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REPRESENTAÇÃO POLÍTICA

- Publicada em 26 de Março de 2014 às 00:00

Mulheres continuam distantes do poder


GUSTAVO LIMA/AGÊNCIA CÂMARA/JC
Jornal do Comércio
A criação da reserva de gênero para candidaturas proporcionais teve pouco impacto nos resultados das eleições, e as mulheres – historicamente distantes da política tradicional – continuam pouco representadas nos legislativos e executivos do País. Ainda que representem 52% da população brasileira e tenham assegurados, pelo menos, 30% das candidaturas proporcionais, as mulheres ocupam apenas 13,3% das vagas nas câmaras municipais e 12,1% nos executivos do País. Na segunda reportagem sobre o espaço ocupado pelas minorias na política, o Jornal do Comércio traça um panorama das dificuldades femininas para chegar ao poder, os obstáculos para ter visibilidade nos mandatos e as resistências do Judiciário em analisar possíveis fraudes dos partidos políticos ao sistema de reserva de vagas por gênero. 

A criação da reserva de gênero para candidaturas proporcionais teve pouco impacto nos resultados das eleições, e as mulheres – historicamente distantes da política tradicional – continuam pouco representadas nos legislativos e executivos do País. Ainda que representem 52% da população brasileira e tenham assegurados, pelo menos, 30% das candidaturas proporcionais, as mulheres ocupam apenas 13,3% das vagas nas câmaras municipais e 12,1% nos executivos do País. Na segunda reportagem sobre o espaço ocupado pelas minorias na política, o Jornal do Comércio traça um panorama das dificuldades femininas para chegar ao poder, os obstáculos para ter visibilidade nos mandatos e as resistências do Judiciário em analisar possíveis fraudes dos partidos políticos ao sistema de reserva de vagas por gênero. 

As dificuldades das mulheres para ocuparem cargos eletivos são semelhantes em todo o País. No Rio Grande do Sul, as vereadoras representam 14,1% do total de legisladores municipais. O percentual é composto principalmente pelos municípios pequenos e médios, já que, nos grandes colégios eleitorais do Estado, as mulheres têm espaço diminuto. Em Canoas e Pelotas, por exemplo, não há nenhuma representante feminina dentre os 21 parlamentares de cada legislativo, ainda que, em ambos, a vaga de vice no Executivo seja ocupada por mulheres, Beth Colombo (PP) e Paula Mascarenhas (PPS), respectivamente. Caxias do Sul, Gravataí e Novo Hamburgo têm apenas uma representante nas casas legislativas. Na Capital, o índice é semelhante à média do Estado, e a Câmara Municipal tem 13,3% de suas vagas ocupadas por mulheres. Dos 497 municípios do Estado, somente em Almirante Tamandaré do Sul, no Alto Jacuí, e Barra Funda, na Zona da Produção, as mulheres são maioria nos legislativos.

Vereadora de Porto Alegre em segundo mandato, Fernanda Melchionna (P-Sol) avalia que as dificuldades para as mulheres ingressarem na política estão relacionadas ao machismo cotidiano aos quais estão submetidas. “Existe uma situação marcada por esta trajetória de machismo na sociedade. As mulheres têm dificuldade para postular cargos, porque ainda enfrentam uma jornada dupla de trabalho, porque o trabalho doméstico é associado à mulher, o cuidado dos filhos também, porque não existem creches suficientes para deixar as crianças”, avaliou.

Fernanda cita, como exemplo, a participação feminina em outros espaços políticos. “Nas associações de moradores, associações comunitárias e clubes de mães, a presença feminina é massiva. Mas elas não conseguem se envolver em outros locais em função desses fatores”, afirma. A vereadora também avalia que a estrutura partidária da maioria das legendas não estimula a participação das mulheres. “Na política tradicional, com partidos extremamente fisiológicos, nos quais poucos caciques determinam o que acontece, não há abertura de espaço nem para as mulheres nem para novas lideranças”, criticou. 

A parlamentar pondera ainda que, mesmo que o ingresso de mulheres na política seja uma conquista por si só, é necessário que a presença feminina se reflita em posturas progressistas de atuação. “Não basta ser mulher, tem que ser combativa e tocar em temas fundamentais para o avanço das garantias femininas”, disse. 

