Dois dias após o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello ter divulgado vídeo de reunião ministerial alvo de investigação, o presidente Jair Bolsonaro publicou na manhã deste domingo um trecho da lei de abuso de autoridade, no que foi entendido como uma provocação à corte.
A postagem em rede social traz a foto de um artigo da lei 13.869, de 2019. "Art. 28 Divulgar gravação ou trecho de gravação sem relação com a prova que se pretenda produzir, expondo a intimidade ou a vida privada ou ferindo a honra ou a imagem do investiga ou acusado: pena - detenção de 1 (um) a 4 (quatro) anos."
Divulgado nesta sexta-feira, o vídeo da reunião do dia 22 de abril mostrou grande preocupação de Bolsonaro em ser destituído, tendo o presidente revelado, ainda, contar com um sistema de informação particular, alheio aos órgãos oficiais, reforçando as indicações de interferência política na Polícia Federal (PF). O encontro, permeado por palavrões, ameaças de prisão, morte, rupturas institucionais, xingamentos e ataques a governadores e integrantes do STF foi tornado público em quase sua integralidade pelo ministro Celso de Mello.
A investigação que levou ao depoimento do ex-ministro Sergio Moro à PF e que provocou a análise e divulgação deste vídeo foi aberta a pedido do procurador-geral da República, Augusto Aras, e autorizada por Celso de Mello, relator do caso no STF.
O teor do vídeo e os depoimento em curso são decisivos para a PGR concluir se irá denunciar o presidente por corrupção passiva privilegiada, obstrução de Justiça e advocacia administrativa por tentar interferir na autonomia da Polícia Federal. Ministros de Estado, delegados e uma deputada federal já prestaram depoimento no inquérito que investiga a veracidade das acusações do ex-juiz da Lava Jato contra o chefe do Executivo.
O objetivo é descobrir se as acusações do ex-ministro da Justiça contra Bolsonaro são verdadeiras ou, então, se o ex-juiz da Lava Jato pode ter cometido crimes caso tenha mentido. Na visão de Aras, oito delitos podem ter sido cometidos. Após apuração da PF, a PGR avalia se haverá acusação contra Bolsonaro. Caso isso ocorra, esse pedido vai para a Câmara, que precisa autorizar sua continuidade, com voto de dois terços.
Na manhã deste domingo, logo após a postagem como resposta ao Supremo, o presidente deixou o Palácio da Alvorada de helicóptero, desembarcou no anexo da vice-presidência e seguiu à praça dos Três Poderes, em Brasília, onde houve uma manifestação em defesa do governo. Alguns participantes do ato carregavam cartazes contra o Congresso, o STF e a imprensa, que mencionavam uma "ditadura do Supremo" e pediam a saída do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
De helicóptero, Bolsonaro sobrevoou a Esplanada dos Ministérios e deu voltas ao redor da praça dos Três Poderes. Ao desembarcar no palácio, Bolsonaro estava de máscara, mas a retirou na caminhada, contrariando regras do Distrito Federal. A multa em caso de descumprimento é de R$ 2 mil. O presidente voltou a causar aglomeração na frente do Palácio do Planalto. Desta vez, não desceu a rampa do palácio, como em outros atos. Os manifestantes portavam faixas contra Congresso, Judiciário e imprensa.
Cercado de seguranças, o presidente estava acompanhado dos ministros Onyx Lorenzoni (Cidadania), Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) e os deputados federais Hélio Lopes (PSL-RJ), Carla Zambelli (PSL-SP) e Bia Kicis (PSL-DF). Bolsonaro evitou tocar os manifestantes, mas ficou a poucos centímetros das pessoas aglomeradas. Em dois momentos, sem máscara, carregou crianças no colo.