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Entrevista especial

- Publicada em 13 de Dezembro de 2020 às 21:06

Reforma tributária no Rio Grande do Sul pode sair em 2021, diz Maneco

Presidente da Famurs acredita que governo gaúcho deveria apresentar outra proposta

Presidente da Famurs acredita que governo gaúcho deveria apresentar outra proposta


MARCO QUINTANA/arquivo/JC
O presidente da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs) e prefeito de Taquari, Maneco Hassen (PT), acredita que o governo do Estado deveria apresentar em 2021 outra proposta de reforma tributária. Na avaliação de Maneco, a proposta apresentada neste ano estava "fadada ao fracasso", visto que foi encaminhada à Assembleia Legislativa na véspera das eleições municipais. "O certo, agora, seria (encaminhar a reforma) no ano que vem, em 2021, que não tem eleição", projeta.
O presidente da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs) e prefeito de Taquari, Maneco Hassen (PT), acredita que o governo do Estado deveria apresentar em 2021 outra proposta de reforma tributária. Na avaliação de Maneco, a proposta apresentada neste ano estava "fadada ao fracasso", visto que foi encaminhada à Assembleia Legislativa na véspera das eleições municipais. "O certo, agora, seria (encaminhar a reforma) no ano que vem, em 2021, que não tem eleição", projeta.
O presidente da Famurs defende uma reforma tributária "que simplifique os tributos, que torne o Estado mais competitivo, que permita que a gente concorra com os outros estados de igual pra igual." Algumas mudanças significativas no sistema tributário gaúcho poderiam remediar parte das dificuldades financeiras agravadas pela pandemia de coronavírus.
Na sua avaliação, o principal desafio dos prefeitos eleitos que assumirão em 2021 será a pandemia e a escassez de recursos. Por isso, defende a prorrogação por mais quatro anos da alta do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), proposto pelo Palácio Piratini. "(Sem a prorrogação das alíquotas majoradas) abriremos mão de R$ 2 bilhões de receita".
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Maneco explica a importância da assinatura do protocolo de intenções junto ao Instituto Butantan na semana passada. "Em janeiro, poderemos fazer a encomenda para receber as doses no mês de fevereiro". O presidente da Famurs acompanhou comitiva de prefeitos que visitou a sede do instituto, em São Paulo, na semana passada.
Jornal do Comércio - Considerando o cenário de 2020, em que tivemos a crise sanitária causada pela pandemia de coronavírus e uma crise econômica, quais serão os principais desafios dos prefeitos em 2021?
Maneco Hassen - O primeiro desafio será assumir a gestão no meio da pandemia, visto que a transição ocorre em tempo reduzido (somente durante o mês de dezembro). A prefeita ou o prefeito eleito não terá tempo de se acomodar na cadeira, já terá que entrar trabalhando - e muito. Além da pandemia, temos fatores que agravaram a situação. O Rio Grande do Sul passa por um período de estiagem, o que cria uma situação muito difícil, especialmente no Interior. Além disso, como consequência da pandemia e das últimas crises, os municípios terão menos receita no ano que vem. A diminuição da arrecadação com a queda econômica vai afetar diretamente os municípios. Então, os novos prefeitos e prefeitas vão assumir com menos receitas e com mais pessoas demandando serviços públicos. Infelizmente, temos mais pessoas desempregadas, passando necessidade, buscando a saúde pública, a assistência social... Ou seja, a balança entre despesas e receitas vai estar mais desequilibrada. Junto com isso, os municípios terão dificuldade na captação de recursos, porque, nos últimos anos, tem diminuído gradativamente as possibilidades de captação tanto no governo do Estado quanto no federal.
JC - Na semana passada, a Famurs divulgou pesquisa que aponta que 67,42% de 396 prefeitos entrevistados apoiam a prorrogação das alíquotas majoradas do ICMS, proposta pelo governo do Estado. Por isso, a Famurs apoia o projeto que prorroga o aumento do ICMS?
Maneco - Sim, a posição é de que devem ser prorrogadas as atuais alíquotas. Nesta crise, na minha opinião, não há outra alternativa. O Rio Grande do Sul não pode abrir mão de R$ 1,2 bilhão em receita; e os municípios R$ 800 milhões. Ou seja, (sem a prorrogação das alíquotas majoradas) abriríamos mão de R$ 2 bilhões de receita no meio desta crise e dificuldade que estamos passando. Não dá para abrir mão dessa receita. Para que a redução da alíquota gerasse uma elevação na arrecadação, teria que haver uma melhora econômica no Estado. Só que não há perspectiva de isso acontecer a médio e longo prazo.
