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ENTREVISTA ESPECIAL

- Publicada em 16 de Abril de 2012 às 00:00

Mariovane prega diálogo com o TCE sobre projeto das multas


ANA PAULA APRATO/JC
Jornal do Comércio
O presidente da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul e prefeito de São Borja, Mariovane Weis (PDT), liderou, na semana passada, a manifestação dos prefeitos na Assembleia Legislativa contra o projeto de lei de autoria do Tribunal de Contas do Estado (TCE) que aumenta o valor das multas aos gestores que cometerem falhas administrativas. Mariovane sustenta que o texto apresenta vício de origem e espera que a proposição seja considerada inconstitucional pela Comissão de Constituição e Justiça do Parlamento. No entanto, sustenta que a Famurs deseja avançar com o TCE sobre o projeto.
O presidente da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul e prefeito de São Borja, Mariovane Weis (PDT), liderou, na semana passada, a manifestação dos prefeitos na Assembleia Legislativa contra o projeto de lei de autoria do Tribunal de Contas do Estado (TCE) que aumenta o valor das multas aos gestores que cometerem falhas administrativas. Mariovane sustenta que o texto apresenta vício de origem e espera que a proposição seja considerada inconstitucional pela Comissão de Constituição e Justiça do Parlamento. No entanto, sustenta que a Famurs deseja avançar com o TCE sobre o projeto.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, o presidente da Famurs reclama do que considera excesso de rigor do TCE para com os prefeitos. “Quem nos dá o exemplo do que se pode ou não fazer é o presidente da República e o governador. Muitas vezes eles fazem e são absolvidos. É contra isso que estamos nos insurgindo, esses dois pesos e duas medidas para uma mesma lei.”
Também fala sobre sua expectativa de que o governo Tarso Genro (PT) cumpra antes do término do mandato, em 2014, a promessa de destinar os mínimos constitucionais para a saúde e educação, respectivamente, 12% e 35%. O pedetista ainda projeta que a discussão da renegociação das dívidas do Estado poderá ser um tema levado à XV Marcha a Brasília, organizada pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM).
Jornal do Comércio - Que balanço faz da mobilização dos prefeitos com relação ao projeto de lei do TCE que aumenta o valor das multas aos gestores?
Mariovane Weis - Esse projeto de lei tem duas questões básicas. A primeira: ele é inconstitucional por vício de origem. Não poderia ser encaminhado pelo Tribunal de Contas, já que o órgão não é um poder independente como o Executivo, o Legislativo e o Judiciário; ele é auxiliar da Assembleia Legislativa e não tem autonomia para encaminhar esse tipo de projeto. Teria só em outras situações, quando for tratada a questão da organização interna do TCE, mas quando trata de questão externa ele não tem esse poder. A autonomia de propor multas, penas e ações liminares e cautelares é da Assembleia. Por isso, entendemos que é equacional e considerado ilegal, então não pode tramitar. Outro ponto é o fato de que o projeto interfere na autonomia dos prefeitos, dos municípios. A Constituição proporciona autonomia para os entes da Federação, aos três níveis de governo. Essa proposta intervém na gestão dos municípios.
JC – Então o problema não é o valor da multa?
Mariovane - A questão da multa é secundária. Para o atual nível de salário dos prefeitos aqui no Estado, as multas, ao preço que estão, estão de bom tamanho. Os prefeitos gaúchos, seguramente, são os que menos recebem no País inteiro. Na medida em que aumenta o valor da multa, vai haver um efeito cascata. Como vamos pagar uma multa maior recebendo menos? Não vamos mais ter pessoas dispostas a ser prefeito, pessoas de boa-fé, se continuar desse jeito. Ou essas pessoas vão querer ganhar muito mais para poder cumprir com as obrigações do cargo porque em quatro anos dificilmente um prefeito não será multado.
JC - Os prefeitos receberam muitas críticas por protestar contra um projeto que busca inibir a corrupção. Que avaliação faz da repercussão negativa?
