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Entrevista

- Publicada em 12 de Janeiro de 2011 às 00:00

Núñez assume a política externa do governo do Estado


GABRIELA DI BELLA/JC
Jornal do Comércio
Oficializado na segunda-feira como assessor de Cooperação e Relações Internacionais do governador Tarso Genro (PT), o petista Tarson Núñez explica que o principal objetivo da política externa da administração gaúcha é construir uma aliança entre os países do Mercosul para garantir a conquista de mercados estrangeiros.
Oficializado na segunda-feira como assessor de Cooperação e Relações Internacionais do governador Tarso Genro (PT), o petista Tarson Núñez explica que o principal objetivo da política externa da administração gaúcha é construir uma aliança entre os países do Mercosul para garantir a conquista de mercados estrangeiros.
E o Uruguai é um dos centros desse projeto. Logo após ser confirmado no cargo, Núñez despachou com Tarso para afinar a pauta da viagem do governador ao país comandado por José Mujica. A ideia é que o chefe do Executivo gaúcho se encontre com o líder uruguaio em 31 de janeiro, quando a presidente Dilma Rousseff (PT) deve ir a Montevidéu.
"Em vários setores, a economia uruguaia compete com a gaúcha e isso tem consequências desfavoráveis, particularmente na Metade Sul do Estado. Nosso objetivo é reverter esse quadro e transformar essa competição em cooperação", projeta o assessor.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio Núñez fala ainda sobre a intenção de trazer o Fórum Social Mundial (FSM) a Porto Alegre em 2013. Ele e o secretário-executivo do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, Marcelo Danéris (PT), irão a Dacar, no Senegal, para acompanhar a edição do evento, que ocorre de 6 a 11 de fevereiro no país africano. Lá, se encontrarão com o comitê internacional do fórum para propor sua realização na Capital gaúcha.
Jornal do Comércio - Como será a política de relações internacionais do governo estadual?
Tarson Núñez - Nosso conceito de ação na área de relações internacionais tem que estar sintonizado com a política do governo nacional. A ideia é sintonizar o Estado numa política de protagonismo que o Brasil vem vivendo em nível internacional. Nosso foco é a integração latino-americana, especificamente o Mercosul. Queremos aprofundar e potencializar os benefícios que o Mercosul pode trazer ao Rio Grande. Portanto, Mercosul e América Latina são nossa primeira esfera de intervenção internacional. Depois, temos a questão da comunidade europeia, particularmente a relação com os países da península ibérica, pela afinidade cultural e econômica. Existem muitos investimentos espanhóis e portugueses no Brasil e o potencial de intercâmbio é muito grande. Tarso já esteve, na época da transição, em Portugal e na Espanha. Temos algumas iniciativas programadas de seminários com os conselhos de desenvolvimento dos dois países e com algumas fundações da Europa.
JC - Há algum outro foco de atuação externa?
Núñez - Uma terceira esfera é aprofundar nossas relações com o continente africano e com a Índia. Fiz consultoria para a Universidade de Londres em Moçambique; conheço a situação da África. São espaços onde se pode abrir mercados para as empresas brasileiras, na medida em que são países muito carentes economicamente. Carentes de capital e de tecnologia. São mercados em que, seguramente, com a expertise e a capacidade competitiva das empresas gaúchas, temos condição de ocupar espaços econômicos muito importantes. Essas regiões estão no marco dos países emergentes, numa linha de cooperação Sul-Sul.
JC - Como será a viagem de Tarso ao Uruguai?
Núñez - Ainda estamos encaminhando. A presidente Dilma vai ao Uruguai e à Argentina. Há uma possibilidade de que Tarso vá junto com ela. Nossa primeira pauta é com o Uruguai porque a política de relações internacionais é um instrumento para o nosso projeto de desenvolvimento. Não é uma mera questão de diplomacia. O Uruguai é importante. Ainda que seja um Estado nacional, seu PIB é praticamente a metade do PIB do Rio Grande do Sul. Ecologicamente, historicamente, e em termos territoriais, o Uruguai é muito parecido com o Rio Grande. Isso gera algumas oportunidades e alguns problemas. Em vários setores da economia o Uruguai é nosso concorrente. Na área de carnes, de leite, do vinho, e em alguns aspectos na área de grãos, como no caso do arroz. A economia uruguaia compete com a do Rio Grande do Sul e isso tem uma consequência desfavorável, particularmente na Metade Sul do Estado. Nosso objetivo é reverter e tentar transformar essa competição em cooperação. É essa a lógica do Mercosul: em vez de concorrermos, nos unirmos para conquistar novos mercados.
