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Reportagem especial

- Publicada em 18 de Setembro de 2022 às 15:00

Novas regras do teletrabalho mudam a rotina corporativa

Inclusão de estagiários e menores aprendizes no trabalho remoto é uma das novidades

Inclusão de estagiários e menores aprendizes no trabalho remoto é uma das novidades


gpointstudio/Freepik/divulgação/jc
O teletrabalho veio para ficar. Adotado como alternativa para manter empresas funcionando no auge da pandemia de Covid-19, em função do isolamento para conter a disseminação da doença, o trabalho remoto acabou se consolidando como alternativa interessante para colaboradores e empresas. O fato é que o home office nunca mais será o mesmo, e as empresas também não. A modalidade agora é regulamentada pela recém-publicada Lei nº 14.442/2022, que converteu-se na Lei MP nº 1.108/2022, trazendo algumas alterações, entre elas mudanças no vale-alimentação. O Empresas & Negócios ouviu especialistas na área para traçar o ponto a ponto e detalhar o que muda na prática.
O teletrabalho veio para ficar. Adotado como alternativa para manter empresas funcionando no auge da pandemia de Covid-19, em função do isolamento para conter a disseminação da doença, o trabalho remoto acabou se consolidando como alternativa interessante para colaboradores e empresas. O fato é que o home office nunca mais será o mesmo, e as empresas também não. A modalidade agora é regulamentada pela recém-publicada Lei nº 14.442/2022, que converteu-se na Lei MP nº 1.108/2022, trazendo algumas alterações, entre elas mudanças no vale-alimentação. O Empresas & Negócios ouviu especialistas na área para traçar o ponto a ponto e detalhar o que muda na prática.

O que deveria ser uma solução temporária durante a pandemia de Covid-19 acabou se tornando uma estratégia importante na gestão das empresas. Trata-se do trabalho remoto, que não só veio para ficar como também ganhou novos contornos. "Mesmo com a normalização da situação da saúde pública, o teletrabalho vem crescendo cada vez mais e tem sido determinante na busca por vagas pelos profissionais", constata Kerlen Costa, advogada Trabalhista Empresarial do escritório Scalzilli Althaus Advogados.
No entanto, a partir de agora o mundo corporativo - de todos os portes e segmentos - precisa ficar atento à recente Lei nº 14.442/2022, que converteu-se na Lei MP n.º 1.108/2022, trazendo alterações com relação ao home office. "Até agora, tínhamos apenas Medidas Provisórias e a CLT, com as normas desatualizadas de 2017. Precisávamos de algo que pudesse regularizar esse tipo de serviço por meio de novas regras, de modo a garantir direitos para todas as esferas", diz Kerlen, ao destacar a importância de contar com normas que ofereçam mais segurança jurídica para empregados e empregadores.
Dos principais temas em que se esperava obter esta seguridade, a especialista pondera que apenas o controle de jornada foi resolvido. "O custeio do trabalho remoto e as responsabilidades do empregador com ergonomia, por exemplo, continuaram a cargo da decisão dos juízes do Trabalho, que julgam cada um conforme seu entendimento pessoal", lamenta Kerlen.
Entre os pontos positivos. a advogada aponta o fim das discussões acerca dos conceitos de teletrabalho e de trabalho remoto para fins de aplicação das regras previstas na CLT, inclusive no que se refere ao controle de jornada. O regime híbrido de trabalho também ganhou suporte legal e não será descaracterizado na hipótese de prevalência de uma modalidade ou outra.
A lei ainda confirma uma tendência que era já analisada pelos tribunais, dispondo que apenas os empregados em teletrabalho que realizam serviço por produção ou tarefa estão desobrigados de marcar a jornada e receber horas extras. "Isso encerra uma discussão antiga sobre o ponto e traz segurança jurídica", reforça Kerlen, ao lembrar que permanece a possibilidade de se alternar entre regime presencial e de teletrabalho desde que haja mútuo acordo entre as partes, registrado em aditivo contratual. Se for determinação do empregador, deve ser garantido prazo de transição mínimo de 15 dias.
Contudo, para a advogada, a lei falha ao não tratar da fiscalização na residência do empregado e da responsabilidade do empregador caso o colaborador descuide de sua saúde, garantindo condições ergonômicas adequadas. "Também peca ao não tratar sobre o fornecimento de infraestrutura adequada à prestação de serviços, como acesso à internet, energia elétrica, telefone, entre outros, o que também era esperado", pontua. Para Kerlen, isso significa que a elaboração de políticas claras e a negociação das condições do teletrabalho em acordos ou convenções coletivas continuam sendo necessários.
Luiz Eduardo Amaral de Mendonça, sócio da área trabalhista do FAS Advogados, orienta que é preciso redobrar os cuidados com as mudanças, já que a nova lei passou a autorizar expressamente a adoção do regime de teletrabalho ou trabalho remoto aos estagiários e aprendizes.
"Isso encerra a discussão em torno da possibilidade ou não de se ensinar estagiários ou aprendizes a distância. Alguns diziam que, com isso, perderiam a essência do período de aprendizagem", diz o advogado. Neste caso, a adesão ao trabalho remoto é facultativa, podendo a empresa decidir se vai exigir que compareçam todos os dias, em dias alternados ou se poderão trabalhar sempre a distância. "Todos os demais direitos e obrigações anteriores permanecem mantidos", ressalta Mendonça.
 

