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Entrevista especial

- Publicada em 11 de Agosto de 2019 às 21:55

Planalto tem que articular MP da Liberdade Econômica, diz Goergen

Relator cobra mais articulação política para aprovar a medida nesta semana na Câmara

Relator cobra mais articulação política para aprovar a medida nesta semana na Câmara


LUIZA PRADO/JC
Para o relator da Medida Provisória (MP) da Liberdade Econômica na Câmara dos Deputados, Jerônimo Goergen (PP), o governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) tem que se envolver mais na articulação para garantir a aprovação do texto a tempo de continuar em vigor. Conforme Goergen, a matéria - cuja votação na Câmara deve acontecer nesta semana - tem que ser aprovada nas duas casas legislativas até 27 de agosto.
Para o relator da Medida Provisória (MP) da Liberdade Econômica na Câmara dos Deputados, Jerônimo Goergen (PP), o governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) tem que se envolver mais na articulação para garantir a aprovação do texto a tempo de continuar em vigor. Conforme Goergen, a matéria - cuja votação na Câmara deve acontecer nesta semana - tem que ser aprovada nas duas casas legislativas até 27 de agosto.
Na opinião do deputado, o governo não atuou como deveria na articulação da reforma da Previdência, o que teria culminado no enfraquecimento da proposta, levando, por exemplo, à retirada de estados e municípios do texto e à manutenção de regras diferenciadas para algumas categorias. "O Planalto falhou, porque entrou em campo no final do processo. O presidente não se envolveu na condução das negociações. O resultado foi a diminuição do impacto da reforma."
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Goergen também se mostra cético quanto à inclusão de estados e municípios na reforma da Previdência através de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) apresentada no Senado. Ao avaliar os primeiros sete meses do governo Eduardo Leite (PSDB), defende uma mobilização para questionar o valor da dívida do Estado com a União antes de assinar o ingresso no Regime de Recuperação Fiscal (RRF).
Jornal do Comércio - Qual sua avaliação sobre os primeiros sete meses do governo Bolsonaro?
Jerônimo Goergen - O presidente Bolsonaro criou um clima muito positivo no Brasil, que nos deu condições para enfrentar alguns assuntos que não tínhamos coragem de enfrentar. Mesmo sem montar uma estratégia, o jeito dele dá coragem aos políticos de direita defenderem seu pensamento. O tema da liberdade econômica é um exemplo. Por outro lado, ele criou também um ambiente de grande acirramento político. Afinal, ele é o gerente da nação e atua com posições como se fosse um parlamentar, como sempre foi. E quem fala muito, às vezes, fala coisas que não devia, gerando atritos e até confusões.
JC - O senhor acredita que as polêmicas prejudicam o governo?
Goergen - Vejo o atrito político gerado por ele como um grande ponto negativo. A oposição vem de um governo ruim, com corrupção e desemprego. O presidente só precisaria deixar as coisas andarem. Por exemplo, a MP da Liberdade Econômica deveria ser uma bandeira maior do governo, em vez de gastar energia discutindo a ida ou não do filho (Eduardo Bolsonaro) para a embaixada nos Estados Unidos.
JC - O texto da MP da Liberdade Econômica tem sido criticado pelo Ministério Público do Trabalho por fazer alterações na legislação trabalhista. Como vê isso?
Goergen - Teve um grupo que chamou a MP de "minirreforma trabalhista". No entanto, não é uma minirreforma, porque não estamos mexendo na CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas). Estamos adequando-a à realidade, trazendo para a norma aquilo que já são decisões judiciais. Isso dá segurança jurídica. De qualquer forma, quando o texto é chamado de minirreforma trabalhista, também recebo mais apoio, porque existe uma parte da sociedade que entende que a relação de trabalho deve ser mais direta entre quem contrata e quem é contratado. Ou seja, uma ala da sociedade defende que o contratante e o contratado façam o acerto que quiserem. Mas, de uma forma ou de outra, a MP não pode mexer na lei. Ela só traz para dentro de uma nova lei aquilo que já foi julgado.
JC - Alguns juristas avaliam que a MP se sobrepõe a algumas normas que já existem...
Goergen - Essa crítica tem sido feita desde a MP original, do governo federal. Inclusive, o PDT ingressou com uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade), argumentando que não há necessidade da urgência para esse tema. A linha do governo, e a minha também, é que a urgência está no desemprego do País, são 13 milhões de pessoas. O Ministério da Economia realizou um estudo, demonstrando que a MP pode criar um ambiente de trabalho capaz de fomentar 3,7 milhões de empregos em uma década. O próprio PDT, que entrou com a ADI, votou favorável ao texto da MP na comissão (que analisou o tema, no Congresso Nacional). Tem inclusive emendas do PDT acolhidas.
JC - A MP tem que ser aprovada na Câmara e no Senado. Qual a expectativa quanto à tramitação?
Goergen - Certamente, teremos destaques no plenário. O que me preocupa é o tempo curto para aprovar a medida, até 27 de agosto. Com a votação da reforma da Previdência em segundo turno, votaremos a MP na Câmara nesta segunda semana de agosto. E, na próxima, votaremos no Senado. Tenho informação que o (presidente do Senado, Davi) Alcolumbre (DEM-AP) não teria problema em colocar em votação em um curto espaço de tempo. Estamos apostando nesse cronograma. De qualquer forma, não é mais um trabalho só meu. O governo federal tem que se articular para isso, porque, agora, envolve líder de governo, a Casa Civil, o presidente da Câmara, o presidente do Senado... O meu papel era relatar e entregar o relatório aprovado.
JC - Quanto à reforma da Previdência, os estados e municípios não entraram no texto aprovado na Câmara. Existe a possibilidade de serem incluídos no Senado?
Goergen - Essa reforma (sem a inclusão dos estados e municípios) é melhor do que nada. Mas não é a reforma adequada. A esfera federal e a privada vão ter uma regra, enquanto as esferas estadual e municipal terão outras que mantêm distorções. No ano que vem, haverá eleições municipais. Não imagino os municípios fazendo reformas previdenciárias em ano eleitoral. Com isso, a eventual economia gerada pela reforma na União vai desaparecer pelas demandas que os estados e municípios vão gerar a Brasília. Daqui a cinco ou seis anos - o próprio presidente da República admitiu isso - vamos ter que discutir de novo a Previdência.
JC - Não crê que o Senado consiga incluir os estados e municípios na reforma?
Goergen - O Senado faz um gesto, ao apresentar uma PEC, a chamada PEC Paralela, para incluir estados e municípios na reforma. Mas, para isso, tem que criar uma comissão especial para analisar o texto, aí avançaria no Senado e, depois, voltaria para a Câmara. Lá, não sei quando seria votado. Então a aprovação da PEC Paralela pode até acontecer, mas não antes do meio do ano que vem. E, até que se aprove a PEC Paralela, perderemos dois, três, quatro anos.
JC - A reforma da Previdência foi uma vitória do governo Bolsonaro ou da articulação do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ)?
Goergen - O Planalto não fez a articulação que deveria para caracterizar uma vitória do governo. Aliás, em grande medida, é por isso que a reforma não vai sair do tamanho que deveria. Se o governo federal tivesse feito uma articulação mais competente, mais convicta, teria sido aprovada uma reforma melhor. Mas o Planalto falhou nesse tema, porque entrou em campo no final do processo. O presidente não se envolveu na condução das negociações. O resultado foi a diminuição do impacto da reforma. Felizmente, a Câmara tinha convicção de fazer (a reforma). E de onde veio essa convicção? Da própria sociedade, que, mesmo sabendo que poderia pagar um preço, nos deu segurança para votar a favor.
JC - A articulação do presidente da Câmara pesou mais que a do Planalto?
Goergen - Rodrigo (Maia) tem o mérito de ter vestido a camiseta. Só que, no final, como a negociação foi conduzida pela Câmara, ele teve que ceder para conseguir a aprovação. O curioso é que o partido do presidente da República, o PSL, foi o que mais buscou regras diferentes para várias categorias. Isso, por si só, demonstra como o Planalto não atuou da forma como deveria. E, claro, houve uma relação de fisiologismo. Aos 44 minutos do segundo tempo, o governo liberou recursos de emendas parlamentares (para os deputados aprovarem a reforma). Acho errado. Mas se o governo ia fazer isso, deveria ter feito no primeiro minuto (da articulação). Além disso, quando o governo se envolveu mais, adotou um discurso errado. Em determinado momento, o governo colocou a reforma da Previdência exclusivamente como a solução para o Brasil. "Ou faz a reforma, ou vamos morrer." A economia se retraiu. Mesmo quem tinha condições de comprar um carro, um apartamento, qualquer coisa, resolveu esperar para ver o que ia acontecer. O governo deveria ter adotado um discurso que explicasse a necessidade de um conjunto de ações para a retomada da economia: o Brasil precisa da reforma da Previdência, mas também da tributária, da MP da Liberdade Econômica etc.
JC - A reforma tributária será a próxima grande pauta no Congresso. A articulação dela vai ser tão difícil quanto a da Previdência?
