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Opinião Econômica

- Publicada em 12 de Setembro de 2022 às 20:11

A demanda dos trabalhadores por mais flexibilidade

Cecilia Machado
Economista, professora da EPGE (Escola Brasileira de Economia e Finanças) da FGV
Economista, professora da EPGE (Escola Brasileira de Economia e Finanças) da FGV
Os primeiros anos no mercado de trabalho são muito produtivos para os jovens. Durante esse período, os salários desses trabalhadores crescem rapidamente e eles frequentemente mudam para empregos de maior remuneração.
Ao mesmo tempo, os trabalhadores jovens são particularmente vulneráveis a condições adversas da economia. Por exemplo, sabe-se que eles carregam o peso das recessões, tanto porque os salários iniciais são menores quanto porque essas condições de emprego têm efeitos duradouros.
Interrupções no processo de progressão causadas por recessões afetam não apenas os rendimentos ao longo da carreira como também a saúde, a autossuficiência econômica e as decisões de formação de família desses jovens.
É por esses motivos que nem as mais otimistas das previsões poderiam antecipar o que hoje se vê hoje no mercado de trabalho das economias desenvolvidas e emergentes no pós-Covid.
Nos EUA, há mais vagas abertas que trabalhadores em busca de emprego. A taxa de desemprego, que chegou a 14,7% em abril de 2020, retrocedeu de volta para 3,7%. No Brasil, não há estatísticas para o número de vagas abertas, mas a taxa de desemprego alcançou 9,1%, o menor valor da série histórica desde 2015, o primeiro de dois anos de crescimento negativo da economia. A resiliência da economia brasileira alimenta a perspectiva de que ainda há espaço para mais melhoras no mercado de trabalho.
O fato é que, passados quase três anos desde o início da pandemia, deparamo-nos com um mercado de trabalho muito diferente do que existia em 2019. A pandemia mudou a forma como as pessoas encaram seus trabalhos, e elas passaram a demandar mais flexibilidade em seus contratos de emprego. O uso de tecnologias vem permitindo que mais pessoas possam trabalhar em jornadas de menos horas, podendo até executar suas funções de forma remota.
Estudo recente apresentado em Jackson Hole -uma importante conferência organizada pelo Fed com a presença de economistas e formuladores de políticas de todo o mundo- corrobora essa visão, reforçando que a quantidade de horas ofertadas pelos trabalhadores (margem intensiva) é tão (ou mais) importante para documentar a evolução do mercado de trabalho quanto as métricas de emprego (margem extensiva) comumente utilizadas (Bick, Blandin, & Fuchs-Schündeln, 2022).
O estudo argumenta que as mudanças nos arranjos de trabalho -que se tornaram mais flexíveis após a pandemia- correspondem a uma redução nos custos do trabalho, que se manifesta na economia de tempo no deslocamento de casa para o trabalho, no acesso a empregos mais promissores em locais mais distantes e até mesmo na possibilidade de executar múltiplas tarefas (de trabalho e de casa) simultaneamente quando o trabalhador está em home office.
Essas mudanças teriam sido capazes de atrair para o mercado de trabalho justamente aqueles que não trabalhariam em arranjos mais rígidos.
Assim, uma diminuição no custo do trabalho é coerente com o aumento do emprego e a redução das horas por trabalhador, conforme está sendo visto nas diversas economias do mundo. Essa nova configuração tem importante implicações para a condução das políticas monetárias, em particular aquelas que consideram metas de emprego em seus objetivos, e fiscais, como a rede de proteção social para trabalhadores que não se beneficiaram do home office e de jornadas flexíveis.
O caso brasileiro é particular. De um lado, a nova configuração das relações trabalhistas encontrou terreno fértil em um mercado de trabalho mais dinâmico após a reforma trabalhista de 2017. De outro, há pouca evidência de que o trabalho remoto seja uma conquista permanente dos trabalhadores que podem executar suas funções a distância, ou que ele possa eventualmente se aplicar a mais categorias de emprego. Nova propostas de reformas que tornam o mercado de trabalho mais rígido, ou mesmo decisões do STF que estimulam o litígio (como a que julgou inconstitucional o pagamento dos honorários de sucumbência pela parte perdedora), vão na contramão da evidente demanda dos trabalhadores por mais flexibilidade. Para os jovens que ingressam nesse novo mercado de trabalho, ele pode ser um de grandes oportunidades, ou de grandes desafios.
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­­­­Esta coluna é uma homenagem às turmas de 2019 e 2020 do curso de graduação em economia na FGV EPGE, para o qual o tive a honra de ser patrona e cuja cerimônia presencial de colação de grau pôde ocorrer apenas na semana passada, em razão da pandemia. Eles fazem parte da primeira geração de jovens universitários que ingressa nesse novo mercado de trabalho.
 
Cecilia Machado
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