Uso errado do vale-alimentação acarreta em multa

Rosana alerta para a necessidade de cumprir as normas e evitar penalidades

Rosana alerta para a necessidade de cumprir as normas e evitar penalidades


/FAS Advogados/Divulgação/jc
Os cartões refeição, utilizados em restaurantes, e alimentação - destinados a compras de gêneros alimentícios -, concedidos por muitas empresas aos colaboradores, têm novas regras.
A partir de agora, a Medida Provisória nº 1.108/2022 estabelece que os valores pagos a título de auxílio-alimentação deverão ser destinados exclusivamente ao pagamento de refeições em restaurantes e estabelecimentos similares, ou para aquisição de gêneros alimentícios em estabelecimentos comerciais.
"Antes da mudança, muitas pessoas utilizavam os benefícios para outros destinos, como em postos de combustíveis e livrarias. Agora é somente alimentação", destaca Kerlen Costa, advogada trabalhista empresarial do escritório Scalzilli Althaus Advogados.
"Quem descumprir as determinações estará sujeito a multas", alerta Rosana Yoshimi Tagusagawa, sócia da área Trabalhista do FAS Advogados. A especialista enfatiza que, no caso de execução inadequada ou o desvirtuamento das finalidades do auxílio-alimentação pelos empregadores ou pelas empresas carretará a aplicação de multa no valor de R$ 5 mil a R$ 50 mil.
Rosana lembra que a lei prevê também aplicação das multas em dobro em caso de reincidência. A especialista orienta que a multa se aplica também ao estabelecimento que comercializa produtos não relacionados à alimentação do trabalhador e à empresa que o credenciou.
Outro ponto destacado por Rosana diz respeito às vedações ao empregador na contratação de pessoa jurídica para fornecimento de auxílio-alimentação. A lei diz que o empregador não poderá exigir ou receber qualquer tipo de deságio ou imposição de descontos sobre o valor contratado; prazos de repasse ou pagamento que descaracterizem a natureza pré-paga dos valores a serem disponibilizados aos trabalhadores.
A empresa fica impedida ainda de exigir ou receber outras verbas e benefícios diretos ou indiretos de qualquer natureza não vinculados diretamente à promoção de saúde e segurança alimentar do trabalhador, no âmbito de contratos firmados com empresas emissoras de instrumentos de pagamento de auxílio-alimentação.
Porém, há uma exceção: a vedação não se aplica aos contratos de fornecimento de auxílio-alimentação vigentes à época da publicação da Medida Provisória, até seu encerramento ou até que tenha decorrido o prazo de 14 meses da publicação da Medida Provisória, o que ocorrer primeiro. Além disso, foi proibida a prorrogação de contrato de fornecimento de auxílio-alimentação em desconformidade às vedações acima.
Rosana atenta para o fato de que a Medida Provisória alterou também a Lei nº 6.321/1976, que previu, além da multa, as seguintes penalidades pela execução inadequada, o desvio ou o desvirtuamento das finalidades dos programas de alimentação do trabalhador: o cancelamento da inscrição da pessoa jurídica beneficiária ou do registro das empresas vinculadas aos programas de alimentação do trabalhador cadastradas no Ministério do Trabalho e Previdência, desde a data da primeira irregularidade passível de cancelamento, conforme estabelecido em ato específico; e a perda do incentivo fiscal da pessoa jurídica beneficiária, em consequência do cancelamento, hipótese em que nova inscrição ou registro junto ao Ministério do Trabalho e Previdência somente poderá ser pleiteado decorrido o prazo a ser definido em regulamento.


