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Política

- Publicada em 12 de Maio de 2021 às 16:07

Yanomamis acusam pelotão do Exército de truculência

Documento acusa tenente de entrar em aldeias com homens armados sem autorização

Documento acusa tenente de entrar em aldeias com homens armados sem autorização


LEO RAMIREZ/AFP/JC
Em carta ao Exército e ao Ministério Público Federal, duas associações yanomamis exigem a saída do comandante do 5º Pelotão Especial de Fronteira (PEF), sob a acusação de agir de forma autoritária contra os indígenas. O Exército nega má conduta, mas afirma que investigará a denúncia.
Em carta ao Exército e ao Ministério Público Federal, duas associações yanomamis exigem a saída do comandante do 5º Pelotão Especial de Fronteira (PEF), sob a acusação de agir de forma autoritária contra os indígenas. O Exército nega má conduta, mas afirma que investigará a denúncia.
O documento, de 2 de maio, acusa o tenente Castilho de entrar em aldeias com homens armados sem autorização das lideranças, de submeter indígenas a revistas truculentas e de ameaçar atirar contra yanomamis. O PEF está localizado ao lado da comunidade Maturacá (AM), na Terra Indígena Yanomami.
"O ápice desta postura autoritária e truculenta aconteceu quando os nossos guerreiros yanomamis estavam retornando da caçaria trazendo as caças já defumadas e acomodadas, como manda nossa tradição cultural para a festa da banana. O mesmo deu um grito forte dando ordens para que a embarcação parasse, para os seus soldados abrirem os volumes que ali estavam e fosse feita a fiscalização."
"Porém, na nossa cultura tradicional, isso não é permitido. Aqueles embrulhos representam a essência do ritual fúnebre dos nossos entes queridos já falecidos. De forma alguma, pode ser aberto. Mas o tenente queria abrir e ameaçou dar tiros de fuzil no motor de popa se não fosse obedecido prontamente", afirma a carta, assinada pela Ayrca (Associação Yanomami do Rio Cauaburis e Afluentes) e pela Kumirayoma, uma associação de mulheres.
"Diante do citado, nós, líderes e o povo yanomami, não aceitamos esse desrespeito em nossa comunidade e não queremos a permanência deste militar que não executa as suas atribuições corretamente", conclui a carta enviada ao general Alexandre de Mendonça, comandante da 2ª Brigada de Infantaria de Selva, em São Gabriel da Cachoeira (AM).
Embora não conste no documento, o catalisador da denúncia foi a prisão, pelo PEF, de um jovem yanomami de 20 anos. Ele é apontado pelos militares como o autor de uma tentativa de estupro, ocorrida no dia 27 de abril contra a mulher de um soldado do PEF.
O yanomami foi preso pelo PEF e levado até a delegacia de São Gabriel da Cachoeira (AM), em 29 de abril. Permaneceu na cadeia até o dia 1º de maio, quando ganhou liberdade provisória por decisão judicial. Ele continua proibido de voltar para Maturacá.
As associações não negam o episódio violento, mas afirmam que o yanomami levado pelo PEF é inocente. Na carta, eles também exigem a retirada da vila Iranduba, onde aconteceu a tentativa de estupro, por ter sido construída fora do perímetro militar do pelotão. "Todos os militares devem ter suas residências na sua área demarcada (área militar)", diz a carta.
A afirmação de que o jovem é inocente tem o respaldo da Funai (Fundação Nacional do Índio). Em ofício ao juiz Atila Nunes, a coordenadoria regional do órgão afirma que ele foi preso "sem que o mesmo tivesse qualquer relação com a situação, já que a comunidade, enquanto lideranças e tuxauas [líderes comunitários] informaram que o mesmo é inocente".
"O indígena foi retirado de sua comunidade Maturacá, Terra Indígena Yanomami, onde vive e estava pescando e colhendo açaí ao lado de sua esposa. O mesmo relatou aos militares diversas vezes, bem como na delegacia para seus parentes, em língua yanomami, não ter qualquer relação com a acusação feita", diz o documento.
A Funai pede que o jovem seja autorizado a voltar para casa, já que não tem recursos para comida e hospedagem. Os yanomamis estão incluídos na política de proteção aos índios isolados e recém-contatados da Funai.
O episódio acontece no momento de crescente tensão na TI Yanomami por conta da presença maciça de garimpeiros. Além disso, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) cogita visitar Maturacá no final deste mês.
Em uma live há duas semanas, ele voltou a defender a legalização da mineração em terras indígenas, afirmou que quer visitar um garimpo ilegal de ouro e que gostaria de instalar postos da Caixa Econômica Federal nos PEFs para que os garimpeiros possam vender o mineral.
Exército Em resposta via assessoria de imprensa, o Comando Militar da Amazônia (CMA) afirmou que a denúncia "causa estranheza" e que o tenente Castilho exerce a função há 15 meses sem ter sido questionado pelos yanomamis. Por outro lado, a nota afirma que "todos os esforços estão sendo envidados para apurar rigorosamente o descrito no documento das associações indígenas".
Segundo o CMA, duas lideranças yanomamis visitaram o comando da Brigada, em São Gabriel, no dia 3 de maio e que, na ocasião, não mencionaram qualquer problema entre o PEF e Maturacá. "Muito pelo contrário, a visita espontânea do cacique foi uma oportunidade para reafirmar os laços de amizade e de confiança entre os yanomamis e o Exército, segundo as palavras do próprio líder tradicional. Causa estranheza saber que parece não ser a percepção de outras lideranças, em particular as das associações".
"É importante notar que o comandante do PEF citado no documento de origem está na mesma função há mais de 15 meses e que nunca antes disso foi apresentada qualquer reclamação sobre violação dos direitos e costumes tradicionais yanomamis na região", afirma o CMA.
"Muito diferentemente do citado, o comandante do 5º PEF foi convidado, ao longo desse período, para participar de diversos eventos socioculturais nas comunidades indígenas da Grande Maturacá", prossegue o texto.
Sobre as revistas, o CMA diz que as Forças Armadas têm obrigação legal para "proceder revistas e controle de pessoas e embarcações, com a finalidade de coibir crimes transnacionais e ambientais". Além de garimpo, a região de Maturacá tem se tornado uma rota importante de drogas vindas da Colômbia por meio da Venezuela.
Com relação à tentativa de estupro e à prisão, o CMA afirma que a vítima "permanecia dentro de casa nos afazeres domésticos enquanto o seu marido estava trabalhando na defesa da pátria e dos interesses nacionais, quando foi violentamente surpreendida por um agressor, armado de facão, que a coagiu à relação sexual não consentida (estupro), crime hediondo".
Segundo o CMA, a vítima gritou e conseguiu chamar a atenção da guarda do PEF, que conseguiu impedir o crime. O agressor fugiu.
Após o ocorrido, sempre de acordo com o CMA, o tenente Castilho localizou e prendeu o suposto agressor com a ajuda das lideranças locais. Ele também teria sido reconhecido pela vítima. No dia seguinte, foi levado até a delegacia de São Gabriel acompanhado por uma servidora da Funai.
"O Comando da 2ª Brigada de Infantaria de Selva realiza todas as suas atividades baseado nos princípios da legalidade e em respeito às tradições locais, haja vista ter grande efetivo de indígenas em seus quadros", diz a nota.
Folhapress
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