Os recentes casos de contaminação por metanol no Brasil já impactam o comércio internacional. Cargas de bebidas alcoólicas brasileiras, como conhaques e espumantes, vêm sendo rechaçadas por importadores estrangeiros, temerosos de contaminações. Para o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais Federais Agropecuários (Anffa Sindical), embora não se trate de uma restrição oficial de países parceiros, a medida já afeta o mercado exportador e reforça a necessidade de fortalecer os mecanismos públicos de controle e fiscalização.
Para o presidente do sindicato, Janus Pablo Macedo, é importante destacar que as empresas legalmente constituídas e fiscalizadas pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) cumprem padrões de qualidade e rastreabilidade. Até o momento, não há denúncias nem suspeitas de que produtores legalizados estejam envolvidos nas ocorrências. As investigações apontam para fabricantes clandestinos, que atuam à margem da legislação e representam risco grave à saúde pública e à imagem do País.
Os casos de intoxicação registrados em diferentes estados brasileiros já resultaram em mortes confirmadas e dezenas de internações. Segundo as autoridades, a fraude consiste na adição de metanol, um álcool altamente tóxico, a bebidas destiladas, com o objetivo criminoso de reduzir custos de produção. Quando ingerido, o metanol é metabolizado no organismo em substâncias que causam lesões severas no sistema nervoso e podem levar à cegueira ou à morte.
“Casos como este mostram que a proteção da sociedade depende de um Estado forte e tecnicamente estruturado,” afirma o presidente do Anffa Sindical. Macedo ainda destaca que a atuação dos auditores fiscais federais agropecuários é essencial para prevenir fraudes, identificar riscos e garantir que apenas produtos seguros cheguem ao consumidor.
O Anffa Sindical ressalta ainda a importância da criação de um grupo de trabalho interinstitucional, que reunirá técnicos do Mapa e de outras autoridades federais, com o objetivo de aprimorar a rastreabilidade das bebidas e reforçar o combate à clandestinidade.
“É preciso investir continuamente em ações de inteligência e no fortalecimento da inspeção pública para que situações dessa gravidade não se repitam. Os profissionais que atuam no Programa de Vigilância em Defesa Agropecuária para Fronteiras Internacionais (Vigifronteira) atuam com inteligência e em parceria com autoridades policiais e também carecem de investimentos em recursos humanos e estrutura para um trabalho ainda mais eficaz”, destaca o presidente da entidade.
Segundo as autoridades de saúde, também é essencial alertar outras pessoas que possam ter consumido a mesma bebida, para que procurem avaliação médica o quanto antes. A demora no atendimento aumenta o risco de sequelas graves e óbito.
Rastreabilidade evita consumo de bebidas adulteradas
Os recentes casos de intoxicação por bebidas adulteradas com metanol no País, que resultaram em internações e mortes, expõem o problema recorrente de falsificação e adulteração de bebidas alcoólicas. Diante do cenário emergencial, o conceito da rastreabilidade na cadeia de suprimentos surge como uma solução de transparência e rápida identificação de cada elo da cadeia por onde passou um produto, desde o fabricante até o consumidor final.
A Associação Brasileira de Automação-GS1 Brasil é a responsável no País pelo padrão global de identificação de produtos reconhecido pelos sistemas de automação de mais de 150 países. É visível nas embalagens, que é o código de barras. Pode ser o código linear ou o QR Code padrão GS1. As marcas usam o código que reúne informações como lote, data de fabricação, certificados, dados do fabricante e outras, todas acessíveis ao consumidor por meio de leitura por telefone celular.
Setores como alimentos, bebidas e saúde já utilizam esses padrões no mundo todo, com resultados comprovados em segurança e confiança. No Brasil, ampliar essa prática é mais do que uma medida tecnológica, é uma questão de saúde pública. Vale reforçar a ideia de que é necessário um trabalho conjunto entre indústria, governo e sociedade.
Além do risco à saúde e perdas irreparáveis à população, a adulteração de bebidas e outros produtos traz enormes perdas econômicas — somente em 2024, estima-se que o País deixou de arrecadar R$ 28 bilhões em impostos por conta do mercado paralelo.
Os números revelam a dimensão do problema. Segundo a Associação Brasileira de Bebidas Destiladas (ABBD), 36% do volume de destilados comercializados no País é adulterado - seja por falsificação de rótulos, manipulação indevida ou ausência de controle sanitário. Além dos riscos diretos à saúde da população, essa prática alimenta a informalidade, mina a confiança do consumidor e cria concorrência desleal entre empresas sérias e aquelas que atuam à margem da lei.
A situação é agravada pela dificuldade de fiscalização em um mercado tão pulverizado e pela circulação de produtos sem identificação confiável. Nesses casos, o consumidor muitas vezes não tem como verificar a procedência da bebida que chega ao seu copo. É justamente nesse ponto que a rastreabilidade se torna uma ferramenta indispensável, oferecendo visibilidade sobre toda a cadeia de produção e distribuição.
A rastreabilidade é um divisor de águas que pode transformar o mercado, proteger consumidores e preservar a credibilidade de todo o setor.
Marcação em embalagens e rolhas combate a pirataria
No Brasil, o mercado de bebidas tem a falsificação como uma ameaça crescente. Para se ter uma dimensão desse problema, segundo estudo da Euromonitor International para a Associação Brasileira de Bebidas Destiladas (ABBD), o País deixou de arrecadar aproximadamente R$ 28 bilhões em impostos devido a bebidas falsificadas no último ano.
Somente os destilados falsificados correspondem a cerca de 28% do mercado nacional, incluindo bebidas como vodca, uísque, cachaça, tequila, rum, gin e conhaque. Já no segmento de fermentados, 9,7% do mercado é composto por produtos ilícitos, o que representa 81,5 milhões de litros, incluindo vinhos e espumantes.
Além da perda fiscal, produtos adulterados trazem, principalmente, riscos à saúde e à segurança dos consumidores, pois substâncias inadequadas são utilizadas na tentativa de replicar características originais.
"A falsificação atinge principalmente as bebidas de maior valor agregado. Na maioria das vezes, os falsificadores reproduzem seus rótulos de forma idêntica para confundir os consumidores, por serem os itens mais fáceis de burlar", explica Ramon Grasselli, gerente comercial da Soma Solution, fornecedora de equipamentos de codificação industrial, inspeção e automação.
Segundo ele, para combater a pirataria, fabricantes da cadeia de bebidas têm investido em tecnologias que reforçam a rastreabilidade e agregam diferenciais às embalagens. "Produtores têm adotado técnicas que vão além dos rótulos, tornando cada item único. No caso dos vinhos e espumantes, por exemplo, já é possível gravar nomes e códigos de rastreabilidade diretamente no vidro e até mesmo nas rolhas", explica.
Ramon explica que o setor já conta com soluções eficazes que permitem atender à indústria em grande escala.