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Coluna

- Publicada em 08 de Julho de 2011 às 00:00

Expectativa e frustração


Jornal do Comércio
Porto Alegre está recebendo, ao longo de três semanas, o chamado Festival de Teatro Cena Mineira, que traz múltiplos espetáculos produzidos em Minas Gerais, nos últimos anos, e que viajam sob patrocínio da Petrobras.
Porto Alegre está recebendo, ao longo de três semanas, o chamado Festival de Teatro Cena Mineira, que traz múltiplos espetáculos produzidos em Minas Gerais, nos últimos anos, e que viajam sob patrocínio da Petrobras.
A mostra teve, na semana passada, a peça Tio Vânia, do dramaturgo russo Anton Tchekov. Trata-se de um clássico, no sentido mais objetivo da palavra, sobretudo porque esta peça faz a aproximação do encenador Stanislawski com o dramaturgo, de onde nasceria uma nova estética teatral. Por tudo isso, e por ser o Grupo Galpão um dos mais antigos grupos estáveis de Belo Horizonte, fui para gostar do espetáculo. Mas saí sem gostar. Reli a peça, inclusive. O texto estava praticamente todo lá, os cortes foram mínimos. O que, então, não funcionou?
Resumidamente, posso dizer que não me senti “convencido” pelo espetáculo. Sinto que faltou veracidade, introspecção. A diretora Yara de Novaes fez um trabalho interessante, no sentido de trazer ao público um texto importante da dramaturgia mundial. Mas isso não bastou.
A cenografia de Márcio Medina quebrou o princípio realista de que cada elemento de cena deva ter função dramática, conforme Tchekov, mas isso não é grande problema. É evidente que não vamos ficar presos a uma encenação tradicional. A dramaturgia evoluiu e a cena também. Podemos, pois, transpor o realismo clássico de Tchekov para uma leitura mais contemporânea. No caso do cenário, a flexibilidade dos móbiles permite a mudança contínua dos espaços, com grande economia cênica. Quanto aos figurinos, do mesmo Medina, faz-se uma mescla entre o traje realisticamente existente do camponês russo do final do século XIX/início do século XX, com roupas mais atuais. O resultado não é ruim, e é convincente.
O elenco é ruim? De modo algum. Em qualquer outro texto, provavelmente, o elenco seria excelente. Mas senti falta da introspecção. A récita de Tio Vânia, para mim, passou como uma representação administrativa e formal, nada mais, sem emoção, sem convencimento, sem clima. Desde a primeira fala, “Bebe, meu amigo”, da velha Marina para o bêbado médico Astrov, falta aquilo que Stanislawski pedia: representação que incorpora o personagem na personalidade do ator.
O teatro de Tchekov é difícil de ser representado, porque ele é todo introspectivo, ele é psicológico. Parece que não acontece nada, mas as coisas mudam, radicalmente. Por trás da falsa bonomia ou do enorme tédio, com um tempo que se arrasta, as emoções se condensam como tempestade, e depois explodem. Neste sentido, o quarto ato é o divisor de águas da peça e o quinto, seu natural desfecho. Mas os três atos anteriores devem criar e levar a esta tensão. O fato externo é o comunicado do Professor Serebriakov sobre a venda da propriedade. Mas houve um outro acontecimento importante, que antecipa o drama: a aproximação entre Helena e Sônia, levando aquela a tentar ajudar a esta na aproximação com o médico que, por sua vez, deseja a esposa do professor.
Helena, por seu lado, acusada de mulher fatal, tenta inutilmente esconder seu desejo sexual em nome de uma necessária fidelidade ao marido. Quando Tio Vânia entra na sala, com flores para ela, e assiste ao beijo entre Helena e Astrov, seu mundo desmorona. Seu drama se completa com o anúncio sobre a propriedade rural. Ora, tudo isso precisa ser trabalhado meticulosamente pelo diretor, mas não me parece ter ocorrido. Daí, a explosão emocionada de Tio Vânia (Antonio Edson) não convence, do mesmo modo que a sexualidade reprimida de Helena (Fernanda Vianna) ou o cinismo desesperado do médico Astrov (Eduardo Moreira), de fato, não existem. E a peça se dilui, a peça se perde e a peça não convence. Infelizmente. Erro de direção? Não sei se a palavra “erro” é a melhor, mas certamente, uma leitura diferente que, ao menos para mim, não foi convincente. Fiquei frustrado, mas não descrente em relação ao grupo do qual já assisti a memoráveis trabalhos.
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