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Entrevista especial

- Publicada em 06 de Março de 2022 às 19:08

Valdeci quer priorizar combate à fome e auxílio a agricultores

"Como a estiagem no RS é cíclica, estamos organizando discussões em várias regiões para uma política permanente"


/ANDRESSA PUFAL/JC
O presidente da Assembleia Legislativa, Valdeci Oliveira (PT), está concentrado em duas pautas que figuraram no seu discurso de posse, em 31 de janeiro: a organização de uma liga de combate à fome no Rio Grande do Sul e a busca por auxílio aos pequenos agricultores, afetados tanto pela pandemia de Covid-19 quanto pela estiagem.
O presidente da Assembleia Legislativa, Valdeci Oliveira (PT), está concentrado em duas pautas que figuraram no seu discurso de posse, em 31 de janeiro: a organização de uma liga de combate à fome no Rio Grande do Sul e a busca por auxílio aos pequenos agricultores, afetados tanto pela pandemia de Covid-19 quanto pela estiagem.
O movimento de combate a fome deve ser lançado no dia 7 de abril, no Dia Mundial da Saúde. "Durante o mês de março, vamos fazer reuniões preparatórias com aqueles que vão ajudar, participar, que vão ser doadores, digamos assim. Em um segundo momento, nos reuniremos com aqueles que serão recebedores dessas doações. Queremos fazer algo que, além de ser bem consolidado, seja duradouro."
Quanto à ajuda aos pequenos e médios agricultores, Valdeci tem articulado ações junto aos deputados estaduais e federais, em um esforço para pensar soluções e pressionar os governos federal e estadual a implementarem ações. "Precisamos de uma política permanente de Estado, que invista na perfuração de poços artesianos, cisternas (para captação de água da chuva), açudagem, com todos os cuidados ambientais necessários. Ao mesmo tempo, precisamos de uma política de proteção dos nossos mananciais, das nascentes de rios", defende.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, o presidente da Assembleia também manifestou preocupação com a adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF), pois, na sua avaliação, pode engessar o Estado, causar impacto nos serviços públicos e insuficiência de pessoal nos Poderes do Estado. Quanto às eleições de 2022, sustentou que a candidatura ao governo do Estado do deputado estadual Edegar Pretto (PT) está atrelada a do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que deve concorrer ao Planalto.
Jornal do Comércio - No seu discurso de posse, disse que pretende coordenar um esforço de combate à fome aqui no RS, junto com entidades da sociedade que já trabalham com isso. Como está a organização dessa medida?
Valdeci Oliveira - Nossa ideia é fazer, no dia 7 de abril, que é o Dia Mundial da Saúde - o combate à fome tem tudo a ver com saúde -, um grande encontro para o lançamento desse projeto, dessa política, dessa ideia. A Assembleia não vai arrecadar alimentos, queremos criar uma iniciativa forte, com grandes movimentos de solidariedade, para que haja uma grande possibilidade de buscar apoiadores. Queremos uma liga estadual de combate à fome, ou algo parecido. Não temos uma receita pronta, queremos construir isso com outros seguimentos (que já atuam no combate à fome). Durante o mês de março, vamos fazer reuniões preparatórias com aqueles que vão ajudar, participar, que vão ser doadores, digamos assim. Em um segundo momento, nos reuniremos com aqueles que serão recebedores dessas doações. Queremos fazer algo que, além de ser bem consolidado, seja duradouro.
JC - Outro ponto que o senhor manifestou preocupação foi com a situação dos pequenos agricultores. O que o senhor espera para esse setor?
Valdeci - Aqui na Assembleia, estamos fazendo o que é possível. Mas não temos a caneta na mão, nem o poder do orçamento, digamos assim. Mesmo assim, o Parlamento gaúcho já constituiu uma comissão de representação externa para acompanhar a questão da estiagem, do agravamento da seca. Na minha avaliação, tanto o governo federal quanto o governo estadual ainda não perceberam a gravidade disso. Isso vai ter reflexos a longo prazo. O empobrecimento do campo tem reflexo aqui na cidade, o preço da alimentação vai aumentar bastante. Isso é muito preocupante.
JC - Recentemente, uma comitiva de deputados estaduais viajou a Brasília, onde houve reuniões com o Ministério da Agricultura e a bancada federal gaúcha. O tema foi justamente a estiagem. Como foi essa agenda?
Valdeci - Tivemos uma grande delegação do Rio Grande do Sul, unificando todos os setores, independente da posição política. Em Brasília, mostramos a gravidade da situação dos pequenos e médios, mas também dos grandes produtores. Nesses últimos dias, tenho recebido retornos de Brasília, dizendo que estão analisando, que estão estudando... Numa boa, não há tempo para analisar, tem que tentar resolver imediatamente.
JC - Essa não é a primeira estiagem que atinge o RS. Por conta das mudanças climáticas, esse tipo de evento tende a se tornar mais frequente. Tem perspectiva de uma solução mais duradoura?
Valdeci - Como a estiagem no RS é cíclica, estamos organizando discussões em várias regiões do Estado para pensar em uma política permanente para isso. Ou seja, temos que estar preparados, temos que ter políticas preventivas. Não podemos lembrar disso só quando ocorrem perdas na produção. Precisamos de uma política permanente de Estado, que invista na perfuração de poços artesianos, cisternas (para captação de água da chuva), açudagem, com todos os cuidados ambientais necessários. Ao mesmo tempo, precisamos de uma política de proteção dos nossos mananciais, das nascentes de rios. Precisamos ter todo um cuidado com o meio ambiente, porque, quando a floresta é agredida, chegamos ao resultado que estamos sofrendo hoje. O governo do Estado já está definindo um comitê permanente de discussão sobre esse tema, como sugerimos. É isso que ele tem que fazer. Paralelamente, a Assembleia tem tido iniciativas, seja através da Mesa Diretora, dos deputados, das comissões, para debater e pressionar os governos federal e estadual. Mas essa discussão, na minha opinião, deve ser permanente.
JC - A adesão do Rio Grande do Sul ao RRF está encaminhada. Agora, o governo do Estado está formulando, junto com a Secretaria do Tesouro Nacional (STN), o Plano de Recuperação Fiscal, documento que vai elencar as medidas de ajuste fiscal que o Estado pretende adotar ao longo dos 10 anos de vigência do regime. O que pensa sobre isso?
