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Opinião Econômica

- Publicada em 14 de Setembro de 2022 às 20:36

Sinais de desaceleração na China

Samuel Pessôa
Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e sócio da consultoria Reliance, é doutor em economia pela USP
Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e sócio da consultoria Reliance, é doutor em economia pela USP
A China representa um capítulo adicional do modelo de crescimento asiático. A associação de economia de mercado com muito esforço de acumulação -longas jornadas de trabalho, elevadíssima qualidade da educação pública e muita parcimônia no consumo- gera economias que conseguem em algumas décadas transitarem da pobreza para a renda elevada.
Marx chamaria esse modelo de acumulação primitiva. Uma ou duas gerações pagam um custo imenso em contenção de consumo, esforço de trabalho e estudo, para legar a seus netos um país de primeiro mundo.
O modelo asiático de crescimento consegue gerar níveis de produtividade do trabalho de no máximo 80% da produtividade americana. A partir desse nível as economias perdem dinamismo e passam a crescer no mesmo ritmo da economia líder. Note que esse desempenho está longe de ser ruim.
Sempre achei que o crescimento da China tem fôlego longo e que os primeiros sinais de perda de desempenho ocorreriam mais à frente. Hoje a produtividade do trabalho é da ordem de um terço da americana.
Também nunca acreditei que uma crise de crédito pudesse dificultar a trajetória chinesa. Em um governo ditatorial, os formuladores de política econômica têm instrumentos e discricionariedade para responder rapidamente a uma crise de crédito e evitar que se torne sistêmica.
Assim, o único limitador para a continuidade do crescimento chinês seria que o processo, a partir de algum momento, apresentasse sinais de queda do crescimento da produtividade. Devido à elevada qualidade do sistema público de educação, sempre me pareceu que esse momento ficaria para daqui algumas décadas.
No entanto, há sinais de que a capacidade de crescimento da China se reduziu. Como sempre, em momentos de possível mudança de regime é muito difícil separar a conjuntura de dinâmicas estruturais.
Parte apreciável da desaceleração da China deve-se à dificuldade do governo chinês em criar uma nova estratégia para conviver com a Covid. De certa forma, sequestrado pelo enorme sucesso que teve no período mais agudo da epidemia, o governo insiste em uma política de Covid zero. Está com muita dificuldade em reconhecer que a epidemia virou endêmica.
Adicionalmente, desde setembro do ano passado, em resposta ao aperto regulatório em setembro de 2020, o setor imobiliário tem representado forte vento de proa para a atividade chinesa.
No entanto, parece haver sinais de que a demanda não se recupera. Os indicadores de confiança dos consumidores estão nas mínimas desde pelo menos 2006. Desde 2008 a confiança dos consumidores com relação a ganhos de renda futura tem decrescido e, consequentemente, o desejo de aumentar as poupanças tem crescido.
Todos esses fatos desaguam em baixíssimo crescimento do varejo. Tem rodado no mesmo nível de dezembro de 2019.
A resposta da política monetária, fruto da carência de demanda, tem sido rápida. As taxas de juros estão nas mínimas históricas. Em torno de 1,4% nominal e pouco abaixo de -1% real.
Assim, talvez a China esteja em meio a um equilíbrio com carência de demanda agregada e será necessário que os formuladores de política econômica revejam seus modelos mentais. É necessário que os benefícios do Estado de bem-estar, principalmente a aposentadoria, sejam muito menos avarentos.
Esse passo a economia japonesa ainda não conseguiu dar. Parece que a China vai pelo mesmo caminho, de forma prematura em comparação ao Japão.
 
Samuel Pessôa
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