Mariovane - Os prefeitos gaúchos são de boa-fé, bem-intencionados e premiados no Rio Grande do Sul e no Brasil por boas práticas de gestão. O que posso dizer é que 1% que se desvia desse caminho, mas o restante não pode pagar por essa minoria de péssima conduta. Não temos o que temer, não devemos nada, o essencial é que reivindiquemos a nossa autonomia, senão o prefeito não vai mais ter condições de administrar sem antes ouvir um auditor do TCE. Aquilo que era para se fazer em um ou quatro anos de mandato, nós vamos levar dez anos, vai burocratizar o sistema. Esse projeto não modifica em nada a questão da luta contra a corrupção, a lei que atinge os corruptos é outra, não é essa. Os prefeitos estãos sujeitos a todo e qualquer tipo de investigação, análise, acompanhamento e fiscalização. Somos fiscalizados pela própria comunidade que está na nossa porta todos os dias, afinal de contas, vivemos no município. Também há a Câmara de Vereadores, o Ministério Público, o Judiciário, as delegacias e procuradorias regionais do trabalho e, mais ainda, somos fiscalizados pelo TCE. Deixo uma questão: não vemos esse mesmo comportamento (do TCE) junto aos outros entes da Federação.
JC - Essa é uma queixa recorrente dos prefeitos, de que são mais cobrados do que o governador, por exemplo.
Mariovane - Por que não se tem o mesmo tratamento em nível estadual e federal? Quem nos dá o exemplo do que se pode ou não fazer é o presidente da República e o governador. Muitas vezes eles fazem e são absolvidos, não acontece nada com eles. É contra isso que estamos nos insurgindo, esses dois pesos e duas medidas para uma mesma lei. Se é valido para os prefeitos, tem que ser válido para os demais. Um rigorismo maior vai tardar as providências, as obras que a população está nos cobrando e exigindo. E não é um problema legal, todos os prefeitos querem e realizam suas ações com base na lei. Entretanto, a lei tem interpretações, a interpretação hoje pode ser diferente da de amanhã. Cito um exemplo: a interpretação do próprio TCE há cinco anos com relação à terceirização parcial de serviços na área da saúde era uma. Hoje, a mesma questão é vista com outros olhos. Há cinco anos, os prefeitos foram multados e penalizados e tiveram suas contas desaprovadas pelo TCE. De lá para cá, a lei não mudou, apenas foi alterada a sua interpretação.
JC - Esse enfrentamento com o TCE não pode ser prejudicial?
Mariovane - Todos os prefeitos tiveram esse tipo de relação de enfrentamento com os servidores do TCE, algum enfrentamento menor, outro maior. É normal acontecer isso. Entendemos que o TCE é uma grande instituição, com relevantes e inquestionáveis serviços prestados à realidade gaúcha sob aspectos legais, jurídicos e técnicos. Porém, a ideia que temos é de que, assim como o TCE tem esse conceito na sociedade gaúcha, os prefeitos também querem esse mesmo reconhecimento por conta das nossas ações. É o prefeito que está lá na ponta atendendo à comunidade, respondendo com menos recursos à solução dos problemas locais. Peço que haja um diálogo e um reconhecimento do nosso trabalho em favor das comunidades que dirigimos e representamos. É um esforço diário fazer o que precisa ser feito com 14% da arrecadação nacional de impostos, enquanto cabe ao Estado 27% e à Federação 59%. Temos que fazer mais com menos, e os outros entes, em especial o governo federal, podem fazer menos com mais, como explicar essa equação?
JC - É a chamada divisão do bolo tributário...
Mariovane – Em outros países, essa relação de impostos disponibilizados é muito maior para o município do que para a União, porque a vida acontece no município, é a nossa base. A obra no município é mais barata, acontece mais rapidamente do que se fosse licitada pelo Estado ou pela Federação. Tudo é mais ágil no município. E vamos tirar essa agilidade agora com um projeto (do TCE) que está tramitando na Assembleia? Vamos prejudicar as nossas gestões e os nossos administradores? É um projeto que não vem em boa hora, até porque os atuais prefeitos estão terminando os seus mandatos, concluindo as suas atividades, é uma mudança de regra no final do jogo que não poderia acontecer.
JC - A mobilização conseguiu sensibilizar os deputados?
Mariovane - Fomos muito bem recebidos pelo presidente da Assembleia, Alexandre Postal (PMDB), fomos bem recebidos pelo presidente da Comissão de Constituição e Justiça, Marco Alba (PMDB), e, de modo geral, por todos os demais deputados da Casa. Quero crer que a Assembleia vai ter uma posição institucional, legal e constitucional em relação à matéria. Esperamos que a CCJ considere esse projeto inconstitucional. A partir daí, abriremos um diálogo com o TCE. Queremos e vamos dialogar com eles para melhorar o nosso relacionamento e a nossa interpretação das leis e normas que regem a administração pública.
JC - A um mês da XV Marcha a Brasília em Defesa dos Municípios, organizada pela CNM, como está a mobilização?
