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Sistema Financeiro

- Publicada em 07 de Março de 2011 às 00:00

Os bancos invadem a periferia


CAIXA ECONÔMICA FEDERAL/DIVULGAÇÃO/JC
Jornal do Comércio
O Rio de Janeiro virou uma espécie de projeto-piloto das instituições financeiras. É lá que a maioria delas está abrindo suas primeiras agências dentro das favelas. Complexo do Alemão, Cidade de Deus e Rocinha já possuem unidades da Caixa Econômica Federal (CEF), Bradesco, Santander, Banco do Brasil e Itaú. Movimento semelhante começa em São Paulo e na Região Metropolitana de Porto Alegre, onde a Caixa e o Banrisul focam ações na periferia.
O Rio de Janeiro virou uma espécie de projeto-piloto das instituições financeiras. É lá que a maioria delas está abrindo suas primeiras agências dentro das favelas. Complexo do Alemão, Cidade de Deus e Rocinha já possuem unidades da Caixa Econômica Federal (CEF), Bradesco, Santander, Banco do Brasil e Itaú. Movimento semelhante começa em São Paulo e na Região Metropolitana de Porto Alegre, onde a Caixa e o Banrisul focam ações na periferia.
Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apontam que 39,5% dos brasileiros não possuem conta em banco. A pesquisa Sistema de indicadores de percepção social sobre bancos: exclusão e serviços revela ainda que a maioria das contas é recente. A maioria dos entrevistados (39%) possui conta entre um e cinco anos. Na apuração por regiões, 52,6% da população do Nordeste não têm conta bancária, percentual que chega a 50% no Norte. Nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, as contas entre um e cinco anos predominam, com percentuais de 47,1%, 47% e 37,7% respectivamente.
É um prato cheio para os bancos, que veem nesse público uma oportunidade de ampliar sua carteira de clientes. Em 1998, a CEF foi pioneira ao instalar agência bancária em uma comunidade, quando inaugurou a agência Rocinha, e colocou à disposição dos moradores um espaço com o mesmo modelo físico e operacional de suas demais agências. Em 2010, a caixa chegou ao Complexo do Alemão com o objetivo de levar os benefícios sociais geridos pelo banco à comunidade, promover a bancarização e buscar oportunidades para oferta de produtos e serviços bancários.
No Rio Grande do Sul, o banco também quer ampliar a presença na periferia. Em Porto Alegre, possui agência na Restinga e deverá abrir, ainda em 2011, na Lomba do Pinheiro. Na Região Metropolitana, quer contemplar a Vila Santa Izabel, em Viamão, Parque dos Anjos, em Gravataí, e uma em Alvorada, ainda sem definição de local.
O Banco do Brasil inaugurou no ano passado as primeiras agências em comunidades do Rio de Janeiro, uma no Morro do Adeus, do Complexo do Alemão, e outra na Cidade de Deus. A próxima será na Rocinha. O banco assinou termo de cooperação com a Cooperativa de Catadores do Morro do Alemão, dentro da estratégia de Desenvolvimento Regional Sustentável (DRS), promovendo ações educativas, orientação de saúde, aperfeiçoamento da infraestrutura de coleta e transporte e melhorias na gestão administrativa. Dentro de ações de bancarização e a democratização do crédito, o BB já havia inaugurado agência do Jardim Ingá, em Luziânia (GO), e a agência da comunidade de Paraisópolis (SP), uma das maiores comunidades da zona Sul da cidade de São Paulo.
Também foi no ano passado que o Bradesco inaugurou a primeira agência da Cidade de Deus. O plano de expansão do banco nas comunidades cariocas incluiu a inauguração de mais nove agências: Rio das Pedras, Complexo do Alemão, Gardênia Azul, Dona Marta, Salgueiro, Terreirão, Tijuquinha, Turano e Vila Cruzeiro. Em São Paulo, inaugurou, em novembro de 2009, agência na comunidade de Heliópolis, a maior de São Paulo, com população de mais de 100 mil habitantes e, em setembro de 2010, iniciou as atividades na comunidade de Paraisópolis.

