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TRABALHO

- Publicada em 31 de Dezembro de 2013 às 00:00

Dumping social coloca em xeque os diretos dos trabalhadores


ANTONIO PAZ/JC
Jornal do Comércio
O nome pomposo – dumping social – que começa a ganhar presença nas sentenças da Justiça do Trabalho consiste na prática contumaz de descumprir a legislação trabalhista a ponto de prejudicar a concorrência.
O nome pomposo – dumping social – que começa a ganhar presença nas sentenças da Justiça do Trabalho consiste na prática contumaz de descumprir a legislação trabalhista a ponto de prejudicar a concorrência.
Em novembro, duas grandes empresas, Magazine Luiza e Usina Santa Isabel, foram condenadas a pagar indenizações por desrespeitar as leis trabalhistas. Somente em 2013, as multas impostas somam mais de R$ 200 milhões, envolvendo também Casas Pernambucanas e Ford.  O  Magazine Luiza foi condenado em segunda instância a pagar R$ 1,5 milhão. Acusado de impor jornadas exaustivas, sofreu 87 autuações por esse motivo. Firmou dois acordos, os chamados termos de ajustamento de conduta, com o Ministério Público do Trabalho em 1999 e 2003, ambos descumpridos, segundo a procuradora Regina Duarte da Silva, autora da ação. “Restou evidente que a ré obteve redução dos custos com mão de obra de forma ilícita, com prejuízo às demais concorrentes que cumprem com as suas obrigações trabalhistas, bem como com dano a toda a sociedade”, escreveu o desembargador João Alberto Alves Machado em seu voto.
Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Ives Gandra Martins Filho acredita que essa tese chegue para análise dos ministros no início de 2014. Ainda não há sentenças superiores, transitadas em julgado, condenando empresas por dumping social. “Quando há o descumprimento generalizado de obrigações trabalhistas que fazem com que uma empresa tenha vantagem em relação a outra, o termo dumping social é interessante por resumir tudo que está acontecendo”, afirma o ministro.
O  Magazine Luiza recorrerá da sentença por discordar da decisão e diz que mantém “boas práticas de gestão de pessoas”, inclusive sendo premiado como uma das melhores empresas para se trabalhar por 15 anos seguidos. No processo, a empresa alega que não teve redução de custos, por ter pago mais pelas horas trabalhadas, o que teria não diminuído, mas elevado o seu custo. O desembargador rebate o argumento, afirmando que a constatação de horas extras acima do permitido, que são duas horas diárias, foi flagrada em lojas de diversos municípios, o que comprovaria prática habitual da empresa.
A Usina Santa Isabel foi outra a ser condenada recentemente. Está recorrendo da sentença que a condenou a pagar R$ 1,3 milhão de indenização por dumping social. Além das jornadas maiores que o permitido, o Ministério Público do Trabalho acusa o braço agropecuário da empresa de forjar o cartão de ponto, o que é chamado de ponto britânico, no qual todos entram e saem exatamente no mesmo horário, sem qualquer alteração. “O dumping social geralmente acontece em grandes empresas que têm condições de suportar as autuações e departamentos jurídicos grandes que podem recorrer a última instância”, alega o procurador Rafael de Araújo Gomes, autor da ação.
A Usina Santa Isabel também recorreu da condenação em primeira instância. De acordo com o supervisor de administração de pessoal da usina, Egídio Garcia, a empresa “sempre cumpriu com as normas trabalhistas”, embora reconheça que tenha havido “alguns excessos na carga horária”, mas acordado com sindicato dos trabalhadores e homologado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). “Tudo foi acertado em acordo coletivo”, assegura Garcia, lembrando que a usina tem se adequado às normas impostas pelos fiscais do trabalho.
A Ford levou a condenação mais alta. A Justiça do Trabalho impôs indenização de R$ 400 milhões, a metade por dumping social. Neste caso, a terceirização de atividade-fim por uma associação de valorização de pessoas com deficiência levou à condenação. Sobre a ação em que também foi condenada, a Ford alega que “o processo em questão encontra-se sub judice” e que, por isso, “aguardará uma solução final por parte dos órgãos competentes”.
A Casas Pernambucanas foi condenada a pagar R$ 6 milhões por fraude no programa de aprendizes no início de 2013. Ela é acusada de usar a mão de obra do aprendiz como um funcionário comum.