Goergen - Vai ser muito sofrida, porque os estados vão atuar. É uma reforma que impacta nas contas públicas, o que pode ser um risco para governos estaduais como o do Rio Grande do Sul, que está com os salários atrasados etc. Mas o mais importante é que ela está sendo pautada. E, mais uma vez, pelo Legislativo. Só que o Planalto precisa apresentar sua proposta. O não envio de um projeto pelo Planalto significa, novamente, uma não convicção do governo em fazer a reforma. Além disso, temos que ter uma coisa clara: realizar uma reforma tributária sem acabar com a guerra fiscal e mexer com ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) é a mesma coisa que fazer a reforma da Previdência sem incluir estados e municípios.
JC - Qual sua avaliação sobre o governo Eduardo Leite?
Goergen - Ele está fazendo o que dá, dentro de um cenário complexo. Não tem muita margem para inventar. Vamos aderir ao plano de recuperação. Acho que, agora, é a saída. Mas critico esse tipo de negociação desde o governo (José Ivo) Sartori (MDB, 2015-2018). Fui o único deputado da base de Sartori que votou contra (a aprovação da lei que instituiu o RRF). Fui muito criticado por isso. Mas entendia que esse não é o formato de negociação que deveríamos fazer. O RRF foi criado para o Rio de Janeiro. Foi o Rodrigo Maia que, na época, pilotou isso. Na época, tentei uma auditoria no contrato da dívida do Rio Grande do Sul com a União, junto ao TCU (Tribunal de Contas da União). Como não consegui apoio para levar adiante, acabou arquivada no tribunal. Logo em seguida, o governo (Sartori) entrou com uma ação no STF (Supremo Tribunal Federal), que suspendeu o pagamento das parcelas da dívida até hoje.
JC - Qual deve ser o cerne da discussão sobre a dívida do Rio Grande do Sul com a União?
Goergen - O ideal seria discutirmos o valor da dívida. Afinal, é uma dívida que foi contraída no valor de R$ 9 bilhões, durante o governo (Antonio) Britto (MDB, 1995-1998); já pagamos quase R$ 30 bilhões e ainda devemos R$ 60 bilhões. No entanto, o governo optou pelo plano de recuperação fiscal.
JC - Por que avalia que é ruim para o Estado?
Goergen - O que me preocupa é que, ao assinar o RRF, vamos nos livrar de pagar a dívida por um período (três anos, prorrogável por mais três), mas vamos reconhecer uma dívida que precisa ser recalculada. A adesão ao RRF significa reconhecer uma dívida da qual já pagamos boa parte ou quase toda. Mas reconheço: agora que optaram por esse caminho, não tem muito o que fazer. Mesmo assim, acredito que, antes de assinar o plano, deveríamos ter uma ação política mais forte junto ao governo federal, na tentativa de rever o contrato. O debate em torno da reforma da Previdência e da reforma tributária é uma boa oportunidade para a bancada gaúcha se colocar: "vamos com o Planalto por aqui (nessas pautas), mas queremos negociar aquilo lá (a dívida)". Sartori não fez nenhuma movimentação desse tipo, Eduardo (Leite) também não.
JC - Como avalia a privatização de CEEE, Sulgás e CRM?
Goergen - Quanto mais Estado se tiver, mais corrupção e ineficiência teremos. Não cuidamos do serviço público ao longo do tempo no Brasil. E a estrutura acabou inchando. Então tem que vender. Mas estamos vendendo para cobrir rombos, para aderir ao plano de recuperação. É importante que o governo não destine tudo o que arrecadar (com a venda das estatais) para o custeio (da máquina pública). Pagar salário é uma prioridade, sim. Mas o ideal é que também possa terminar os asfaltos nos 57 municípios que ainda não têm, pagar os (passivos dos) hospitais, colocar o IPE (Instituto de Previdência do Estado) em dia.

Perfil

Jerônimo Pizollotto Goergen nasceu no município de Palmeira das Missões, em 20 de janeiro de 1976, mas cresceu na cidade de Santo Augusto. Formado em Direito pela Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) e pós-graduado em Direito Empresarial pela Pontifícia Universidade do Rio Grande do Sul (Pucrs), Goergen se aproximou dos temas ligados ao primeiro setor entre 2001 e 2002, quando foi assessor do então ministro de Agricultura e Abastecimento, Marcus Vinícius Pratini de Moraes, em Brasília. Militou na juventude do PP gaúcho, da qual foi presidente entre 2007 e 2009. Elegeu-se por dois mandatos para a Assembleia Legislativa: o primeiro, em 2002; e o segundo, em 2006. Em 2010, foi eleito deputado federal pela primeira vez. Reelegeu-
-se em 2014 e em 2018. Na atual legislatura na Câmara dos Deputados, participou da comissão especial que analisou o texto da reforma da Previdência e da que tratou da Medida Provisória (MP) da Liberdade Econômica, da qual foi relator e tem sido o principal articulador no Parlamento.