Aposta é na estratégia da bancarização

Em maio do ano passado, o Santander inaugurou a primeira agência bancária do Complexo do Alemão. A iniciativa foi feita em parceria com o Grupo Cultural AfroReggae, organização não governamental que oferece atividades socioculturais para jovens moradores de áreas carentes. O superintendente de expansão da rede do banco, Robson Rezende, diz que objetivo era ampliar o processo de bancarização. “A única diferença dessa agência para as demais do banco é que teremos o núcleo do microcrédito ampliado nela, já que temos um histórico consolidado deste tipo de crédito no Rio de Janeiro.”
Na visão do banco, o aumento do poder aquisitivo das classes C e D, por conta da estabilidade econômica, tem mudado o perfil do consumidor. Esses novos clientes são pessoas com grau de escolaridade mais baixo e empregos voltados à mão de obra, mas que estão conseguindo adquirir mais facilmente bens de consumo e serviços que antes atendiam somente às classes A e B.
Para atender à comunidade, o Santander estruturou um processo diferenciado de abertura de conta para os residentes, flexibilizando a forma de comprovação de moradia, com mais alternativas para esta documentação e uma parceria com a Associação de Moradores, embora continue alinhado com a regulamentação do setor. Além disso, alterou o valor base de renda para abertura de conta, que será de um salário-mínimo.
A agência conta com oito colaboradores e todos são moradores do complexo ou da região. “Isso nos dá mais proximidade, pois temos uma equipe que pode entender melhor as expectativas da comunidade”, destaca Rezende.
O plano estratégico do banco é de reforçar sua presença no estado e ter um relacionamento ainda mais próximo com a população fluminense. Atualmente, o banco tem 1,4 milhão de clientes e 576 pontos de atendimento no estado carioca, além de 2.300 caixas eletrônicos.

Maioria das pessoas deseja abrir conta

A pesquisa Sistema de Indicadores de Percepção Social (SIPS) sobre Bancos: exclusão e serviços, realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), revela que 40,6% das pessoas sem conta desejam virar correntistas, e o restante ou não quer, ou não respondeu. A dona de casa Gislaine de Farias, 27 anos, não se enquadra no grupo que almeja abrir uma conta. “Não tenho interesse, meu marido tem conta e eu não vejo a necessidade, apesar de reconhecer que às vezes faz falta”, diz a mãe de três filhos, explicando que precisa sempre andar com dinheiro vivo. “Talvez futuramente mude de ideia e resolva ter uma conta, até porque os bancos oferecem sempre, e alguns não pedem valor inicial de depósito.”
A motivação para a escolha do banco tem características regionais bem definidas. A escolha por parte da empresa onde trabalha o cidadão é a única exceção, porque é decisiva em todas as regiões do País, sendo o maior índice o da região Sudeste. Já a tradição no relacionamento com o banco (pessoal ou familiar) tem muita relevância na região Sul, sendo seu valor quase o dobro do índice nacional, enquanto no Norte há menos influência desse fator sobre a decisão de escolha. O Ipea entrevistou 2.770 pessoas nas cinco regiões brasileiras.

Pirâmide de consumo está invertida

Pela primeira vez, as classes A e B somadas aparecem em último lugar no consumo brasileiro, com 11%. A classe C lidera, representando 50%, a D, 24% e a E já chega a 15%, segundo dados da Fundação Getulio Vargas de 2010. De acordo com o economista e coordenador do Escritório de Projetos em Desenvolvimento de Estratégias e Gestão Empresarial (Edge) da Pucrs, Leandro de Lemos, esse panorama novo, da maneira como está sendo visto pelos bancos e clientes, poderá surtir efeitos negativos a médio prazo. “Não adianta rapidamente abocanhar um consumidor se, em um segundo momento, ele vai estar endividado tornando-se um cliente ruim que gera mais custos aos bancos pela inadimplência”, adverte.
Para Lemos, trata-se de classes com pouca cultura financeira. “A propensão a consumir é muito elevada, pois estão estreando no mercado, requisitando, portanto, dos bancos, uma boa capacidade de educação e instrução.” O economista lembra que o ideal é orientar que não deteriorem a renda somente no consumo, mas que também comecem a fazer algum tipo de aplicação. “Os bancos precisam trabalhar a simplificação desses produtos tornando-os mais baratos, como aplicações vinculadas à renda fixa.”
De acordo com ele, haverá um segundo momento, após avaliação da consolidação do posicionamento, em que os bancos entenderão que é preciso buscar qualificação e sustentabilidade da relação com esses clientes.
Lemos destaca, porém, que o ambiente de endividamento se favorece pelos fracos mecanismos de avaliação de risco individuais e também pela capacidade que o sistema financeiro tem de criar subprodutos. “No momento em que o banco tem uma carteira de clientes que vai gerar, no futuro, um conjunto de recebíveis no fluxo de caixa, a instituição consegue vender isso no mercado financeiro, criando Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC), ganhando em duas pontas – dos juros que vai receber do consumidor no momento dos pagamentos adimplentes e dos ganhos financeiros desses fundos. Isso é o princípio de uma combinação malévola.

