Corrigir texto

Se você encontrou algum erro nesta notícia, por favor preencha o formulário abaixo e clique em enviar. Este formulário destina-se somente à comunicação de erros.

Cinema

- Publicada em 14 de Julho de 2022 às 18:18

Reconstrução

Hélio Nascimento
O título é uma clara referência a um dos maiores filmes da história do cinema: Rocco e seus irmãos, que Luchino Visconti realizou em 1960. O filme intitulado Lola e seus irmãos, uma produção francesa realizada por Jean-Paul Rouve, é uma bela surpresa, numa época em que a comédia é tão maltratada pela incompetência, falta de imaginação e mediocridade de alguns realizadores que dela se aproximam e dela deveriam manter distância, se tivessem mesmo reduzidas porções de autocrítica. Não é o que se poderia chamar de filme de evasão, pois surge comprometido com a crítica endereçada a costumes e rituais regidos pelo culto da artificialidade. Nem todos, como o citado mestre italiano, possuem a necessária lucidez e a capacidade de sintetizar em um filme os sinais mais reveladores de uma época focalizando vidas reais e assim ressaltando a impossibilidade de isolar indivíduos do cenário amplo da realidade. Porém, ao demonstrar admiração por Visconti, Rouve também faz de seu filme um bom exemplo de que o riso não é adversário da contemplação lúcida e de um pensamento marcado pela agudeza da observação e a insolência da crítica. Chaplin deixou inúmeros exemplos e alguns cultores, mesmo que passageiros, de um gênero que então era chamado de alta comédia, como Minnelli, Hawks e Wyler, também deixaram registrados momentos que hoje fazem parte do que se poderia chamar de cinema de repertório, em referência ao teatro, no qual o diretor Rouve também trabalha. E, por sinal, há outra referência no título de seu filme, que também poderia ser uma homenagem a Jacques Démy, pois Lola era o nome do primeiro filme daquele cineasta, figura lembrada numa cena em Os guarda-chuvas do amor e voltando a ser protagonista no filme americano Model shop, que o cineasta realizou nos Estados Unidos.
O título é uma clara referência a um dos maiores filmes da história do cinema: Rocco e seus irmãos, que Luchino Visconti realizou em 1960. O filme intitulado Lola e seus irmãos, uma produção francesa realizada por Jean-Paul Rouve, é uma bela surpresa, numa época em que a comédia é tão maltratada pela incompetência, falta de imaginação e mediocridade de alguns realizadores que dela se aproximam e dela deveriam manter distância, se tivessem mesmo reduzidas porções de autocrítica. Não é o que se poderia chamar de filme de evasão, pois surge comprometido com a crítica endereçada a costumes e rituais regidos pelo culto da artificialidade. Nem todos, como o citado mestre italiano, possuem a necessária lucidez e a capacidade de sintetizar em um filme os sinais mais reveladores de uma época focalizando vidas reais e assim ressaltando a impossibilidade de isolar indivíduos do cenário amplo da realidade. Porém, ao demonstrar admiração por Visconti, Rouve também faz de seu filme um bom exemplo de que o riso não é adversário da contemplação lúcida e de um pensamento marcado pela agudeza da observação e a insolência da crítica. Chaplin deixou inúmeros exemplos e alguns cultores, mesmo que passageiros, de um gênero que então era chamado de alta comédia, como Minnelli, Hawks e Wyler, também deixaram registrados momentos que hoje fazem parte do que se poderia chamar de cinema de repertório, em referência ao teatro, no qual o diretor Rouve também trabalha. E, por sinal, há outra referência no título de seu filme, que também poderia ser uma homenagem a Jacques Démy, pois Lola era o nome do primeiro filme daquele cineasta, figura lembrada numa cena em Os guarda-chuvas do amor e voltando a ser protagonista no filme americano Model shop, que o cineasta realizou nos Estados Unidos.
Rouve, que também atua diante das câmeras - ele vive o papel do irmão mais velho - não realiza um filme de crítica social: está mais interessado nas distorções de valores que comandam o comportamento humano de uma época que não parece ter senso de ridículo. Esta irreverência do cineasta se faz presente na cena do casamento, quando as futilidades e o artificialismo comandam a encenação, algo contemplado com um sorriso irônico da protagonista, que é obrigada a suportar a companhia de um tipo tão parvo quanto inconveniente. Antes, na cena depois dos créditos iniciais, sonoramente emoldurados por aquele concerto para clarinete de Mozart que Godard utilizou em Acossado, para realçar a permanência da figura paterna nas lembranças do protagonista, um tema ampliado e ostensivamente presente no filme de Rouve, o que vemos é uma cena de destruição, comandada pelo irmão mais jovem, cena esta que revela a personalidade de um homem que não esquece fracassos anteriores e que, por isso, se manifesta quase sempre de forma agressiva diante das circunstâncias, algo que fica claro no discurso que é obrigado a fazer durante a cerimônia do casamento. O filme começa, portanto com uma referência musical a um mundo perfeito, logo em seguida destruído.
Méritos se espalham por todo o filme. Um deles é a precisão com a qual o diretor encerra cada sequência, não permitindo prolongações e repetições desnecessárias. Outro é a forma como prepara, durante quase toda a ação, o desfecho daquela luta particular do oftalmologista contra um aparelho preparado para escolher o tom de cor dos óculos para cada cliente. Esse tema é desenvolvido até um desfecho que coloca preferências pessoais no primeiro lugar. Outra surpresa é a cena em que o velho visitante do cemitério inteiramente se revela, falando de seu casamento. São momentos assim, presentes em grande maioria durante a narrativa, que enriquecem um filme que tem o objetivo de mostrar como a vida cotidiana está sempre à espera de um olhar inteligente para que seus sinais se tornem reveladores de complexidades nem sempre vistas ou estudadas. Esta é, sem dúvida, uma boa comédia, na qual não faltam observações valiosas, por vezes encobertas pelo humor. Entre elas uma referência a Céline, tema de um programa de televisão narrado em alemão, algo que segundo um dos irmãos "faz sentido", até por lembrar certo gênero de complexidade. E no epílogo surge o tema da reconstrução, do respeito pela natureza e da condenação a preconceitos e xenofobias.
 
Conteúdo Publicitário
Leia também
Comentários CORRIGIR TEXTO