JC - A prorrogação do ICMS seria uma solução imediata...
Maneco - O governador (Eduardo Leite, PSDB) sabia que, no dia 31 de dezembro de 2020, essas alíquotas voltariam ao patamar anterior. E teve dois anos de mandato para dialogar e preparar a reforma tributária que o Rio Grande do Sul merece: (uma reforma) que simplifique tributos, que torne o Estado mais competitivo, que permita que a gente concorra com os outros estados de igual pra igual. Infelizmente, o governador não fez isso e deixou para fazer na véspera das eleições municipais. Discutir reforma tributária em um ano de eleição é um projeto fadado ao fracasso.
JC - O projeto de reforma tributária deve ser enviado para a Assembleia novamente?
Maneco - Tinha pontos (no projeto enviado pelo governo do Estado) muito bons. A Famurs chegou a fazer um estudo detalhado sobre o projeto, apontando questões que deveriam ser modificadas. Mas era a favor da maioria das alterações. Só que, como disse, fazer o debate no período eleitoral não dá certo. O certo, agora, seria (encaminhar a reforma de novo) no ano que vem, em 2021, que não tem eleição. Dessa forma, o governo do Estado poderá liderar o processo para construir reformas minimamente consensuadas, especialmente a reforma tributária.
JC - O senhor mencionou antes a diminuição das fontes onde os municípios podem buscar recursos. Pode dar um exemplo?
Maneco - Hoje os municípios têm praticamente duas fontes de receita externa: as emendas parlamentares e os financiamentos em instituições financeiras, especialmente os bancos de fomento, como o BNDES e a Caixa Econômica Federal. Por isso, inclusive, disse que os novos gestores terão que entrar com muita responsabilidade, com gestões enxutas, eficientes, transparentes, com equipes técnicas qualificadas. Antigamente, tínhamos o programa Minha Casa, Minha Vida (que financiava a construção de habitações populares); hoje não temos mais. Tínhamos o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento, que financiava obras de infraestrutura); hoje não temos mais. Praticamente não existem mais esses programas mais universais, que abriam editais para os municípios cadastrarem seus projetos e liberavam recursos. Hoje, no governo federal, é recurso de fundo a fundo ou é emenda parlamentar.
JC - No caso das emendas, a Famurs alerta, há anos, para uma espécie de relação clientelista que pode surgir dessa dependência dos prefeitos em relação aos parlamentares...
Maneco - Não é uma espécie, é uma relação clientelista.
JC - Outro ponto que, como o senhor mencionou, vai ser um desafio para os prefeitos em 2021 é a gestão da pandemia. O senhor e outros prefeitos visitaram o Instituto Butantan, com quem firmaram protocolo de intenções para comprar a vacina, produzida em parceria com Sinovac...
Maneco - Realizamos uma visita de trabalho ao Instituto Butantan em São Paulo na quinta-feira (10), para acompanhar o início da produção da vacina. Agora, o Butantan passará a produzir 1 milhão de doses por dia. Nessa mesma visita, assinamos o protocolo de intenções que viabiliza aos municípios do Rio Grande do Sul a compra da vacina. É óbvio que a nossa expectativa é de que isso não seja necessário. Esperamos que o governo federal cumpra com sua tarefa, promovendo um plano de vacinação rápido e completo para todo o País, fornecendo a vacina ainda neste ano ou no início de janeiro de 2021, como outros países já estão fazendo. Mas, enquanto não conseguimos visualizar essa confiança no governo federal, abrimos essa oportunidade - esse plano b - junto ao Instituto Butantan.
JC - O que esse protocolo de intenções contempla?
Maneco - Viabiliza esse plano b. O protocolo estabelece que, no mês de janeiro, poderemos fazer a encomenda para receber as doses no mês de fevereiro. Tomara que, até lá, o governo federal tenha cumprido a sua tarefa. O objetivo é fazer a vacina chegar o mais rápido possível na nossa população, seja através do Instituto Butantan, do governo federal ou de outra farmacêutica. Nossa tarefa é pressionar de todas as formas para a vacina chegar o mais rápido possível.
JC - Em um primeiro momento, após a liberação da vacina em alguns países, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, disse que a autorização da Anvisa poderia levar até 60 dias no Brasil. Depois, comentou em uma entrevista, que, dependendo das circunstâncias, a vacinação poderia iniciar ainda em dezembro. Como avalia o posicionamento do Ministério da Saúde?