Mariovane – Queremos reivindicar uma moção para que todos os estados cumpram imediatamente a Constituição no que concerne à disponibilização dos 12% do orçamento próprio para a área da saúde e 35% para a área da educação. São os principais pontos que a Famurs vai levar para Brasília. Vamos propor uma moção nacional com todos os prefeitos defendendo essa proposta. O Rio Grande do Sul ainda é o estado que menos destina recursos para a saúde, atrás de Goiás, por exemplo. E observe a forma como o TCE trata o Estado.
JC - Com menos rigor?
Mariovane - Sim. O TCE foi ao encontro de dois secretários do governo do Estado, o da Fazenda (Odir Tonollier) e o da Saúde (Ciro Sinoni), pedir para que o Estado se adequasse ao orçamento conforme determina a Constituição (o TCE pede que o governo estadual elabore um plano para excluir dos investimentos em saúde os gastos com saneamento). E isso vem sendo feito desde 2009. Para as prefeituras,  pede desde 2000, cobra e exige, daí a diferença de tratamento. Não é o mesmo discurso utilizado com o Estado. Desde 2004, todas as prefeituras gaúchas cumprem os índices; o Estado recém está sendo alertado com um tipo de aviso muito mais brando, infelizmente.
JC - O governo Tarso Genro (PT) promete se aproximar dos mínimos constitucionais até o último ano de gestão, 2014. De que forma essa demora prejudica os municípios?
Mariovane - As prefeituras estão fazendo a sua parte. Hoje investem não os 15% constitucionais na saúde, mas mais de 20% em média. Na educação, a mesma coisa, bem mais do que os 25% que são determinados. Esperamos que o Estado, ainda em 2012, atinja os índices mínimos constitucionais de 12% na área da saúde.
JC - Mesmo com as dificuldades financeiras?
Mariovane - Vejo a possibilidade de a equipe do governo do Estado encontrar uma solução e uma alternativa para a projeção dos 12% até 2014. As receitas estão melhorando, o Estado está progredindo, se reerguendo, a economia do País também está melhorando. Então, tem como achar uma solução, se não nos 12%, vai chegar bem perto, passando desse percentual em 2013. É a minha expectativa.
JC - E qual a expectativa com relação à renegociação da dívida do Estado? O governador pediu o apoio dos prefeitos.
Mariovane - Tinha que fazer uma auditoria dessa dívida, ela já está paga ou próximo disso, por tudo que o Rio Grande do Sul já fez de esforço para honrar essa obrigação. O Estado tem a total solidariedade dos municípios nesse debate. Se fosse investido tanto quanto se paga em parcelas desta dívida, o Estado seria outro hoje; e imagino que é isso que a União deseja.
JC - E de que forma a Famurs pode contribuir nesse debate?
Mariovane - Vamos levar esse assunto para a marcha. Temos que fazer uma renegociação desses valores direcionando os recursos para investimentos no Estado e nos municípios. É a nossa proposta, porque o governo federal já arrecada bem e muito mais do que nós, não tem motivo para cobrar uma dívida moralmente já paga com suor e sacrifício do povo gaúcho. Queremos que esse valor seja dividido meio a meio com o Estado e os municípios e seja exclusivamente destinado a investimentos prioritários. Esses recursos poderão, inclusive, ajudar o Estado a cumprir com a obrigação dos mínimos constitucionais.
JC - Que outros temas serão levados à marcha dos prefeitos?
Mariovane - Vamos cobrar da CNM uma posição unitária, para todos os municípios brasileiros, com relação à cobrança do ISSQN (Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza) sobre a operação de leasing, cartão de crédito e operações bancárias.

Perfil

Mariovane Gottfried Weis é natural de São Borja. Começou na política por influência da família - seu pai foi o primeiro presidente do diretório do PDT em São Borja - e acredita que também por influência dos ídolos políticos de sua cidade, os ex-presidentes Getúlio Vargas e João Goulart, o Jango, e o ex-governador do Estado Leonel Brizola. Na adolescência militou na Juventude Socialista do PDT. Apesar do vínculo com a legenda, por conta da legislação, só pôde filiar-se após completar 18 anos. Dois anos depois viria a ocupar a vice-presidência estadual da juventude do PDT. Deixou São Borja para completar o Ensino Médio. Cursou Economia na Pucrs, formando-se em 1990. Exerceu cargos de assessoria na Assembleia Legislativa e na prefeitura de Porto Alegre. Também teve uma empresa de consultoria e assessoria para investimentos, projeto que foi abandonado quando se tornou prefeito. Disputou um cargo eletivo pela primeira vez em 1996, elegendo-se vereador por São Borja. Foi reeleito em 2000. Concorreu e venceu a disputa pela prefeitura do município em 2004 e foi reeleito em 2008.
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