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Opinião Econômica

- Publicada em 10 de Agosto de 2022 às 20:29

Quão longa será a maratona do combate à inflação?

Solange Srour
 
 
Economista-chefe de Brasil do banco Credit Suisse. É mestre em economia pela PUC-Rio
Com a inflação na maioria das economias avançadas subindo em ritmo acelerado desde meados de 2021, os mais importantes bancos centrais têm elevado as taxas de juros de forma intensa e em alguns casos deixando claro que a prioridade é a volta da estabilidade de preços, mesmo que em detrimento do crescimento. Em várias economias, já vemos sinais de desaceleração, as cotações de commodities vêm caindo e algumas curvas de juros já precificam um afrouxamento da política monetária em 2023. Será que já temos evidências de que inflação voltará para patamares baixos e, consequentemente, podemos esperar mensagens menos duras por parte dos bancos centrais?
Em artigos anteriores, tratei de fatores estruturais que poderiam levar a níveis de inflação mais altos nos próximos anos, como os efeitos de uma possível retração do processo de globalização, as mudanças na taxa de participação da força de trabalho, a busca por matrizes energéticas alternativas, entre outros. Neste artigo, o foco é a análise do atual estágio do ciclo econômico e seus impactos nas perspectivas para o crescimento dos próximos trimestres.
O mais importante fator para a mensuração da fase do ciclo é o estado do mercado de trabalho. Neste aspecto, os EUA despontam como a economia mais aquecida do globo e com alto risco de ter as pressões inflacionárias correntes carregadas para o futuro.
Na última sexta-feira (5), os dados divulgados foram surpreendentemente fortes. Ainda há cerca de 11 milhões de vagas em aberto e menos de 6 milhões de desempregados. Mesmo os setores mais sensíveis à subida dos juros, como o imobiliário e o de bens duráveis, continuam empregando em ritmo forte. A combinação da mais baixa taxa de desemprego em 50 anos com salários em alta tem sustentado a renda das famílias e evitado uma queda mais significativa do consumo, mesmo com a inflação atuando na direção oposta.
Na Europa, a situação do mercado de trabalho está bem longe da pujança americana, mas os reajustes salariais não sentiram a desaceleração da atividade econômica. O fato é que, depois de tanto tempo de inflação elevada, os preços e salários começam a reagir à inflação passada, e a inércia aparece. As condições financeiras globais estão mais restritivas, e há sinais claros de desaceleração, principalmente no setor industrial ""em que os estoques já começam a ser normalizados. No entanto, a alta dos juros não parece suficiente (as taxas de juros reais permanecem negativas em grande parte dos países desenvolvidos) a ponto de impactar mais os serviços. Pode ser que a demanda ainda esteja sendo sustentada pela reabertura pós-pandemia, mas o fato é que neste setor, em geral, não há sinais de alívio inflacionário.
De outro lado, como fator de menor pressão inflacionária temos o reestabelecimento das cadeias produtivas, impactadas pela pandemia e pela guerra. Pela primeira vez em dois anos, os indicadores que medem as disrupções na oferta de insumos industriais e alimentos têm mostrado sinais de normalização. Esse alívio pode ajudar na desaceleração da inflação, mas será suficiente trazê-la de volta para patamares próximos das metas? Muito provavelmente não, se o mercado de trabalho permanecer muito aquecido. Como em quaisquer outros ciclos de aperto monetário, há muita incerteza sobre o quanto mais será preciso avançar nos juros e, consequentemente, qual será o tamanho da desaceleração da atividade necessária. Entretanto, há uma particularidade do momento atual que torna o processo ainda menos previsível.
Grande parte dos bancos centrais errou no diagnóstico de que a inflação seria temporária, demorando para reagir mesmo quando a inflação já se mostrava espalhada e mais persistente e colocando em risco sua credibilidade. Hoje as expectativas para a inflação de médio e longo prazo estão controladas, mas o perigo de desancoragem não é pequeno.
Diante de um cenário bem indefinido, é provável que os bancos centrais continuarão agindo vigorosamente. Ainda que os mercados acreditem que haverá um pouso suave das principais economias, o humor muda rápido. Tudo dependerá de como a desaceleração em curso impactará o mercado de trabalho e a formação dos salários, assim com as reações dos bancos centrais que estão com sua credibilidade em xeque.
 
Solange Srour
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