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Entrevista

- Publicada em 21 de Setembro de 2009 às 00:00

Candidatura de Marina forçará debate ambiental, avalia Rolim


Jornal do Comércio
Afastado da política há cinco anos, o ex-deputado e jornalista Marcos Rolim deixou o PT em 14 de agosto, por causa do desfecho da crise no Senado e pelo lançamento da candidatura da senadora Marina Silva (PV-AC) à presidência da República. Ele foi convidado por Marina para ser um dos novos integrantes da direção nacional do PV. Recusou, mas irá fazer campanha e ajudar no programa de Segurança Pública dos verdes. Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Rolim fala da importância da candidatura da senadora para a discussão política nacional, destacando que o meio ambiente entrará no foco do debate eleitoral de 2010. Também faz uma análise das mudanças no Partido dos Trabalhadores, do cenário político gaúcho e da cobertura da imprensa.
Afastado da política há cinco anos, o ex-deputado e jornalista Marcos Rolim deixou o PT em 14 de agosto, por causa do desfecho da crise no Senado e pelo lançamento da candidatura da senadora Marina Silva (PV-AC) à presidência da República. Ele foi convidado por Marina para ser um dos novos integrantes da direção nacional do PV. Recusou, mas irá fazer campanha e ajudar no programa de Segurança Pública dos verdes. Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Rolim fala da importância da candidatura da senadora para a discussão política nacional, destacando que o meio ambiente entrará no foco do debate eleitoral de 2010. Também faz uma análise das mudanças no Partido dos Trabalhadores, do cenário político gaúcho e da cobertura da imprensa.
Jornal do Comércio - Como ocorreu sua desfiliação do PT?
Marcos Rolim - Em 2004, após o mensalão, pensei em sair do PT, cheguei a comentar com alguns amigos. Esse comentário chegou aos ouvidos do (ex-governador) Olívio Dutra (PT), que me ligou e pediu para conversarmos. Disse que compreendia o que eu estava sentindo, mas garantiu que o problema seria enfrentado, que o PT daria a volta por cima e iria apurar as irresponsabilidades. Olívio estava assumindo a presidência do partido no Rio Grande do Sul. Esperei esses anos para que houvesse essa mudança, que não veio. Essa foi a razão de eu não ter saído antes.
JC - Por que agora?
Rolim - Houve dois episódios importantes: o primeiro foi a crise do Senado. O que Lula fez com a bancada e o que a bancada permitiu que fosse feito me mostraram que não tem mais jeito. O segundo elemento foi a candidatura de Marina à Presidência. Então, mandei uma carta a Olívio pedindo a minha desfiliação. Ele pediu de novo uma conversa. Claro que agora não foi para me pedir para ficar. Disse que entendia o que eu estava sentindo e que compartilhava com algumas das minhas inquietações. Não estou virando antipetista. Sou um crítico do PT, como sempre fui.
JC - Mas o PV também enfrenta problemas, é um partido sem bandeiras, deixou até de defender o meio ambiente.
Rolim - O PV é um partido pequeno, que não tem um perfil ideológico definido sequer em relação às questões ambientais. Há dentro do PV pessoas que são carreiristas e aproveitadoras. Enfim, é um partido com todos os problemas que os outros possuem. Há uma diferença, entretanto, de perspectiva. A entrada de Marina no PV se deu a partir de um acordo com a direção nacional: com a entrada da Marina, seria formada uma direção de 20 pessoas, sendo dez indicadas por Marina.
JC - O senhor foi convidado para ser “um dos dez de Marina”?
Rolim - Fui, mas disse que não poderia, porque não quero me filiar ao PV. Não tenho nenhuma pretensão de filiação a nenhum partido, porque não me identifico com nenhum. E não tenho pretensão política.
JC - E o PV?
Rolim - A direção do PV foi alterada. E nesse período que antecede as eleições, o PV vai mudar o seu programa. Então, o PV será refundado. E na campanha, Marina deve estabelecer um controle muito mais restrito a respeito das seções regionais do PV.
JC - Muitos ambientalistas comemoram a candidatura de Marina Silva porque a questão ambiental vai entrar na agenda política.
Rolim - O primeiro efeito da candidatura é promover o meio ambiente como um tema importante para o debate. Não tem sido. Mas talvez seja o tema mais importante do mundo hoje. Como produzir desenvolvimento sustentável? Como reformatar a ideia de crescimento econômico dentro de uma visão sustentável ambientalmente? Esse é um tema central do mundo.
JC - Que outras contribuições ela pode trazer à campanha?
Rolim - Primeiro precisa de uma política de alianças mínima, que lhe dê tempo de televisão, base e palanque nos estados. Tenho defendido que o PV e o P-Sol sejam aliados nessa campanha em todo o País. O apoio do P-Sol a Marina ajuda nessa definição ideológica mais à esquerda. O P-Sol tem tido um discurso muito importante no Brasil contra a corrupção. Isso vai ser incorporado à campanha dela, o que é muito importante.
