O varejo de eletromóveis está em ebulição. Com temperatura elevada pelas recentes fusões que definiram novas posições no tabuleiro do setor, redes gaúchas afinam estratégias e lançam suas cartadas para expandir atuação ou melhorar a rentabilidade dos negócios, que incluem até a diversificação para outros nichos, como materiais de construção, e reforço da presença em Santa Catarina. A movimentação, para quem segue esta receita, é a melhor atitude. Até porque já tem concorrente vizinho de olho no mercado local.
Até junho, a Benoit agregará mais seis à família de 148 pontos, 15 deles em Santa Catarina. “E pode ser mais. O foco é o estado vizinho”, avisa o gerente operacional da rede, Humberto Koerbes, que não descuida da casa. Novas filiais também proliferam em solo gaúcho. O posicionamento deve se fortalecer no Sul e Oeste. “Os consumidores gaúchos e catarinenses são muito parecidos”, justifica. A meta de crescimento é de 20% a 25% na receita, ante 15% de 2009. Koerbes conta com um aliado no confronto com os grandes do varejo: a proximidade com o cliente, por isso a localização na região-sede, Vale do Taquari, Sul e Serra.
No seu território, o Walmart deve reforçar posições, com novos pontos em Santa Cruz do Sul e Lajeado. “Temos de estar ligados e mudar sempre”, indica. A intenção do grupo é operar sem parceiros. Com portfólio cativo de 140 mil produtores, a Agrocomercial Afubra, braço de varejo da Associação de Fumicultores do Brasil (Afubra), tem apenas 20 pontos de venda, mas projeta avançar, disputando consumidores muito além do setor primário.
O diretor-presidente da operação comercial, Romeu Schneider, informa que recusou a compra de outra rede por diferença de foco: não era na região de atuação. Agora faz planos de ampliar em 10% a rede, com 20 pontos. Também começa a operar em junho novo Centro de Distribuição (CD), que teve injeção de R$ 12 milhões, em Santa Cruz do Sul. “Nosso faturamento cresce 18% ao ano”, cita, indicando que 10% da receita de R$ 220 milhões vem de produtos como itens agropecuários. Na rede, as compras à vista respondem por 50%. Schneider diz que o pós-venda é o segredo, inclusive contra os grandes.
A cooperativa Certel, de Teutônia, com 60 lojas, poderá enveredar com mais força pelo nicho de materiais de construção. O presidente da associação, Egon Hoerle, acredita que em dois anos o segmento poderá superar o de eletrodomésticos e móveis, hoje maior fonte de receita. As novas lojas que estão sendo abertas, em Rio Grande e Pelotas, focam mais a construção. A cooperativa também vai ingressar em produção de blocos de cimento e incrementará um programa de financiamento de moradias, o Casa Pronta Certel.
Também com forte nos materiais de construção, a Quero-Quero ampliará em mais seis lojas as atuais 174. Serão três no Estado e o mesmo número em Santa Catarina. O diretor comercial, Arnildo Heimerdinger, diz que a estratégia é entrar em mercados com boa renda per capita.
“Queremos crescer muito em materiais, o que ainda não está consolidado no Estado”, projeta. A meta é recuperar desempenho depois de um 2009 com menor avanço, período de dificuldades com adaptação da mudança da sede de Santo Cristo para Cachoeirinha e menor venda. Para 2011, o grupo quer chegar ao Paraná. Para a briga que se avizinha, Heimerdinger aposta na base de clientes do cartão Verde Card, com cerca de 2 milhões.
A CRDiementz, de Portão, está entre as raras que não prevê novas lojas em 2010. O superintendente Homero de Toledo alega que o foco é melhorar a liquidez dos 59 pontos, 56 no Rio Grande do Sul e três em Santa Catarina, e se manter em cidades de pequeno e médio portes. “Não adianta abrir e abrir lojas. Estamos reestruturando os locais deficitários ou com pouca lucratividade”, sinaliza Toledo.
Vale tudo na briga por consumidores e para acertar a estratégia de ganhar o primeiro lugar na mente da clientela, o grupo Herval, de Dois Irmãos, recentemente adotou o nome TAQI, escolhido após cinco anos de estudos e com consultoria da agência GAD. A rede com 65 estabelecimentos - 63 no Estado e dois em Santa Catarina - imprimiu ainda segmentação por nicho, com novas denominações: TAQI Construção e Ferramentas, TAQI Eletro e Móveis e as mistas TAQI. O vice-presidente do grupo Herval e diretor da rede de varejo, Germano Grings, explica que a composição das operações seguirá o perfil de necessidades dos clientes em cada região. O ramo de varejo planeja abrir mais dez lojas em 2010.
As fusões e aquisições no varejo estão em franca expansão, previne o sócio de finanças corporativas da consultoria KPMG, Luís Motta. Dos 454 negócios realizados em 2009 no País, com capital nacional e estrangeiro, apenas 11 envolveram grupos de varejo. A distância é colossal se o segmento, 14o no ranking anual, for confrontado com outros ramos, como o de Tecnologia da Informação (TI), que somou 58 fusões ou aquisições. Entre 1994 e o ano passado, a KPMG computou 94 negócios com redes de lojas, em um saldo de 5.848 no mesmo período. O ano de 2006 registrou recorde com 15 negociações.
Após a fusão da Casas Bahia com o braço de varejo de eletrodomésticos do Pão de Açúcar, ocorrida em dezembro passado, o ritmo aqueceu. “As redes terão de se reposicionar para firmar espaço nos principais mercados”. Motta cita que, além das grifes nacionais, as estrangeiras também avançam e disputam consumidores, como o Walmart e Carrefour, que agregam cada vez com mais força o portfólio de eletromóveis e eletrônicos aos seus hipermercados. O Brasil, vincula o consultor, é destaque entre emergentes. Para ingressar no Sul, visto como território mais minado e fechado, com domínio de companhias locais, o sócio da KPMG vislumbra como modelo mais eficiente a aliança com redes já estabelecidas. “Não precisa ser apenas com crescimento orgânico”, contrapõe Motta, descartando abertura de novos pontos, sempre com mais custo.
“O foco hoje é escala e maior faturamento por metro quadrado, com maior rentabilidade.” Para os pequenos e médios negócios, o sócio da KPMG indica que a saída será fortalecer a gestão, com maior profissionalização e governança. Já investir em crediário próprio é mais arriscado. O presidente do conselho do Programa de Administração do Varejo (Provar) da Universidade de São Paulo (USP), Claudio Felisoni, credita os movimentos à velocidade das comunicações, que impõe drástico processo de redução de custos. “Os preços são muito parecidos e as margens muito estreitas, pois estamos na era do produto commodity”, indica. Felisoni adverte que a concentração é tendência do capitalismo global. “Se é bom ou ruim, é outro problema”, minimiza.
O presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Estado (FCDL), Vitor Koch, é hora de rever a cultura de operar sozinho. “Trata-se de aumentar o poder de barganha”, justifica Koch. Neste caso, a meta seria aumentar a rede de pontos. Outro caminho é formar centrais de compras para melhorar negociação com a indústria. O presidente da FCDL dá exemplo. A rede de Koch se uniu a outras empresas e formou a Redlar, com quase 50 lojas e atuação na Região Metropolitana e nos vales do Sinos, do Paranhana, do Caí e das Hortênsias. Além de menor preço em mercadorias, a Redlar, presidida por Koch, consegue menos juros nos bancos.