/reprodução/jc
 
 

Principais pontos das novas regras

Kerlen orienta universidades e instituições de estágio a ficarem atentas

Kerlen orienta universidades e instituições de estágio a ficarem atentas


/Scalzilli Althaus Advogados/Divulgação/jc
O que realmente muda na prática com as novas regras relativas ao teletrabalho e ao vale-alimentação? A convite do Empresas & Negócios, Kerlen Costa, advogada trabalhista empresarial do escritório Scalzilli Althaus Advogados, pontuou os principais temas. Empresária, proprietária do Café República e da Co.Re, Kerlen também é mentora de carreiras da Pontifícia Universidade Católica, líder do Grupo Mulheres do Brasil Núcleo Porto Alegree voluntária do Projeto Justiceiras.
1 - Embora não tenha atingido totalmente o objetivo esperado, a Lei 14.442/2022 trouxe algumas mudanças que devem ser objeto de atenção
  • Não é possível que o auxílio alimentação seja utilizado para outros fins. Essa norma é derivada da criação de vários cartões de benefícios criados por startups que acabavam desvirtuando o objetivo do auxílio. Assim, os valores deverão ser utilizados para o pagamento de refeições em restaurantes e estabelecimentos similares ou para a aquisição de gêneros alimentícios em estabelecimentos comerciais. Descumprir essa norma trará consequências para o empregador, para a empresa emissora dos cartões e para o estabelecimento que efetuou a venda, com multas que vão de R$ 5 mil a R$ 50 mil, bem como perdas de incentivos fiscais e até o cancelamento dos CNPJs.
  • O empregado submetido ao regime de teletrabalho poderá prestar serviços por jornada ou por produção ou tarefa e isso sempre existiu. Contudo, a lei determina que somente o trabalhador por produção ou tarefa poderá trabalhar sem controle de jornada. Ou seja, se o empregado possui agenda, precisa estar disponível em determinados horários, realiza reuniões e precisa dar respostas imediatas, é obrigatório que haja o registro e controle da jornada realizada.
  • O tempo de uso de celular, computador, softwares ou aplicativos que também são utilizados para o teletrabalho, fora da jornada do empregado não constitui tempo à disposição do empregador, exceto se houver previsão em acordo individual ou em norma coletiva de trabalho.
  • Se o trabalhador for admitido no Brasil, mas opta por trabalhar fora do país, a legislação a ser aplicada será a brasileira. Essa modalidade de trabalho deve obrigatoriamente constar no contrato de trabalho. Portanto, quem ainda não regularizou o trabalhador que está nesse regime desde a pandemia, deve fazê-lo com urgência.
  • Se o trabalhador optar por realizar o trabalho remoto fora da localidade em que foi firmado o contrato e precisar retornar ao trabalho presencial em algum momento, seja para o trabalho híbrido, para reuniões pontuais ou para o retorno definitivo, o empregador não terá obrigação no custeio desse deslocamento.
  • Sempre que a atividade realizada por empregados com deficiência ou que tenham filhos de até quatro anos sob sua guarda, puder ser realizada na modalidade de teletrabalho, esses trabalhadores terão prioridade nessas vagas.
  • As pausas e descansos são responsabilidade do empregador. Portanto, ele precisa garantir que sejam feitas pelo teletrabalhador, mesmo no caso dos aprendizes e estagiários.
  • A lei não faz distinção e precisa ser cumprida por toda e qualquer empresa. 
2 - A partir de agora, a modalidade de teletrabalho pode ser utilizada também para estagiários e aprendizes
  • O fato de estarem trabalhando fora das dependências da empresa, não desobriga as partes dos cuidados inerentes às leis aplicáveis ao estágio e aprendizagem para que essas modalidades tenham seus objetivos de formação cumpridos.
  • Vale destacar também que é obrigatório o controle de jornada, já que ambas as categorias possuem jornadas especiais definidas por lei.
  • Quanto aos estagiários, especificamente, lembro que o descumprimento de quaisquer das imposições especiais previstas na Lei dos Estágios ou das obrigações contidas no termo de compromisso do estagiário poderá caracterizar vínculo de emprego do estagiário com a parte concedente.
  • O que muda na rotina de estagiários e aprendizes é apenas a forma de registro de sua atividade e jornada, bem como os cuidados ergonômicos e controles, que passarão a ser realizados a distância. Ao estagiário e aprendiz se aplicam as disposições da política de teletrabalho adotada pela empresa, no que couberem. 