JC - Então o PV seria refundado como um partido de esquerda?
Rolim - Seria um partido que atua à esquerda, no sentido em que atua na crítica a esse modelo que temos de economia, desigualdade e justiça. No Rio Grande do Sul, o PV deveria apoiar a candidatura de Pedro Ruas (pré-candidato do P-Sol ao Palácio Piratini). Não vejo razões para o PV lançar candidato ao governo.
JC - Além da política de aliança, que outras dificuldades Marina terá que resolver?
Rolim - Marina vai ter que modular o seu discurso, de tal forma que suas convicções religiosas não se misturem com a plataforma política. Admiro muito ela, pessoa de trajetória impecável - é uma mulher de bravura, garra e honestidade a toda prova. Mas temos uma diferença: não sou uma pessoa religiosa e ela é uma muito religiosa, da Assembleia de Deus. Disse pessoalmente a Marina - há um mês fui a Brasília especialmente para falar com ela - que as convicções religiosas não podem se misturar com a plataforma política. Porque o Brasil é um País laico e ela é candidata a presidente da República. Se essas coisas se misturarem, será um problema.
JC - Ou seja, mesmo sem filiação, o senhor ajudará na campanha dela?
Rolim - Vou ajudar, trabalhar nas horas vagas como militante na campanha de Marina. A menos que alguma coisa muito grave me afaste. Em princípio, ela é minha candidata e quero ajudá-la, assim como quero ajudar o PV.
JC - Qual será sua participação?
Rolim - Devo ter um papel preponderante na elaboração do programa de Segurança Pública, com outras pessoas como Luiz Eduardo Soares. A candidatura da Marina tem despertado uma simpatia imensa em diversos setores da intelectualidade. E o curioso é que também está muito presente na base mais popular da sociedade, desde as comunidade eclesiástica da igreja até o MST. Então, ela tem tudo para crescer.
JC - E ela tem condições de chegar ao segundo turno?
Rolim - Isso vai depender da campanha. Há no Brasil um espaço enorme para uma candidatura alternativa aos partidos tradicionais que seja séria e que tenha um programa coerente. A questão é: Marina será capaz de ocupar esse espaço? Acho que ela tem chance. Se ocupar esse espaço, vai ao segundo turno.
JC - O PMDB pode trair Lula e passar para a candidatura de Serra?
Rolim - Sim, é um risco que Lula corre. Se a candidatura de Dilma Rousseff (PT) não decolar, esse setor do PMDB pode migrar para uma candidatura alternativa. Há outro risco também: caso a candidatura de Dilma não consiga dar demonstrações de que pode, de fato, enfrentar Serra, o candidato de Lula será Ciro Gomes (PSB). É uma candidatura de reserva do Lula.
JC - Qual é a sua avaliação de Ciro?
Rolim - É um político muito competente, um quadro capacitado. Até que ponto ele seria um bom presidente não sei.
JC - E o PT hoje, neste cenário?
Rolim - Mudou para pior. Começa que o PT pela primeira vez apoia uma candidata a presidente da República (Dilma) que ele não escolheu. Passou meio batido isso, mas a próxima candidata do PT não foi escolhida pelo PT, (o presidente) Lula (PT) que indicou. Ele disse que ela será sua candidata e o PT respondeu: “Sim, senhor”. Porque o PT hoje é isso: diz sim, senhor, para tudo que o governo faz. É um partido que não tem debate. Não discute, há muito tempo, mais nada de relevante. É um partido que se burocratizou, virou uma máquina eleitoral, de fazer votos e apoiar candidatos.
JC - No quadro estadual, chegou-se a falar de uma aliança entre PT e PMDB.
Rolim - A direção nacional do PT sonhava com isso, porque o objetivo central é o projeto nacional. Então, se tivesse que sacrificar governos estaduais, sacrificaria. A aliança com o PMDB no Rio Grande do Sul seria totalmente inviável pelo histórico de confrontos. Nesse sentido, a posição do PT-RS não poderia ser outra.
JC - Foi radical?
Rolim - O PT-RS vem pagando um preço por uma postura muitas vezes muito crítica e pouco colaborativa. Isso talvez tenha isolado o PT no Estado. O partido na oposição costuma ser implacável. Mas, uma vez no governo, precisa de apoios e não consegue. É uma posição, às vezes extremada, que dificulta um pouco o trânsito do PT. Criou essa coisa do antipetismo. É muito ruim na política ter um movimento de pessoas que é contra um partido. Não fazemos política sendo contra ninguém. Isso é uma conquista desse radicalismo estúpido.
JC - Que lhe parece a candidatura de Tarso Genro ao governo?
