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MEMÓRIA

- Publicada em 16 de Janeiro de 2015 às 00:00

Futuro da Ilha do Presídio é desconhecido


AMA GUAÍBA/DIVULGAÇÃO/JC
Jornal do Comércio
Desde a desativação do presídio da Ilha das Pedras Brancas, em 1983, as intempéries vêm roendo — como traças em livros — as histórias aprisionadas no silêncio das ruínas dos prédios. A vegetação avança indolente sobre as edificações centenárias, que foram utilizadas pelo Exército como depósito de pólvora entre 1860 e 1930. O movimento imperceptível das raízes das árvores fratura os alicerces das paredes que, durante a ditadura militar, formavam 10 celas onde foram encarcerados cerca de 100 presos políticos entre 1965 e 1973. Os musgos e as heras se infiltram nas rachaduras das vigas que sustentavam uma sala maior, onde se acotovelavam todos os prisioneiros comuns. Enfim, episódios históricos ocorridos na ilha têm sido engolidos pela ação lenta da fauna e flora.
Desde a desativação do presídio da Ilha das Pedras Brancas, em 1983, as intempéries vêm roendo — como traças em livros — as histórias aprisionadas no silêncio das ruínas dos prédios. A vegetação avança indolente sobre as edificações centenárias, que foram utilizadas pelo Exército como depósito de pólvora entre 1860 e 1930. O movimento imperceptível das raízes das árvores fratura os alicerces das paredes que, durante a ditadura militar, formavam 10 celas onde foram encarcerados cerca de 100 presos políticos entre 1965 e 1973. Os musgos e as heras se infiltram nas rachaduras das vigas que sustentavam uma sala maior, onde se acotovelavam todos os prisioneiros comuns. Enfim, episódios históricos ocorridos na ilha têm sido engolidos pela ação lenta da fauna e flora.
Entretanto, depois de mais de 30 anos sem um projeto para o local, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (Iphae) tombou a Ilha das Pedras Brancas – também conhecida como Ilha do Presídio – em dezembro de 2014, atendendo à solicitação de ONGs ambientalistas que realizam visitas ao local, à prefeitura de Guaíba (que tem a concessão para explorar a ilha como ponto turístico) e ao trabalho da Comissão Estadual da Verdade (CEV), que deu visibilidade aos fatos que aconteceram ali durante a ditadura (1964-1985).
Embora seja um avanço inconteste, o fato de o local figurar nos livros Tombo Histórico e Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico não garante a restauração do patrimônio histórico, apenas impede que a intervenção humana degrade aquelas edificações. A restauração depende de um projeto do poder público ou da iniciativa privada que – pelo menos, até agora – não existe. Enquanto isso, a natureza continua carcomendo as páginas da história que aconteceram ali.
A Ilha das Pedras Brancas é formada por rochas graníticas que se erguem na “terceira margem do Lago Guaíba”, por assim dizer — entre os municípios de Guaíba e Porto Alegre. A referência ao título do conto de Guimarães Rosa parece pertinente, porque, aqueles 6 mil metros quadrados acima do nível da água estão envoltos em uma atmosfera um tanto quanto mítica: o tempo parece transcorrer mais lento, alheio à civilização das cidades vizinhas, envolto em uma neblina de informações desencontradas.
As edificações na Ilha das Pedras Brancas existem desde 1860: foram usadas como depósito de pólvora do Exército até 1930; laboratório de pesquisa animal do Estado entre 1947 e 1948; e, finalmente, presídio a partir da década de 1950. Com a função prisional, a ilha foi dividida em dois edifícios – um deles abrigava a guarda e os agentes penitenciários; outro, o presídio propriamente dito.
O documento do Iphae sobre a Ilha das Pedras Brancas descreve o espaço prisional assim: “um corredor central com cinco celas em cada lado, onde ficavam alojados os presos políticos. Ao fundo há uma sala maior, denominada de ‘Campo Santo’ pelos presos comuns, que ali foram reunidos a partir da chegada dos presos políticos”.
Segundo pesquisa da CEV, o primeiro preso político foi o ex-sargento Araken Vaz Galvão. Araken foi detido em 1965, por atuar com o sargento Manoel Raimundo Soares e outros militares legalistas, pela posse do ex-presidente João Goulart. Soares foi assassinado pelos órgãos de repressão em 1966, depois de ter sido torturado durante meses. “Fui o primeiro preso político da Ilha do Presídio. Só tinha bandido lá. Mas, depois de ter passado por sessões de espancamento, interrogatório, tortura, posso dizer que os meses que passei na ilha foram tranquilos”, comentou Araken.
Depois de Araken, outros opositores ao regime militar – hoje figuras públicas – frequentaram as celas da ilha: o deputado estadual Raul Pont (PT), o ex-deputado Carlos Araújo (PDT), o advogado Índio Vargas e João Carlos Bona Garcia, entre outros. Paralelamente, o Campo Santo continuou acumulando um grande número de prisioneiros comuns na mesma cela.
“O espaço tem um grande valor histórico e simbólico. Ele guarda, por exemplo, a memória dos movimentos de resistência ao golpe militar, daqui do Rio Grande do Sul. Agora que foi tombado, queremos formar um grupo de trabalho para pensar o que fazer na ilha, como captar recursos e viabilizar a transformação do espaço, respeitando as limitações impostas pelo próprio tombamento”, planeja o vereador de Guaíba, Alexandre Santana (PT), que subscreveu a petição de tombamento, junto com as entidades Pró-Cultura, AMA e a prefeitura da cidade onde legisla. Guaíba tem a cedência para utilizar a ilha até 2030. De qualquer forma, enquanto ninguém apresenta uma proposta para aquele espaço, o mato continua crescendo sobre os acontecimentos que pairam em silêncio entre as ruínas da Ilha do Presídio.

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