Maneco - Primeiro, é um absurdo que os prefeitos e governadores tenham que ir atrás da vacina, pela omissão do governo federal. A maioria dos países do mundo já está com sua vacinação preparada, alguns inclusive já começaram. Aqui no Brasil, temos algumas declarações esparsas (do ministro da Saúde), sem garantia, sem prazos, nenhuma segurança de que teremos uma vacinação rápida para a população. Isso faz com que os governadores e prefeitos não fiquem parados. Por isso, a Famurs e outros prefeitos assinaram o protocolo de intenções com o Instituto Butantan. Infelizmente, é necessário diante da omissão do governo federal.
JC - Com o aumento dos casos de Covid-19 no Estado, o Palácio Piratini suspendeu a cogestão do distanciamento controlado com os municípios. Foi acertada essa decisão?
Maneco - O governador dialogou com a gente sobre isso e foi uma decisão acertada. Se em outros momentos, foi uma decisão acertada a cogestão, nesse momento, foi acertada também a suspensão. Praticamente todo o Rio Grande do Sul está em bandeira vermelha. É necessário sinalizar uma regra única para todos os municípios. Essa foi uma das razões da suspensão da cogestão: permitir que o Estado determine as mesmas diretrizes do distanciamento controlado para todos. Precisamos ampliar o grau de conscientização das pessoas diante da gravidade desse momento. Infelizmente, os números continuam subindo, as internações também. A suspensão da cogestão veio em boa hora e é necessária. Inclusive, a maioria das associações regionais concordou com essa medida.
JC - Junto com a suspensão da cogestão, o governo do Estado publicou decreto recomendando a suspensão das festas públicas de final de ano, além de aconselhar as pessoas a evitarem aglomerações em reuniões particulares. O senhor, que tem contato com prefeitos, pode comentar como isso foi recebido?
Maneco - Todas essas medidas são muito ruins, não há dúvida. Todas as ações que restringem a liberdade das pessoas são ruins. Só que estamos em um momento excepcional. Portanto, são medidas necessárias. É claro que uma parcela da população não compreende nosso papel (de gestores públicos). Nossa função é procurar fazer com que elas compreendam a necessidade disso. O momento é de atacar aglomerações, principalmente as de final de semana e à noite. A maioria dos especialistas indica que o problema são as aglomerações, mais do que qualquer setor econômico, escolas etc. Então, o decreto foi importante nesse sentido (proibir aglomerações). É claro que estamos cansados, querendo que isso acabe o mais rápido possível. As últimas liberações (de atividades) nos finais de semana, a mobilização nas campanhas durante o período eleitoral e a possibilidade da vacina causaram em todos nós uma sensação de volta à normalidade. Só que os números nos provaram o contrário. Portanto, precisamos dar um passo atrás e reforçar medidas de prevenção, o que significa evitar aglomeração.
JC - As campanhas eleitorais contribuíram para propagar mais a Covid no Estado?
Maneco - Sem dúvida. É importante ressaltar que, no início do ano, quando surgiu o debate sobre o calendário eleitoral, a Famurs foi muito firme se colocando contra a realização de eleições em 2020. Inclusive, fomos taxados de oportunistas, porque supostamente quereríamos mais um ano de mandato sem eleição. Na verdade, queríamos justamente evitar o agravamento da pandemia, porque sabíamos - por fazer e conhecer as campanhas no Interior - que era impossível fazê-las sem visitas aos locais, sem bandeiraço, sem reuniões... Era impossível fazer campanha sem contato entre pessoas. E foi o que aconteceu e, obviamente, isso contribuiu para o aumento dos casos.

Perfil

Emanuel Hassen de Jesus, mais conhecido por Maneco, 40 anos, nasceu em uma família ativa na política em Taquari: seu pai era filiado ao PSD e, posteriormente, depois de a ditadura militar instituir o bipartidarismo, à Arena (Aliança Renovadora Nacional); sua mãe, por outro lado, foi uma das fundadoras do Partido dos Trabalhadores (PT). "Eu e meus irmãos acabamos puxando mais para o lado da minha mãe", menciona Hassen, ao explicar que se filiou ao PT assim que completou 16 anos. É a sua única filiação partidária. Ele se formou em Direito em 2004 pela Unisinos. Também é músico. Ele concorreu a um cargo público pela primeira em 2004, quando se candidatou a vereador de Taquari. "Embora tenha sido um dos mais votados, o PT não fez legenda na cidade", explica. Na eleição seguinte, concorreu ao cargo de prefeito, ficando em segundo lugar, com 2% a menos de votos do que o prefeito eleito. Em 2012, concorreu novamente à prefeitura e se elegeu prefeito de Taquari. Foi reeleito em 2016. Em julho de 2020, assumiu a presidência da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs).