As mudanças climáticas têm sido motivo de preocupação entre oncologistas desde que estudos recentes apontaram a relação entre fatores como a poluição ambiental e o aumento de casos de alguns tipos de câncer. A apreensão já foi endereçada em uma declaração da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (Asco) que afirmou que uma variedade de mecanismos estão relacionados a um maior risco de câncer, incluindo aumento da exposição a raios ultravioleta, exposição à poluição e a produtos químicos tóxicos, calor extremo e o acesso reduzido ao rastreamento da doença. As evidências mais robustas até agora relacionam a maior poluição do ar decorrente de eventos climáticos extremos à maior incidência de câncer de pulmão, diz Angélica Nogueira, presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica.
O câncer de pele é o mais frequente no mundo, seguido do de pulmão. No Brasil, o Instituto Nacional do Câncer (Inca) estima 220.490 novos casos de câncer de pele não-melanoma no triênio 2023 a 2025, 8.980 novos casos de câncer de pele melanoma e 32.560 novos casos de câncer de traqueia, brônquio e pulmão. "O fato é que está acontecendo um aumento da incidência de vários tipos de câncer, mesmo em pessoas jovens, por exemplo, e não está havendo uma mudança da parte genética. Então, provavelmente, é por causa de um fator externo e ambiental", afirma Daniel Musse, oncologista clínico da Rede D'Or.
Um dos estudos usados como base para reforçar o argumento analisou dados de mais de 2 milhões de canadenses por cerca de 20 anos e concluiu que a exposição a incêndios florestais foi associada a uma incidência 4,9% maior de câncer de pulmão do que populações não expostas, e, surpreendentemente, a uma incidência 10% maior de tumores cerebrais. Uma segunda estimativa mencionada pela Asco e, também, pela Associação Internacional de Estudos de Câncer de Pulmão em 2022, é de que a poluição do ar seja responsável por aproximadamente 14% dos casos de câncer de pulmão no Mundo.
Há também evidências que apontam a relação das mudanças climáticas com o câncer de pele. Em editorial da The Lancet Oncology publicado em 2023, a revista diz que o aumento das temperaturas, a degradação da camada de ozônio e a maior exposição ao sol são um número crescente de ameaças à saúde, e que as ondas de calor extremas tornaram-se um fator de risco significativo para esse tipo de câncer. Uma revisão de literatura anterior concluiu ainda que a exposição à radiação UV é o maior fator de risco para esse tumor.
A médio e longo prazo, é possível considerar que os desastres naturais resultantes da mudança climática, como inundações e incêndios, podem ocasionar a liberação de substâncias cancerígenas e metais pesados que podem contaminar o solo, a água e aumentar a incidência da doença, afirma Angélica Nogueira.
Esses eventos também dificultam o cuidado ao câncer, doença que requer acesso consistente aos serviços de saúde. Dados históricos e emergentes demonstram que interrupções relacionadas ao clima estão associadas a piores prognósticos. Segundo Musse, o acesso à radioterapia é de particular preocupação durante catástrofes devido à sua programação de tratamento geralmente diária e à dependência de energia elétrica.
Esses eventos também dificultam o cuidado ao câncer, doença que requer acesso consistente aos serviços de saúde. Dados históricos e emergentes demonstram que interrupções relacionadas ao clima estão associadas a piores prognósticos. Segundo Musse, o acesso à radioterapia é de particular preocupação durante catástrofes devido à sua programação de tratamento geralmente diária e à dependência de energia elétrica.
Para o oncologista da Rede D'Or, embora as pesquisas ainda sejam escassas, essa é uma área emergente de estudo. A dificuldade, segundo Musse, acontece porque descobrir se um fator de risco é ou não causador de câncer é um trabalho difícil, uma vez que deve-se considerar uma gama de fatores de risco associados à doença, incluindo fatores genéticos.
Folhapress