O Corpo de Bombeiros do Estado alcançou sua independência em junho desse ano. Entretanto, existe um longo caminho - até 2016 - para que a corporação seja totalmente desvinculada da Brigada Militar (BM). Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Ubirajara Ramos, coordenador-geral da Associação de Bombeiros do Rio Grande do Sul (Abergs), relata as mudanças que devem acontecer no órgão e também os problemas a serem sanados. Segundo Ramos, atualmente, cerca 400 municípios do Estado, dos 497 existentes, não possuem Corpo de Bombeiros e os equipamentos são comprados, em sua maioria, com o auxílio de fundos municipais.
Jornal do Comércio - Atualmente, apenas três outros estados mantêm as corporações ligadas à Polícia Militar: São Paulo, Bahia e Paraná. Ao que o senhor atribui esta demora também do Rio Grande do Sul na desvinculação?
Ubirajara Ramos - Esse movimento vem de muitos anos no Estado. Na verdade, os bombeiros passaram a fazer parte da BM em 1935, pois antes era um órgão independente. Na década de 1970 e também em 1988, com a Constituição, se discutiu muito esse assunto, mas era uma conversa interna da corporação, sem sair para a sociedade. Agora, acredito que o fundamental para acontecer foi a participação da população, quando mostramos a dificuldade dos bombeiros. O envolvimento de todos fez com que o governo fizesse essa separação, embora tardiamente. Além disso, a própria Brigada Militar não queria que o Corpo de Bombeiros se desvinculasse, porque era a parte simpática da corporação. A BM perde a sua “menina dos olhos”.
JC - Quais seriam os principais problemas enfrentados pelos bombeiros hoje e que devem ser sanados?
Ramos - Primeiramente, é preciso deixar claro que a desvinculação é um processo, que começa com a independência. O segundo passo é a estruturação, e o final é a expansão e o desenvolvimento do serviço. As principais precariedades envolvem o fato de que os bombeiros não possuem um orçamento próprio, sendo os valores repassados pela BM. O que sobra do combate à criminalidade chega até os bombeiros, e quase sempre não é nada. Não existe uma previsão legal sobre que porcentagem deveria ser repassada, mas pelo tamanho da corporação deveria ser cerca de 10% a 13%. Então, acabamos sobrevivendo por meio de fundos municipais, que permitem que se compre algumas viaturas e equipamentos. Em outubro teremos a votação do orçamento próprio e assim passaremos a comprar nossos próprios materiais.
JC - O que deve mudar em relação à qualificação dos bombeiros?
Ramos - Temos o objetivo de realizar concursos específicos para os bombeiros, pois antes dependíamos dos da BM, e sempre vinha um número menor de candidatos para a nossa corporação. Hoje, o déficit de pessoal nos bombeiros é de 47%. Atualmente, existem duas maneiras de ingresso. Uma é para soldado, e 70% da sua formação é voltada para a atividade policial. A ideia é que exista uma reformulação no currículo para que os bombeiros sejam formados no que eles realmente vão atuar: prevenção de incêndios, primeiros-socorros e salvamento. Outra opção é o oficial, que é o gestor da corporação, e a formação é ainda pior, pois ele precisa ser bacharel em Direito. A nossa defesa é que seja aberto para outros cursos, como as áreas da saúde, Educação Física, entre outras. Assim, o trabalho ficaria mais completo.
JC - Está prevista a ampliação do número de quartéis nos municípios gaúchos?
Ramos - Essa seria a terceira fase, com a expansão do serviço. Hoje temos cerca de 400 municípios, dos 497 existentes, que não possuem serviço de bombeiros. Alguns possuem um ou dois caminhões, que atendem às cidades vizinhas. Isso na prática é inviável, pois o socorro pode levar meia hora para chegar, sendo que em 15 minutos uma casa é destruída pelo fogo. A ideia é que, a partir do ingresso de novos integrantes e a compra de equipamentos, o serviço possa ser expandido. Cerca de 30 municípios de pequeno porte possuem bombeiros voluntários. Nós não temos nada contra esse serviço, mas ele deve ser organizado e treinado pela corporação.
JC - A aprovação da proposta de desvinculação da corporação aconteceu em junho. Agora deve ser elaborada a lei que regulamenta esta mudança. O que vocês esperam desta nova legislação?
Ramos - Existe um grupo de trabalho instituído pelo governo. O prazo para essa regulamentação se encerra em novembro. Assim, precisamos criar uma lei sobre as estruturas, determinando se a instituição será mais enxuta. Temos que criar a fixação de efetivos para determinar quem trabalhará nestas estruturas. Além disso, precisamos criar a lei de migração, para definir quem fica na BM e nos bombeiros. Os agentes podem optar onde ficarão, pois todos prestaram concurso para a Brigada. Além disso, pretendemos criar um novo plano de carreira e um regulamento de uniformes. Desde 20 de junho somos independentes, mas o processo de implementação vai até 2016. A intenção é que nesse ano ingresse a primeira turma de oficiais bombeiros na corporação.
JC - A remuneração dos bombeiros deve ser ampliada?
Ramos - Quando lutamos pela independência, não brigamos por aumento salarial, pois sabemos que isso depende muito do governo. A tendência é que grupos menores acabem sendo melhores remunerados. Hoje, no Estado, existem 2.600 bombeiros e 20 mil policiais militares.