Os mutuários que compraram imóveis pelo sistema Minha Casa, Minha Vida no empreendimento Moradas do Pinheiro II, na Lomba do Pinheiro, em Porto Alegre, continuam sem previsão de quando a obra será retomada. Segundo Fabiano Araújo, líder do grupo de futuros moradores, a Caixa Econômica Federal (CEF) solicitou que eles façam um abaixo-assinado pedindo a retirada da Construtora e Incorporadora Walan Ltda (Conkretus) do negócio. Nesta semana, o diretor da construtora, Walter Silva, esteve reunido com o grupo e incentivou que o documento requisite o retorno da empresa para o canteiro de obras. “Ambos querem que a gente anexe esse abaixo-assinado no processo judicial. Nos próximos dias, decidiremos o que vamos fazer”, afirma Araújo.
Para ele, é mais plausível estudar com os colegas a possibilidade de fazer o documento pleiteando a volta da construtora. “Eu cogitei fazer o abaixo-assinado para a Caixa, mas eles não nos dão nenhuma garantia de que outra construtora assumirá a empreitada imediatamente. Eles não nos dão nem estimativa de prazo. Já em relação à Conkretus, não vejo motivo para um empresário se arriscar a terminar a construção se não tivesse condições”, avalia.
Em processo de recuperação judicial desde setembro de 2012, a Conkretus obteve autorização da instituição financeira, em janeiro, para recomeçar um empreendimento em condições similares em Santo Ângelo. De lá para cá, o banco tem recorrido das decisões judiciais que mantêm a construtora como responsável pela obra em Porto Alegre. Atualmente, a ação aguarda decisão do Tribunal de Justiça do Estado (TJRS).
Silva alega que a CEF impôs termos aditivos ao contrato firmado com a construtora, após a mesma comunicar ao banco sobre a falta generalizada de materiais e de mão de obra no mercado e o atraso nas obras de contrapartida das prefeituras. Os municípios teriam atrasado os cronogramas, e assim a companhia teria sofrido com uma inflação acima da média. Com isso, após várias negociações, a CEF teria acenado com a possibilidade de um empréstimo acompanhado de um plano de recuperação financeira. Ainda segundo Silva, o próprio banco descartou a ideia.
Ele explica que, em março de 2012, a CEF teria aceitado implementar um plano emergencial, passando a assumir diretamente os canteiros de todas as obras da Faixa I (de zero a três salários-mínimos) em Santo Ângelo, Passo Fundo e Montenegro, em nome da Conkretus. Durante esse período, a Caixa não teria pago rescisões e acordos trabalhistas oriundos da situação financeira da construtora, o que fez com que o Ministério Público do Trabalho de Santo Ângelo bloqueasse todas as contas da empresa. Desta maneira, o banco passou a administrar também as obras da Faixa II (de três a seis salários-mínimos) – como o Moradas do Pinheiro II, na Capital.
Conforme o empresário, situações semelhantes foram denunciadas pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção Civil (CBIC) em carta enviada à Caixa no dia 5 de outubro de 2011. De acordo com Silva, em 28 de maio de 2012, o procurador do Ministério do Trabalho de Santo Ângelo, Veloir Furst, sugeriu que as partes entrassem em acordo em um prazo de dez dias.
No dia 8 de junho de 2012, ao final do prazo concedido pelo procurador, o banco teria comunicado a rescisão dos contratos com a Conkretus e tomado posse, sem autorização judicial, de todos os canteiros de obras da Faixa I que estavam sob a sua administração em Santo Ângelo, Passo Fundo e Montenegro. “Nós tínhamos um prazo de 15 dias para desocupar as obras, e a Caixa invadiu com a Brigada Militar em uma das cidades antes do término do tempo permitido”, ressalta Silva.
Dúvidas cercam futuro do condomínio
A Caixa, por meio de nota, comunicou que mantém parceria com a construtora “há vários anos” e que ocorreram injustificados atrasos e paralisações de obras, “fatos que denotaram o descumprimento de suas obrigações contratuais”. O banco preferiu não responder aos questionamentos feitos pelo Jornal do Comércio em relação a cada um dos pontos citados pelo diretor da Conkretus e pelos mutuários.
A instituição financeira observa que, em decorrência das faltas verificadas, foi acionada a seguradora da obra para substituir a construtora. Os empreendimentos vinculados ao Minha Casa, Minha Vida - Faixa I, que não contam com o seguro, tiveram os seus contratos rescindidos, e as obras, retomadas pela Caixa, “que os dotou de segurança, evitando depredações ou invasões.”
No caso da Faixa II, na Lomba do Pinheiro, a maior reclamação dos mutuários é de que o banco não substituiu a construtora após assumir a administração do empreendimento, durante os 90 dias que se passaram até que a Conkretus tivesse o pedido de recuperação judicial concedido. A CEF não respondeu a esse questionamento.
Em setembro de 2012, a construtora teve o pedido de recuperação judicial concedido. Assim, em Santo Ângelo, retomou a obra em janeiro. “Por que em Porto Alegre a Walan não pode retomar a obra se já obteve três decisões judiciais solicitando a manutenção dos contratos? O contrato com a CEF na Capital é de R$ 11 milhões. Nós temos um saldo de R$ 5 milhões para receber do banco. São 220 apartamentos, sendo que 160 assinaram acordo com a Walan. Ainda há 60 apartamentos para serem edificados”, contabiliza o diretor da construtora.
A Caixa não respondeu ao JC porque recorreu ao TJRS. Entre os mutuários, pairam no ar várias perguntas. Não seria mais vantajoso para a CEF permitir a retomada da obra, repassando para a Walan todas as ações trabalhistas? Se a Walan vier a falir, quanto tempo especificamente a Caixa precisa para colocar uma nova construtora e dar seguimento às obras em Porto Alegre? A CEF teme que, caso a Walan consiga parecer favorável, isso represente uma abertura de precedente para que outras empresas tentem o mesmo caminho na Justiça?
O líder do grupo de futuros moradores, Fabiano Araújo, é categórico: “Faríamos uma manifestação em frente à agência da Caixa na Rua dos Andradas no dia 28 de fevereiro para cobrar uma atitude do banco. Após reportagem publicada pelo JC em 22 de fevereiro, a CEF mudou o tratamento conosco. Nos chamaram para uma reunião e pediram para que não fizéssemos o protesto. Naquele dia, fizeram até ata do encontro. Antes, só havíamos conseguido (audiência) mediante interferência de um deputado, e não houve ata.”
Obras deveriam estar prontas em janeiro
Os contratos do empreendimento Moradas do Pinheiro II previam a entrega das residências para janeiro. As obras estão paradas há 11 meses. Os mutuários manifestam que a cláusula 22 do contrato para aquisição do imóvel estipula que, em caso de atraso por período superior a 30 dias, será acionada a seguradora para substituir a construtora. Com base no documento, os recursos provenientes do contrato de mútuo devem ser liberados à seguradora para que o empreendimento seja concluído, “ficando a seguradora responsável pelo andamento da obra até a sua conclusão, conforme previsto na respectiva Apólice de Seguro Garantia do Construtor”.
A estatal, que financia o empreendimento, diz que a contratação de outra construtora não pode ocorrer devido à tramitação de uma ação de recuperação judicial imposta pela empresa perante a 5ª Vara Cível da Comarca de Canoas. Enquanto não houver uma decisão do Judiciário, o banco não pode rescindir o contrato. A Caixa enfatiza que os recursos para a finalização do empreendimento estão depositados sob sua gestão, aguardando decisão da Justiça.