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consumo

- Publicada em 15 de Dezembro de 2014 às 00:00

Boa safra para o comércio


SAIF DAHLAH/AFP PHOTO/JC
Jornal do Comércio
O plantio do milho no Rio Grande do Sul deve se encerrar até o fim deste mês. Quando as primeiras lavouras forem colhidas, e, mesmo antes de os grãos servirem de silagem para alimentar vacas produtoras de leite em milhares de minifúndios gaúchos, lojistas de mais de uma centena de municípios do Interior já começam a comemorar. “A expectativa é boa em relação à safra de milho, o que significará incremento de vendas do varejo nos últimos dias do ano”, afirma o presidente da Associação Comercial e Industrial de Campina das Missões, Ivair Spanholli. “Se tem milho para alimentar o gado, sobra dinheiro para os pequenos agricultores gastarem no comércio”, emenda.
O plantio do milho no Rio Grande do Sul deve se encerrar até o fim deste mês. Quando as primeiras lavouras forem colhidas, e, mesmo antes de os grãos servirem de silagem para alimentar vacas produtoras de leite em milhares de minifúndios gaúchos, lojistas de mais de uma centena de municípios do Interior já começam a comemorar. “A expectativa é boa em relação à safra de milho, o que significará incremento de vendas do varejo nos últimos dias do ano”, afirma o presidente da Associação Comercial e Industrial de Campina das Missões, Ivair Spanholli. “Se tem milho para alimentar o gado, sobra dinheiro para os pequenos agricultores gastarem no comércio”, emenda.
Caso a situação fosse outra, também o impacto na economia da cidade, com população de 6 mil habitantes, teria outro tom. Isso porque, das 1.318 propriedades rurais, 80% possuem até 20 hectares de terra, ou seja, a maioria é de pequeno porte e, se for o caso dos produtores precisarem comprar alimento para o rebanho, o dinheiro que seria injetado em compras de Natal vai para fora do município.
“Aqui, a gente passa olhando para o céu: se chove no período certo, o comércio e toda a economia local ficam bem”, admite Spanholli, destacando que, para uma cidade do porte de Campina das Missões, a agricultura familiar é fundamental. “Se esta atividade deixar de existir, a cidade também desaparece”, vislumbra. Formado por 162 empresas (incluindo todos os setores), o município localizado na região Noroeste do Estado também se “alimenta da nota do leite” e dos resultados das safras de soja e trigo, além da criação de suínos, a ponto de 70% do ICMS de Campina das Missões ser oriundo da agricultura familiar; enquanto isso, a partidipação do comércio gera 18% e a indústria (de confecção e moveleira) representa 5% do recolhimento do tributo, segundo a presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Marta Volkmer. “Neste ano, o trigo não deu muito, mas também representa bastante para nossa economia”, destaca a dirigente, após citar a produção de leite como a maior responsável pela injeção de recursos na cidade.
O alimento produzido por meio do trabalho de mais de mil agricultores familiares abastece empresas como a Nestlé e a Cooperativa Central Gaúcha de Leite (CCGL), entre outras. Praticamente todas as propriedades – algumas muito bem-estruturadas, conforme Marta –  são voltadas para o setor leiteiro. “E, para a maioria, esta é a única renda”, pontua a dirigente. Ela detalha que, nos dias de pagamento (da nota) do leite, o comércio da cidade vira um verdadeiro burburinho, com pessoas comprando insumos, roupas, alimentos e pagando contas como a de luz, ou mesmo a anuidade do sindicato. “A agricultura familiar é fundamental para a economia da cidade”, reforça.
Campina das missões é um município com uma receita de R$ 15 milhões/ano, sendo que R$ 8 milhões representam o dinheiro  proveniente dos aposentados (a maioria agricultores segurados). “Eles também são muito importantes para sustentar o comércio. E o pessoal gasta mesmo”, afirma Marta. De acordo com a dirigente, o número de inativos no campo em Campina das Missões já representa 30% da população do município, sendo que parte deste público vive no meio rural.
Dentre os agricultores na ativa, além do leite, alguns cultivam grãos. Mas, como o resultado depende muito do desempenho da safra, a maioria optou pela criação de vacas leiteiras. “É mais garantido, pois entra uma renda mensal, enquanto a safra é semestral, além de ser um negócio inseguro”, compara Marta. “Com chuva, a pastagem renova e segue tocando, mas grão não, dependendo da época, se perde.” Com pagamento fixo na primeira quinzena de cada mês, os pequenos produtores de leite respondem pelo fluxo de público das lojas e bancos. “Passado o período de pagamento, o movimento do comércio cai”, observa Spanholli.