Rolim - Entre as alternativas que o PT do Rio Grande do Sul tinha, a dele é de longe a melhor e a mais viável eleitoralmente. Tarso é uma pessoa muito qualificada, pode apresentar uma plataforma de governo responsável. Minha dúvida é até que ponto Tarso poderia, no Rio Grande do Sul, fazer um governo tranformador. Talvez ele esteja muito mergulhado naquilo que chamo de pragmatismo da política, que tem esses limites. Ele acaba acomodando as coisas ao invés de transformá-las. Mas reconheço em Tarso essa vontade. Se ele vai ser capaz de aglutinar as forças necessárias é outra discussão.
JC - Como o senhor avalia a situação do Estado?
Rolim - Estamos chegando no pior cenário possível, com absoluta falta de diálogo entre as principais forças políticas do Estado. Não é só uma discussão entre situação e oposição, é uma guerra de soma zero. Alguém tem que ser derrotado. Não há mais nem uma chance de diálogo. Há um governo que está sob o impacto de denúnias que são seríssimas de corrupção. E que vem tratando as denúncias como sendo um problema político.
JC - Qual é o problema?
Rolim - É de falta de seriedade. A sem-vergonhice chegou ao núcleo do governo. Isso desconstitui a possibilidade desse governo atuar com legitimidade. A rigor, a ação de improbidade administrativa do Ministério Público Federal foi a pá de cal no governo Yeda (Crusius, do PSDB). O governo acabou naquele dia. Agora vai sangrar até o último dia. E o Rio Grande do Sul não vai conseguir se mobilizar enquanto esse governo tiver sangrando. A grande saída seria a CPI na Assembleia, se ela conseguisse aprofundar a discussão e o conhecimento sobre as provas e, comprovadas as denúncias, decretasse o impeachment da governadora. Isso seria renovador para a política do Estado. Cumpriria, talvez, uma importância estratégica de zerar o jogo e recomeçar com novas bases.
JC - Por quê?
Rolim - Porque a maioria da Assembleia dá apoio à governadora, cujo compromisso não é com a verdade, mas com a sustentação política do governo. O PT tem toda razão nas denúncias que faz. O problema é que ele não faz isso quando é acusado em nível nacional. A postura é a mesma dos deputados daqui. Basta ver a CPI da Petrobras. Inclusive os argumentos são os mesmos: vai afastar investimentos.
JC - A governadora disputa a reeleição?
Rolim - Não acredito. Ela tem dito porque é um instrumento de defesa, mas a candidatura dela é inviável. Ela deveria disputar uma vaga para a Assembleia Legislativa. Para deputada federal acho que tem risco. A grande disputa (ao Palácio Piratini) ficará entre PT e PMDB.
JC - Qual sua avaliação da cobertura política na imprensa?
Rolim - No Rio Grande do Sul - genericamente, não quero dizer em respeito a todos os órgãos e jornalistas - há uma cobertura que chamo de padronizada: “Alguém acusa fulano de ser corrupto. O jornalista divulga que fulano acusou o outro de ser corrupto. Depois ouve o acusado e divulga que ele negou a acusação”. Esse tipo de cobertura é frágil porque transmite ao público a ideia de que em política todas as disputas são de versões. É papel da mídia investigar isso.
JC - Jornalismo declaratório...
Rolim - Sim, e aí ninguém sabe a verdade. O leitor fica se perguntando se roubaram ou não roubaram. Temos boas matérias investigativas no Rio Grande do Sul, mas são exceções. A regra tem sido o jornalismo declaratório.
JC - Como o senhor avalia os trabalhos na Assembleia Legislativa e no Congresso?
Rolim - Os oito anos que tive na Assembleia foram anos muito produtivos. Aprovávamos legislações importantes, havia uma agenda política própria que a Assembleia abraçava. Em todas as bancadas havia parlamentares qualificados, que pautavam o debate político no Estado.A Assembleia vem declinando na sua qualidade.
JC - Por quais razões?
Rolim - A tendência a cada eleição é que representantes menos qualificados sejam selecionados. Mas isso não é um problema da Assembleia, é de todos os parlamentos brasileiros, por conta das regras eleitorais. São basicamente dois problemas: voto individual, com candidatos proporcionais, e financiamento privado de campanha, que agencia a seguinte lógica: quanto mais ligado eu for como candidato aos interesses dos poderosos economicamente, mais chances tenho de financimento. Por isso escolhemos cada vez mais pessoas vinculadas aos interesses corporativos de grandes empresas. Já está corrompido porque, ao invés de ser representante do povo, é representante de uma empresa. A segunda regra, que é a do voto individual é tão frágil quanto a primeira. Se vou escolher um indivíduo e não um partido, está pavimentado o terreno para que haja relação de clientela: “vota em mim que te dou alguma coisa”.
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