Por unanimidade, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) manteve suspensa a Medida Provisória (MP) nº 886, do presidente Jair Bolsonaro (PSL), que visa transferir da Fundação Nacional do Índio (Funai) para o Ministério da Agricultura a responsabilidade de demarcar terras indígenas. Bolsonaro editou uma segunda MP depois que o Congresso Nacional rejeitou uma primeira que também havia tentado fazer essa mudança na estrutura da administração pública.
A MP 886 já havia sido suspensa em junho pelo ministro do STF Luís Roberto Barroso, atendendo a pedido dos partidos Rede Sustentabilidade, PDT e PT. Nesta quinta-feira (1), o plenário referendou a decisão liminar de Barroso por 10 votos a 0. Somente o ministro Alexandre de Moraes não votou porque não estava presente na sessão.
Relator das ações sobre o tema, Barroso voltou a afirmar que a Constituição impede que o presidente reedite, na mesma legislatura, uma MP que tenha sido rejeitada ou que tenha caducado sem ser apreciada a tempo pelo Congresso.
Barroso disse, em seu voto, que a última palavra sobre o que deve ser lei deve ser dada pelo Parlamento. O voto mais enfático foi o do decano do Supremo, o ministro Celso de Mello, que viu, na reedição da MP, a despeito da vedação constitucional, um resquício de autoritarismo. "O comportamento do atual presidente da República, revelado na reedição de medida provisória clara e expressamente rejeitada pelo Congresso Nacional, traduz uma clara, inaceitável transgressão à autoridade suprema da Constituição Federal e representa inadmissível e perigosa transgressão ao princípio fundamental da separação de Poderes", afirmou.
"Uma visão do processo político institucional que se recuse a compreender a supremacia da Constituição e que hesite em submeter-se à autoridade normativa dos seus preceitos (...) é censurável", completou o decano. "É preocupante essa compreensão, pois torna evidente que parece ainda haver, na intimidade do poder hoje, um resíduo de indisfarçável autoritarismo, despojado sob tal aspecto, quando transgride a autoridade da Constituição, de qualquer coeficiente de legitimidade ético-jurídica."
Logo após a edição da MP, no fim de junho, Bolsonaro disse que assumia o bônus e o ônus sobre o processo de demarcação de terras indígenas no País. "Quem demarca terra indígena sou eu. Quem manda sou eu. Sou um presidente que assume ônus e bônus", afirmou.
O presidente tem dito que não vai liberar a demarcação de novas terras e que planeja legalizar a extração de minério em áreas indígenas. "É intenção minha regulamentar garimpo, legalizar o garimpo. Inclusive para índio, que tem que ter o direito de explorar o garimpo na sua propriedade.
Na visão de Bolsonaro, as demarcações indígenas estão "inviabilizando o negócio" no Brasil. "O Brasil vive de commodities, daqui a pouco o homem do campo vai perder a paciência e vai cuidar da vida dele. Vai vender a terra, aplicar aqui ou lá fora, e cuidar da vida dele. A gente vai viver do quê?"