Banrisul investe nas classes C e D e aumenta presença nas comunidades

Correspondentes bancários auxiliam a chegar a lugares distantes. ANA PAULA APRATO/JC

Visando à bancarização, o Banrisul tem ido atrás de clientes das classes C e D, as quais, de acordo com a diretora comercial do banco, Marinês Bilhar, emergiram ao longo dos últimos quatro anos em função da geração de emprego e renda. No Rio Grande do Sul há quase 500 agências do banco, que também possui 25 unidades em Santa Catarina. “Além disso, chegamos às comunidades das periferias com uma rede de 2,1 mil correspondentes bancários, que fazem a função de agentes de desenvolvimento na prestação de serviço nessas localidades.” Somado a isso, Marinês ressalta os cerca de 100 mil estabelecimentos com Banricompras, atendendo a essas classes.
Outro segmento trabalhado pelo banco é dos aposentados e pensionistas do INSS. “Esses clientes pertencem a essas classes, em razão do modelo de aposentadoria do País, onde a média do aposentado gira em torno de R$ 800,00 por mês”, avalia a diretora. Entre os produtos criados estão o Banricompras INSS e o crédito consignado INSS, empréstimo pessoal com parcelas descontadas diretamente no benefício. “Esse serviço é feito de forma precisa e na medida do tamanho de crédito adequado a cada cliente, visando não propiciar endividamento, e sim atender às necessidades desse público sem preocupações.”
Marinês destaca também que 40% dos servidores municipais e estaduais pertencem à classe C. O banco detém a folha de pagamento de 320 cidades gaúchas, além da estadual. “Queremos ampliar porque é a tendência natural, uma vez que mais de 50% da população pertence a essa classe e busca novos anseios de consumo. O cartão de crédito significa status e muitos estão adquirindo seu primeiro cartão agora”, analisa a diretora. Segundo ela, o foco da área comercial está direcionado ao cartão de crédito como meio de pagamento e instrumento facilitador da vida dos clientes.
O banco está buscando maior inserção nessas comunidades através de Unidade de Negócios Móvel, projeto que está em fase de desenvolvimento. A função da unidade irá além do que é feito pelos correspondentes, visando detectar necessidades de crédito, abertura de contas e cadastro, para otimizar o processo e reduzir custos. “É bom registrar que muitas  pessoas que moram em periferia e vilas trabalham naquela localidade, que também está emergindo com a expansão da economia”, diz.
Na Estada do Varejão, no Lami, não se vê agências bancárias. No entanto, a região possui moradores e comércio que, assim como os demais porto-alegrenses, necessitam de serviços bancários. O Banrisul montou, então, parcerias com negócios em localidades que não contam com a estrutura de um banco. O Banrisul Correspondente presta atendimento para clientes do banco, sem que precisem se deslocar para fora da região.
Há três anos, o supermercado Bom Lami possui um balcão somente para esse procedimento, contando com funcionários especificamente para as transações bancárias. O gerente Letiano Ilha diz que cabe a ele oferecer a estrutura necessária, como funcionários e computador, bem como dinheiro em caixa, e a vantagem em ser correspondente é aumentar o fluxo de pessoas no supermercado. “A pessoa vem fazer um saque ou pagar uma conta e já lembra que precisa comprar pão, leite”, explica.
Em contrapartida, recebe um valor por operação realizada e também o serviço de carro-forte. “Isso me economiza até R$ 4 mil que eu teria que pagar para levar o dinheiro do cofre ao banco”. De acordo com ele, muitos dos clientes que vão ao supermercado ainda não possuem conta bancária. Ilha credita a isso a distância de uma agência bancária. As mais próximas do Banrisul ficam a 10 quilômetros, uma no Belém Novo e outra na Restinga, enquanto que a mais próxima do Banco do Brasil está distante 18 quilômetros.
Entre os serviços oferecidos estão pagamento, saque, depósito, transferência de valor, recarga de celular e cartão INSS. Ilha diz que numa segunda-feira chega a efetuar 400 operações, enquanto que no dia de menor movimento fica em torno de 200.
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