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Coluna

- Publicada em 06 de Julho de 2012 às 00:00

Leitura inovadora e entusiasmante de Cabaret


Jornal do Comércio
A temporada de Cabaret em Porto Alegre, graças à Opus, ocupando condignamente o palco do Teatro do Sesi, foi não apenas uma celebração e uma alegria, mas também uma grande e positiva surpresa.

A temporada de Cabaret em Porto Alegre, graças à Opus, ocupando condignamente o palco do Teatro do Sesi, foi não apenas uma celebração e uma alegria, mas também uma grande e positiva surpresa.

É evidente que, para todos os que haviam assistido e admiravam o filme de Bob Fosse, com a inesquecível interpretação de Liza Minelli, conhecer a versão teatral, produzida no Brasil, apresentava um evidente desafio: fazer com que o espectador conseguisse assistir ao espetáculo sem comparação para com o filme. E este foi o principal e definitivo desafio vencido pelo espetáculo dirigido por José Possi Neto, a partir do texto original de Joe Masteroff, com música de John Kander e Fred Ebb. Primeiro elemento positivo: a versão brasileira a cargo de Miguel Falabella. O texto flui, guarda rimas, mantém ritmo e dá uma outra compreensão ao espetáculo original. Segundo elemento positivo: a produção de Cláudia Raia e Sandro Chaim dão ênfase especial ao drama - isto é, à infelicidade que a chegada do nazismo traz aos indivíduos - e isso, a partir da história da própria Sally Bowles, vivida por Claudia Raia - diante de seu companheiro, o candidato a escritor Clifford Bradshaw, interpretado por Guilherme Magon, que teve a qualidade de se colocar num patamar específico de um personagem que, ao mesmo tempo em que conduz ações, também as sofre, e que, por isso mesmo, é altamente dramático. Numa espécie de ampliação do confronto que acaba se criando entre Sally e Clifford (a gente poderia dizer: mas Sally era assim, era assado...), vamos encontrar outro par de enamorados, mais velhos e vividos, mas nem por isso ela - marcada pelo medo - e ele, caracterizado por uma esperança ingênua: refiro-me à dona da pensão, Fraulein Schneider (interpretada por Liane Maya) e seu companheiro, o vendeiro Herr Schulz (um judeu) que, por sua condição étnica, acaba perdendo a namorada. É a partir destas duas situações, complementadas pela quebra de amizade entre Clifford e o jovem nazista Ernest Ludwig, vivido por Júlio Mancini, que a encenação teatral inverte completamente o padrão desenvolvido pelo filme.

Seja pela presença de Liza Minelli, seja pela leitura proposta por um bailarino, no caso Bob Fosse, o filme centrava na figura da cantora todo o seu desenvolvimento dramático. A peça, ao contrário, centraliza sua tensão nos próprios acontecimentos que são não apenas mostrados em cena mas também, especialmente, narrados pela figura de MC, interpretado por Jarbas Homem de Mello. E é a transformação desta figura, de um tipo leve e cínico, na abertura da peça, e sua modificação simbólica - na abertura do segundo ato, ele já se apresenta crítico e irônico e, então, quando a peça se encerra, ele se mostra com a roupa de prisioneiro, certamente, em um campo de concentração nazista - que nos permite uma leitura do texto em patamar superior e, por consequência, a centralização de todo o espetáculo, nem tanto na figura feminina, e muito mais nesta figura masculina, um patamar eminentemente político e crítico. É óbvio que os fãs de Cláudia Raia esperariam tê-la em destaque, e ela ocupa, evidentemente, um enorme espaço em todo o espetáculo. Mas, na verdade, dramaticamente, é a figura do mestre de cerimônias que nos dá a verdadeira dimensão de profundidade do trabalho e aquele que conduz a ação à reflexão mais consequente. E Jarbas Homem de Mello não se furta a dar ao personagem uma personalização radical e absoluta, que arranca aplausos e entusiasmo de toda a plateia.

Outras atrações, contudo, marcam este trabalho: a presença de uma maestrina (Beatriz de Luca) a comandar a orquestra; a qualidade de todo o conjunto de bailarinos e atores-atrizes; a direção musical de Marcon Araújo, verdadeiramente impecável; a extraordinária coreografia de Alonso Barros que, sem perder de vista algumas passagens de Bob Fosse, soube adequá-las ao espaço do palco; deve-se destacar, ainda, o aparato técnico de iluminação, soberbo, coordenado por Darihel Souza, além da equipe de cenografia, chefiada por Chris e Nilton Aizner, e os vistosos figurinos de Fábio Nataname, com destaque para alguns bons achados como a da macaca, no segundo ato, e as constantes substituições desses mesmos figurinos, com os personagens em cena, como ocorre ao final do espetáculo.

Enfim, um belíssimo espetáculo, maduro e afirmativo, que não nos deixou com saudades do filme.

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