JC - Como fazer isso na prática?
Núñez - Se, por um lado, o setor da carne, do vinho e dos laticínios no Uruguai é mais competitivo que os congêneres brasileiros - em função da carga tributária, de toda uma tecnologia de sanidade animal que eles têm - por outro lado, interessam para o Uruguai o tamanho, o capital e o protagonismo internacional do Brasil. A ideia é transformar essa competição em cooperação. Eles podem nos aportar tecnologia em termos de sanidade animal e de capacidade produtiva, e a gente pode aportar para eles a visibilidade interna e a escala que o Brasil tem. Nossa ideia, no limite, é que possamos ter, eventualmente, o que se chama de denominação de origem comum. É a ideia de se criar uma marca local. "A Carne do Pampa", por exemplo. Que a gente possa, em vez de competir por mercados com o setor de carne uruguaio, nos unir e abrir mercados conjuntamente.
JC - E como potencializar a Metade Sul do Estado dentro do Mercosul?
Núñez - Existe o Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul. É um fundo que tem US$ 401 milhões para ajudar as regiões prejudicadas pela integração a se adaptarem. Até agora, só quem tem utilizado esse recurso é o Uruguai e o Paraguai. O Brasil praticamente não se utilizou desse fundo porque, no contexto do Mercosul, é o primo rico. Mas o Sul do Estado é uma área que sofre um impacto mais negativo do Mercosul. Então, é plenamente razoável que também se possa acessar esses recursos para projetos que ajudem o desenvolvimento da Metade Sul. A ideia é conseguir transformar o que hoje é um problema para a região - a competição com o Uruguai -, numa vantagem, e fazer com que os dois consigam crescer juntos no contexto do Mercosul. Dado o contexto mundial de crescimento do preço dos alimentos e a ideia do Pampa como uma região de fertilidade, há um enorme potencial para nos consolidarmos enquanto território mundial de produção de alimentos de qualidade.
JC - Em resumo, a cooperação pautará as relações internacionais.
Núñez - A ideia fundamental é constituir redes de cooperação. É o espírito original do Mercosul. Não adianta cada país atuar sozinho. Nos unindo, conseguimos ter escala e potencial para competir internacionalmente. Hoje não se pode pensar o desenvolvimento de uma maneira autárquica. Como se o Rio Grande do Sul pudesse se desenvolver sozinho. O mundo é globalizado. A questão é como transformar essa globalização, que em geral beneficia só as grandes empresas, em benefício do conjunto da população dos países do Mercosul. Além de viabilizar as iniciativas de economia solidária e de comércio justo que existem em vários lugares do mundo. Tem um espaço que pode ser ocupado pelo protagonismo do Estado no cenário internacional que, na nossa avaliação, nunca foi potencializado. Os governos estaduais sempre foram muito voltados para dentro. Mal tinham uma relação no âmbito brasileiro, quanto mais no internacional. A gente tem convicção de que o desenvolvimento do Rio Grande do Sul passa por uma integração crescente com o mundo.
JC - Há a intenção de trazer o Fórum Social Mundial (FSM) ao Estado?
Núñez - Uma agenda de relações internacionais com a sociedade civil de outros países é prioridade, particularmente no tema do FSM. Em 2012, o evento será descentralizado - já estamos montando uma programação para Porto Alegre. E estamos negociando para retomar o Fórum em 2013, na edição centralizada. Iremos, eu e o (Marcelo) Danéris, para Dacar, no Senegal, em fevereiro. Lá vamos conversar com o comitê internacional do Fórum, oferecendo o Rio Grande do Sul como um espaço para o evento em 2013.

Perfil

Filho de pai uruguaio, Tarson Núñez (PT), 50 anos, formou-se em História pela Ufrgs em 1984. Trabalhou como assessor da Central Única dos Trabalhadores no Estado (CUT-RS) nos anos 1980, estudando os impactos da criação do Mercosul no mundo do trabalho. Em 1990 foi assessor parlamentar da bancada do PT na Assembleia Legislativa e integrou a Secretaria Nacional de Relações Internacionais do partido. Concluiu mestrado em Ciências Sociais pela Ufrgs em 2010 e neste ano iniciou doutorado na mesma faculdade. Vai coordenar a assessoria de Cooperação e Relações Internacionais do governo Tarso Genro (PT), mas se manterá vinculado à Assessoria Superior do Governador, sob o comando do petista Flavio Koutzii.
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