Ações começam a se espalhar pelo País

Além das condenações, há pelo menos mais duas ações civis públicas em andamento somando R$ 25 milhões, mas sem qualquer sentença proferida. As ações não se limitam a São Paulo. O Ministério Público do Trabalho da Bahia também entrou com processo contra a indústria têxtil Trifil, que tem sua fábrica em Itabuna, a cerca de 220 quilômetros de Salvador. O pedido de indenização por danos morais coletivos é de R$ 15 milhões. Lá, a questão é segurança do trabalho. Dois dias depois da morte de Joadson Bispo Oliveira, de 18 anos, sugado por uma centrífuga, a 3ª Vara do Trabalho de Itabuna concedeu liminar no dia 23 de setembro, obrigando a empresa a tomar medidas de prevenção, mas não analisou o mérito do pedido de indenização. “O que a Trifil faz é dumping social, ou seja, a empresa prefere pagar as multas da fiscalização em vez de cumprir a lei no que se refere a normas de segurança, e essa morte é fruto desse comportamento”, afirma a procuradora Cláudia Soares, autora da ação civil pública. Nos últimos dez anos, foram registrados cerca de 400 acidentes de trabalho na fábrica. A Trifil reforça que cumpre a lei.
Em Minas Gerais, foi a vez da construtora Rodobens ser processada pelo Ministério Público do Trabalho depois que um funcionário terceirizado morreu soterrado ao tentar destravar uma caçamba de terra de um caminhão. Os procuradores consideram o ambiente inseguro, com alojamentos precários e sem equipamentos de proteção individual. Na ação, os procuradores pedem R$ 10 milhões por dumping social. A Rodobens diz que não comenta “casos em tramitação na Justiça”, mas que “seus empreendimentos operam em estrito cumprimento da legislação trabalhista”.
Esse entendimento de prática abusiva, mais comum aos processos civis, foi descrito no Enunciado número 4, na 1ª Jornada de Direito Material e Processual de 2007, que reuniu magistrados do Trabalho e aconteceu no TST.

Justiça do Trabalho bloqueia R$ 1 milhão da M.Officer por trabalho degradante

A 8ª Vara do Trabalho de São Paulo bloqueou R$ 1 milhão da empresa M5 Indústria e Comércio Ltda, dona da marca M.Officer, para garantir os direitos de trabalhadores resgatados em condições degradantes. Segundo o Ministério Público do Trabalho (MPT), fiscais encontraram um casal de bolivianos produzindo peças da marca em uma oficina clandestina no centro da capital paulista. A empresa deverá providenciar a remoção dos trabalhadores para um local que atenda às normas de saúde e segurança.
De acordo com o MPT, a situação dos bolivianos foi descoberta no dia 13 de dezembro. No local, foram encontrados tecidos, modelagem, notas fiscais e pedidos de serviços da M5, além de peças finalizadas da marca M.Officer. O casal relatou que trabalhava há sete meses na oficina sem qualquer tipo de registro.
O Ministério Público entrou com a ação para dar garantias aos trabalhadores após a empresa ter se recusado a firmar um termo de ajuste de conduta. “A medida judicial é necessária, tendo em vista que a M.Officer não se compadeceu com a situação de absoluta vulnerabilidade dos seus empregados, dois bolivianos que produziam exclusivamente para a empresa”, ressaltou o procurador Tiago Cavalcanti.

Burocracia e custos trabalhistas representam principais entraves para crescimento da economia

Se, por um lado, há empresas que optam por pagar as multas da fiscalização em vez de cumprir a lei – o chamado dumping social -, as que seguem à risca as determinações legais reclamam da burocracia e dos custos trabalhistas, apontados como principais entraves para o crescimento do Brasil no médio e no longo prazo. Segundo o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade, a indústria poderia crescer de 4% a 5% ao ano caso os problemas estruturais da economia brasileira sejam resolvidos. Conforme a edição anual do Informe Conjuntural, divulgada em dezembro pela entidade, a indústria crescerá 1,4% em 2013 e 4% no próximo ano.
Para o presidente da CNI, a burocracia atualmente representa o principal obstáculo para os investimentos dos empresários. “A burocracia mata qualquer atividade econômica. Dificulta qualquer empreendimento e desestimula os investimentos. Até na vida pessoal, nos penaliza enormemente. O País avançaria muito apenas com a diminuição da burocracia”, explicou.
Em relação aos custos trabalhistas, Andrade pediu a simplificação da legislação trabalhista, que, conforme ele, prejudica tanto patrões como empregados. “A Justiça Trabalhista deixou de ser o fiel da balança entre capital e trabalho e passou a formular legislações, desestimulando os acordos entre empregados e patrões. Isso, na prática, enfraquece os sindicatos, tanto patronais como profissionais”, criticou.
Para o dirigente, a redução dos encargos trabalhistas melhoraria a situação dos empregados, à medida que permitiria aos empresários pagar salários maiores. O aumento da renda, disse, ajudaria a elevar o consumo e aquecer a economia. “No Brasil, o trabalhador custa muito para as empresas e ganha pouco. Gostaria que fosse o contrário”, destacou.
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