Valdeci - Mesmo que alguns entendam que o RRF é a grande solução para o RS, estamos criando um problema: o engessamento do Estado, das entidades públicas. Isso cria grandes preocupações no futuro. Certamente, teremos dificuldade para executar (as medidas previstas no RRF). Mais do que isso, pelas regras do regime, o governo federal acaba tendo uma intervenção aqui no Estado (uma vez que a implementação do regime é fiscalizada por um conselho tripartite, com membros do Tribunal de Contas da União, governo federal e Palácio Piratini). Por isso, estamos preocupados.
JC - Quando o senhor menciona o engessamento do Estado, se refere às vedações impostas pelo RRF, como o congelamento dos salários, a proibição de concursos?
Valdeci - Sim. (O RRF) cria os mecanismos que preconizam a visão dessa lei, estabelece uma dificuldade enorme para (o governo) fazer as coisas acontecerem. Tudo emperra na legislação (do RRF). Sinceramente, não sei o que acontecerá no futuro próximo. Essa parece a grande dúvida que está na cabeça dos dirigentes de todos os Poderes. Teremos gargalos no pós-pandemia, com problemas sociais e de pobreza. Então, me parece que a adesão é inoportuna, inadequada em um momento de insegurança.
JC - Na formulação do Plano de Recuperação Fiscal, os Poderes e órgãos autônomos do Estado podem apontar ressalvas às vedações impostas pelo RRF. Por exemplo, apesar de restringir a realização de concursos públicos, os Poderes podem prever concursos pontuais, em determinadas áreas. A Assembleia pretende incluir algumas exceções?
Valdeci - É possível colocar algumas ressalvas dentro de um prazo. Essas ressalvas devem ser aprovadas pelo Executivo (que, por sua vez, deve conseguir a aprovação da STN). A Assembleia está fechando os últimos detalhes dessas ressalvas, para ver o que é possível fazer, para não deixarmos nenhum prejuízo lá na frente, durante os 10 anos de vigência do regime. Ao mesmo tempo, é muito difícil fazer uma projeção para toda uma década em uma economia muito insegura, com uma conjuntura bastante complexa. Podemos ter problemas sérios, não só no Legislativo. Todos os Poderes poderão ter um problema de insuficiência de pessoal. Então, para tentar evitar isso, estamos colocando algumas ressalvas, esperando que haja o ok do Executivo.
JC - O RRF resolve o problema da dívida?
Valdeci - Essa não é a solução. Estamos jogando para frente um problema. A questão da dívida, do jeito que foi negociada, vai engessar o Estado, ampliando as dificuldades, precarizando a prestação dos serviços públicos. E quem vai pagar com essas decisões é a população que mais precisa dos serviços de saúde, educação, segurança. Pretendemos realizar, aqui no RS, um grande debate sobre esse tema, mostrando algumas experiências com o RRF que já estão mais adiantadas, como é o caso do Rio de Janeiro. Vai ser uma oportunidade para avaliar bem a repercussão do RRF no futuro, a curto, médio e longo prazos. Na minha avaliação, o grande problema do Estado é a falta de uma política de investimento, de planejamento estratégico, de busca de investimento, de ampliar o potencial das áreas estratégicas, seja agrícola, climática, industrial.
JC - O governo Eduardo Leite (PSDB) implementou as emendas parlamentares aqui no Estado, através das quais cada deputado estadual pode destinar até R$ 1 milhão para obras da sua escolha. Alguns parlamentares discutem a possibilidade de tornar essas emendas impositivas, obrigando o Estado a executar as obras apontadas pelos deputados. O pensa sobre isso?
Valdeci - Não tem muito movimento na casa sobre isso. Acredito que, se as emendas forem bem encaminhadas, e o governo cumprir com aquilo que é designado (hoje é o Piratini que decide se vai executar as emendas ou não), isso contribui em áreas importantes. É uma experiência curta ainda. Faz dois anos que cada parlamentar tem a possibilidade de apresentar uma emenda de R$ 1 milhão, que é um valor absolutamente pequeno, perto do tamanho das reivindicações e das demandas do RS. Nesse último período (de pandemia), todas as emendas foram encaminhadas para a saúde.
JC - Não há força para aprovar emendas impositivas hoje?
Valdeci - Não sei se isso tem espaço aqui (na Assembleia). Essa questão de (os deputados) designarem R$ 1 milhão pelo convite (do governador) caiu bem. Todos os parlamentares acharam isso uma ideia bastante importante. Creio que ela (a concepção das emendas) vai prosseguir com o mesmo valor e as mesmas condições. Não tenho certeza de qual é a avaliação das emendas impositivas, porque é um assunto que não transitou até o momento pela casa.
JC - Com relação às eleições deste ano, o PT deve lançar candidato ao governo do Estado e ao Senado?
Valdeci - Temos o pré-candidato a governador, nosso companheiro Edegar Pretto. Tenho orgulho de estar junto do Edegar há muitos anos. Tive, inclusive, a oportunidade de ser deputado federal junto com o pai dele, Adão Pretto, que foi uma grande referência, uma liderança social extraordinária, todo mundo tinha um grande respeito pela caminhada dele. O Edegar segue esse caminho. Do ponto de vista das estratégias de aliança, a direção partidária tem trabalhado nisso. Estamos tentando ampliar o máximo possível essas negociações. Se vai ter federação, se não vai ter, ainda não sabemos. Creio que é possível ter no Senado um nome de um partido que esteja na base de sustentação no governo Lula (nome mais cotado para disputar a presidência pelo PT) e também do Edegar aqui no RS.
JC - Ao que tudo indica, aqui no RS, teremos dois candidatos de direita, o ministro Onyx Lorenzoni (que deve migrar para o PL) e o senador Luis Carlos Heinze (PP); e dois de centro-direita, o nome que será escolhido pelo MDB e o sucessor de Eduardo Leite. Como enxerga o cenário para a eleição estadual?
Valdeci - A eleição estadual não pode estar deslocada da eleição nacional. Temos a candidatura do (ex-)presidente Lula, que é uma candidatura robusta. O movimento estratégico, neste momento, é muito claro: a consolidação de uma frente que possa não só ganhar a eleição, mas também governar. Será uma eleição muito difícil. Além disso, a candidatura a governador do Edegar Pretto está absolutamente ligada à candidatura do Lula. Na hipótese de vitória do Lula no primeiro turno, isso fortalece imensamente a possibilidade de Edegar passar ao segundo turno e, por que não, ganhar o governo do RS.