O fato de a política ter sido tradicionalmente uma esfera constituída por homens – e de a sociedade relacionar o poder ao masculino – faz com que as mulheres enfrentem inúmeras resistências quando chegam aos parlamentos e executivos. A deputada federal Manuela d’Ávila (PCdoB) integra os 9% de mulheres no Congresso Nacional e, em diversas oportunidades, já denunciou o machismo das estruturas de poder. “O machismo se apresenta de várias formas, mais visível é o machismo explícito. Mas tu podes constatar um machismo mais velado, como, por exemplo, a baixíssima presença das mulheres entre os líderes de partido, nas presidências de comissão e nos espaços mais representativos do Congresso Nacional”, explicou.

A não ocupação de espaços mais representativos – que dependem da indicação dos partidos políticos e são fruto de negociação entre os principais dirigentes – auxilia na invisibilidade do trabalho realizado pelas parlamentares. “O colégio de líderes, por exemplo, é o principal espaço da Câmara, é onde se ordena a pauta e, no ano passado, eu era a única mulher líder de um partido. Não podemos desvalorizar os espaços que as mulheres ocupam, sua tradição de luta pela educação, por exemplo. Mas não podemos achar normal que as mulheres não ocupem espaços de maior prestígio, vinculados à infraestrutura e ao orçamento.”

Manuela avalia que, além da cota de gênero, o posicionamento da presidente Dilma Rousseff (PT) – primeira presidente mulher do País – sobre o tema pode auxiliar na ampliação da presença feminina no debate nacional. “O que mudou depois da Dilma é que a chefe do Executivo colocou um critério para a nomeação que inclui o gênero. Os partidos não fizeram indicações de mulheres para ocupar os ministérios, então, ela indicou, de sua cota pessoal, mulheres para ocupar ministérios”, afirmou.

‘Judiciário precisa ser mais atuante’, defende a presidente do Tribunal Regional Eleitoral

A presidente do Tribunal Regional Eleitoral (TRE), Elaine Macedo, é uma das principais especialistas sobre a discussão de gênero na política. Primeira mulher a ocupar o cargo mais importante da Justiça Eleitoral gaúcha em 84 anos, Elaine critica a postura do Judiciário no que diz respeito à inclusão das mulheres no processo político. “Está na lei a necessidade de inclusão, e a democracia é um processo de inclusão. Mas se há uma área na qual a atuação da mulher tem sido negligenciada, esta área é a política”, afirma a desembargadora.

Nas eleições municipais de 2012, Elaine foi derrotada em uma discussão central sobre os espaços ocupados pelas mulheres na política: a efetiva realização da reserva de gênero. Neste pleito, o TRE julgou três processos em que era questionada a desistência de mulheres em disputar as eleições – os partidos cumpriam a cota, mas o número de candidatas que efetivamente concorria era menor. A consequência prática nestes casos foi de que, com a renúncia feminina, o número de candidaturas masculinas se tornou superior aos 70% previstos como índice máximo para a reserva de gênero. Em alguns casos, se o tribunal se manifestasse de forma favorável à impugnação de candidaturas masculinas – para manter a proporcionalidade de gênero –, o resultado das eleições seria alterado.

“Os partidos, em sua grande maioria, atenderam à cota de gênero no registro de candidaturas, mas nós tivemos muitos casos das chamadas candidaturas laranjas. Ou seja, o partido apresenta um roll de candidaturas, mas, após o deferimento do registro, as mulheres renunciam tacitamente – não fazendo campanhas ou não tendo despesas eleitorais – ou formalmente à candidatura. Então, nós temos uma fraude”, afirma.

Entretanto, nos três casos julgados, a maioria do pleno do TRE avaliou que a legislação prevê a reserva de vagas para o registro de candidaturas, e que a renúncia de candidatas não deve alterar a composição das coligações. “O processo eleitoral é composto por diversas etapas, desde o registro do domicílio eleitoral, registro das candidaturas, campanha eleitoral, sufrágio e a diplomação dos eleitos. Este é o processo eleitoral, ele não se restringe ao registro de candidaturas”, critica.

Para Elaine, não é necessária a criação de um regramento específico determinando o que acontece com a renúncia de candidaturas femininas. A desembargadora defende que é preciso um comprometimento maior do Judiciário com essa questão. “Essa é uma ação afirmativa e tem que comprometer os Três Poderes. O Judiciário tem que saber executar isso de maneira mais efetiva. Está muito aquém do que poderia fazer para fiscalizar e garantir essa representação”, observa a desembargadora.

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