Recursos provenientes da agricultura movimentam a economia do Interior

O cenário da agricultura familiar como base da economia é realidade em mais de 330 municípios gaúchos com até 10 mil habitantes, segundo o assessor de política agrícola da Fetag, Airton Hochscheid. O peso dos pequenos produtores na economia dessas cidades é tamanho que os reflexos são sentidos de forma imediata. “Do dia 10 ao dia 15, quando o pessoal do leite recebe, movimenta bastante a cidade. O pessoal vem gastar aqui, e todos vendem, desde supermercados a outros tipos de lojas”, destaca o presidente da Associação Comercial e Industrial de Serviço e Agropecuária de Nonoai (Acisa), Jorge Chagas. O cenário adverso também deixa vestígios. Se os negócios no campo vão mal, as vendas no comércio chegam a cair 20% e, às vezes, são necessários de dois a três meses para que os lojistas consigam recuperar as perdas. “Em outros momentos, acaba recuperando-se só no ano seguinte”, relata Chagas.
De forma mais efetiva, a atividade primária influencia com peso no PIB de cidades da região Noroeste, como Três Passos e Santa Rosa, onde a maioria da população tem na lavoura sua principal fonte de renda. “Na região da Serra, há um grande número de pequenas propriedades, mas, em função do desenvolvimento da indústria e do comércio, lá esta atividade não é tão relevante para o PIB da região”, compara Hochscheid, informando que a maior concentração de agricultores familiares no Estado vive próximo ao Rio Uruguai, na divisa com Santa Catarina, e fazendo fronteira com a Argentina. “Também na região Norte e nas Missões, há uma grande concentração de municípios onde os minifúndios são maioria.”
Em Alecrim, segundo Hochscheid, 70% da população de 7,3 mil habitantes reside no meio rural. Lá o setor primário é a base da economia. “Se a atividade vai mal, a cidade toda pena.” O cultivo local é de milho e soja, acompanhado de criação de gado bovino, suíno e frango. “Também é produzido leite”, destaca a presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Elaine Kern Cavalli. Desde os sete anos, ela trabalha no campo, e hoje, aos 45 anos, continua se dedicando à lavoura.
“A estiagem é uma das maiores preocupações. Nos últimos 10 anos, pelo menos oito tiveram problemas de safra: ou chove demais ou de menos, apodrecendo os produtos”, aponta. Isso explica por que hoje em dia é o dinheiro dos 1,9 mil pequenos agricultores aposentados que ajuda a engordar o PIB do município. “É preocupante, já que a agricultura sustenta nossa cidade, mas está envelhecendo – grande parte dos jovens migra para a cidade”, lamenta Elaine. Outro problema enfrentado é o êxodo de jovens, principalmente em função das dificuldades com a internet no campo. “Ainda não temos 100% de cobertura no município, e cerca de 40% da população sofre com dificuldade de acesso, principalmente os moradores do campo”, relata o  presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Nonoai, Adão Luiz de Moraes.
Em Nonoai, apesar da presença de latifúndios, também há grande concentração de agricultores familiares. “Cerca de 70% dos produtores são pequenos e médios, voltados à produção de grãos (médios)e leite (menores)”, diz Moraes. Segundo ele, o PIB do município de 12,4 mil habitantes é 100% oriundo da agricultura, sendo que um terço é de responsabilidade da produção dos minifúndios. Cerca de 100 famílias de produtores comercializam para quatro indústrias de laticínio do município e na região (Planalto, Trindade e Sarandi). O grande desafio, segundo Moraes, é a garantia de renda. “Hoje, não se consegue ter renda por causa da colheita, que não é certa.”