Perfil

Antônio Valdeci Oliveira de Oliveira nasceu em 7 de setembro de 1957 em São José da Porteirinha, ex-distrito de Santa Maria, hoje município de Dilermando de Aguiar. Trabalhou com a família de pequenos agricultores e, quando mudou-se para Santa Maria, foi comerciário e metalúrgico. Iniciou a trajetória política nos movimentos sociais na década de 1980, quando foi presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Santa Maria e vice-presidente regional da Central Única dos Trabalhadores (CUT) da região Centro. Em 1986, se filiou ao PT. Em 1988, foi eleito vereador de Santa Maria. Reelegeu-se em 1992, com a maior votação da cidade até aquele momento. Em 1994, concorreu a deputado federal, ficando na primeira suplência. Em 1997, assumiu a vaga na Câmara dos Deputados. No pleito seguinte, se elegeu como titular. Em 2000, venceu a eleição para prefeito de Santa Maria e, em 2004, se tornou o primeiro prefeito reeleito da cidade. Em 2006, foi escolhido pelo diretório nacional do PT para coordenar a campanha à reeleição de Lula no RS. Em 2010, foi eleito deputado estadual, reelegendo-se em 2014 e 2018. Assumiu a presidência do Legislativo gaúcho em 31 de janeiro de 2022.