3 - É preciso atentar aos aspectos principais das medidas referentes ao vale-alimentação
  • O auxílio-alimentação deve ser destinado exclusivamente para o pagamento de alimentos. O empregado não poderá sacar o valor extra, caso não utilize o auxílio no prazo de 60 dias.
  • Outro ponto interessante é que as operadoras de benefícios, para obter a "conta" de determinada empresa, forneciam descontos a esse empregador, os quais eram cobrados depois dos restaurantes através de taxas de utilização. Essa prática foi agora completamente vedada.
  • Além disso, o trabalhador poderá optar por trocar de rede credenciada, caso a utilizada não esteja lhe atendendo, desde que a nova rede tenha compromisso com o cumprimento da lei.
  • O intuito é que o benefício cumpra sua finalidade, garantindo a alimentação sem haver desvios por nenhum dos envolvidos.
4 - Empresas e universidades que intermediam estágios devem ficar atentas
  • Os cuidados remetem à formalização das atividades, ao cuidado com a forma de prestação de serviço e que as opções de controle de cumprimento das regras estejam explícitas nos contratos. O estagiário, por exemplo, não é empregado da empresa, mas possui responsabilidades que precisam ser cumpridas.
  • O que a legislação deixa em aberto, como despesas e cuidados relativos à saúde precisa constar nos termos de compromisso e contratos de aprendizagem.
5 - Riscos de criar passivo trabalhista com o teletrabalho
  • Desde 2020, tudo é novidade nas relações de trabalho. Por mais que a legislação busque solucionar as dúvidas, a própria solução legal não é ainda uma certeza até que todos os pontos sejam analisados pelo judiciário.
  • Apenas para termos uma ideia, destaco que a Justiça trabalhista ainda está analisando a validade de artigos da CLT inseridos em 2017.
  • Portanto, naquilo que ainda não houve regulamentação por lei, demoraremos para ter um posicionamento judicial.
  • Assim, formalização das negociações é sempre extremamente necessária, em todos os casos e para todos os trabalhadores.
6 - Cuidados com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD)
  • O trabalhador que se encontra na sua residência em teletrabalho terá acesso a dados pessoais de clientes sem estar no ambiente seguro da rede local da empresa. Por vezes, o teletrabalho será realizado em ambientes públicos, como cafeterias e coworkings.
  • As normas relativas à LGPD merecem especial atenção nesse caso, com um mapeamento sobre quais dados são necessários para o desenvolvimento daquele trabalho e as normas para que sejam descartados de forma correta, sem desvios.
7 - Atenção à saúde laboral e aos custos para o trabalhador
  • A Justiça do Trabalho também vem entendendo que a mera subscrição, pelo trabalhador, de termo de responsabilidade em que se compromete a seguir as instruções fornecidas pelo empregador relacionadas a intervalos e ergonomia, não exime essa empresa de eventual responsabilidade por danos decorrentes dos riscos ambientais do teletrabalho.
  • Significa que a empresa precisa encontrar uma forma de garantir que essas regras estão sendo cumpridas. A própria Justiça do Trabalho sugere que isso seja feito através de visitas ao local de trabalho para fiscalização, sempre com a anuência e presença do empregado ou de alguém por ele indicado, em horário comercial e respeitando sua intimidade e privacidade.
  • O judiciário majoritariamente entende que os custos das ferramentas de trabalho deveriam correr por conta do empregador, em razão do princípio da alteridade. Assim, a empresa deve atentar para o tema e buscar uma forma de justificar sua decisão em uma política de teletrabalho própria.
  • Cada vez mais a formalização dos "combinados" deve ser priorizada para que cada parte consiga utilizar dos argumentos necessários para defesa da sua verdade, quando esta for confrontada.
8 - Trabalho híbrido também precisa de atenção
  • O regime híbrido de trabalho também ganhou suporte legal e não será descaracterizado na hipótese de prevalência de uma modalidade ou outra. Se o trabalhador em regime híbrido optar por residir em cidade diversa, é ele o responsável pelas despesas de deslocamento.
 

* Cristine Pires é jornalista formada pela Famecos/Pucrs, instituição em que também vez Mestrado em Comunicação. Atua como editora-assistente no Jornal do Comércio, responsável pelos cadernos Empresas & Negócios, JC Contabilidade e JC Logística. Já passou pelas redações do Correio do Povo e da revista A Granja.