe climática do Rio Grande do Sul são os moradores das camadas sociais mais baixas, o que agrava a situação, segundo Fantinel. "Quem mais perde mais são as pessoas mais vulneráveis economicamente e com menos rede de apoio", pontua o secretário
Beto Fantinel afirma que a pasta pensou nos Centros como uma forma de melhorar a dignidade das pessoas enquanto elas aguardam o aluguel social, compra assistida ou voltar para as suas residências". Em Canoas, a prefeitura enviou um projeto de lei para a Câmara de Vereadores na semana passada, a fim de aumentar em 500 os beneficiários do aluguel social. "A política de habitação não consegue responder com agilidade que a gente esperava. São várias circunstâncias que dificultam o encerramento dos abrigos. É desafiador", diz.