Foco no desenvolvimento sustentável

Olibio, a esposa Lúcia e os filhos Eduardo e Camila trabalham juntos na propriedade. ARQUIVO PESSOAL/DIVULGAÇÃO/JC
Entre os pequenos produtores de leite bem-estruturados em Campina das Missões, a família de Olibio Adeeul Pies é uma entre tantas fornecedoras da Nestlé. Há 20 anos, Pies e a esposa, Lúcia, ingressaram no setor, contando com apenas quatro vacas, mas atualmente eles têm 35 animais leiteiros, refrigerador de mil litros e maquinário moderno. “Há cinco anos, entregamos o leite com padrão de qualidade, que é melhor pago pela indústria”, afirma Pies.
O prazo de pagamento comum no setor é de 45 dias. “A Nestlé paga perto do dia 15”, diz o produtor, que tem dívidas de R$ 2,5 mil por mês em prestações de equipamentos adquiridos graças a incentivo do governo federal dentro do programa Mais Alimento, para compra de maquinário. Mesmo assim, entre os dias 15 e 25, os adultos circulam pelo comércio para, além das contas a pagar, ir às compras.
O milho plantado serve para a alimentação das vacas, e com o dinheiro do leite, Pies e Lúcia podem se programar para consumir no varejo. “Às vezes fazemos de sete a oito compras a prazo no mês, mas todo dia 20 vamos lá e pagamos”, diz o pai de Camila (11) e Eduardo (16 anos), que está terminando os estudos e “já tem consciência” de que terá de tocar a propriedade no futuro. “Ele vai fazer faculdade de Agronomia para ter duas opções. Se achar viável continuar no leite, pode continuar, porque não se sabe como fica a situação”, comenta Pies. Fora de horário escolar, as crianças e a esposa ajudam na lida com as vacas. Dedicação e persistência são as principais características da família.
“Percebemos que é viável ficar na agricultura: com capricho e organização, se consegue resultados positivos, para crescer sempre mais. Daí, começa-se a ganhar em litros e a ter uma renda maior – e se consegue consumir e ter lazer”, afirma Pies. Segundo o produtor de Campina das Missões, é gratificante trabalhar com uma fonte de desenvolvimento sustentável. “E mesmo com leite baixando de preço, conseguimos manter a receita, porque temos qualidade e volume”, gaba-se Pies.

Aposentados do campo gastam os proventos em compras na cidade

Darlize e a família dividem-se entre as vendas dos produtos da lavoura e da loja. ARQUIVO PESSOAL/DIVULGAÇÃO/JC
Se por um lado os produtores de leite de Campina das Missões injetam dinheiro no comércio na primeira quinzena de cada mês, por outro, são os agricultores aposentados que reanimam o movimento próximo do dia 30. “Procuram móveis, material de construção e eletroeletrônicos”, diz a vendedora Darlize Perius, que há seis anos largou o campo para trabalhar na cidade. “Não levo jeito para a agricultura, mas continuo ajudando em casa”, diz a esposa do produtor Jandir Muller. 
Os pais de Darlize também possuem um minifúndio e, rumo aos 60 anos de idade, pensam em se aposentar. Enquanto isso não acontece, plantam soja, milho, trigo e comercializam leite. Outros produtos, como ovos e banha, que não integram a renda oficial, são vendidos para amigos e conhecidos. Antigamente, a família trocava farinha pelo trigo, mas hoje em dia é o papel-moeda que assegura as transações no comércio.
Segundo Darlize, os pequenos produtores têm investido mais em suas atividades, construindo novas salas de ordenha principalmente. Outros já se dão ao luxo de reformar as residências. “O que gera movimento no comércio é o que vem da lavoura, pelo menos na nossa cidade. Se não tivesse agricultura familiar, não venderíamos quase nada”, diz. “Quando sai financiamento do governo é melhor ainda. Aí tem demanda para tudo, e, dependendo do tipo de financiamento, se vende roçadeiras e implementos agrícolas, areia, tijolos e cimento para salas de ordenha.” 
À frente da coordenação da unidade local da Cooperativa Tritícola Santa Rosa (Cotrirosa), Therezinha Mentges também sublinha que, se não fosse a agricultura, o comércio não teria como sobreviver “em um município pequeno, praticamente sem indústria”. “Quando tem oscilações de safras, a gente percebe muito claramente, pois tudo se aquieta – até que vem a chuvarada e eles (pequenos produtores) conseguem comprar novamente.” Mas se o resultado na lavoura é positivo, os produtores investem em compras de maior valor, como equipamentos. Therezinha completa que, se não houvesse os aposentados do campo, o comércio não vingaria. Segundo a gestora, quase todos os produtores são clientes da cooperativa, que tem uma loja de varejo no ramo de alimentação.
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