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Entrevista Especial

- Publicada em 10 de Março de 2019 às 21:53

Antunes articula para aprovar PEC das estatais de energia

'Contra números há muito pouca margem de discussão', disse Antunes sobre as vendas de CEEE, Sulgás e CRM

'Contra números há muito pouca margem de discussão', disse Antunes sobre as vendas de CEEE, Sulgás e CRM


CLAITON DORNELLES /JC
Pela Assembleia Legislativa passam decisões que impactarão a atuação de Eduardo Leite (PSDB) por todo seu mandato. E está a cargo do deputado Frederico Antunes (PP) conduzir os debates na Casa de acordo com o interesse do governo. Deputado estadual no sexto mandato, Antunes é o líder do governo e afirma que tratará cada projeto "como uma missão" - mesmo a base já tendo conquistado apoio suficiente para formar maioria qualificada, com 33 deputados, número necessário para aprovar Propostas de Emendas à Constituição (PEC).
Pela Assembleia Legislativa passam decisões que impactarão a atuação de Eduardo Leite (PSDB) por todo seu mandato. E está a cargo do deputado Frederico Antunes (PP) conduzir os debates na Casa de acordo com o interesse do governo. Deputado estadual no sexto mandato, Antunes é o líder do governo e afirma que tratará cada projeto "como uma missão" - mesmo a base já tendo conquistado apoio suficiente para formar maioria qualificada, com 33 deputados, número necessário para aprovar Propostas de Emendas à Constituição (PEC).
Aliás, a aprovação de uma PEC é o próximo desafio do governo. Como anunciou na campanha, apresentou a proposta de retirar da Constituição a obrigação de realizar plebiscito para autorizar a venda ou federalização das três empresas do setor de energia: as companhias Estadual de Energia Elétrica (CEEE), Riograndense de Mineração (CRM) e de Gás do Rio Grande do Sul (Sulgás). Essa é uma das exigências para o Estado aderir ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) e renegociar a dívida que tem com a União.
Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, o líder do governo Leite justifica ainda que "um Estado que está com um nível de endividamento e com o déficit do orçamento vigente como o nosso não pode se dar ao luxo de esperar mais tempo" e reitera que o Banrisul não faz parte de negociação.
Jornal do Comércio - A sua atuação como líder do governo encontra como diferencial o número de bancadas - 17, nunca antes houve tantas. Por outro lado, o governo já formou maioria, com 33 deputados na base. Isso dá tranquilidade?
Frederico Antunes - Converso permanentemente com o secretário da Casa Civil, Otomar Vivian (PP), que é a minha ligação com o governo. Vamos tratar cada projeto como uma missão, que os cidadãos gaúchos escolheram para que o governador resolvesse. Não existe jogo ganho, não aceito imaginar que já tenho a maioria para qualquer tipo de projeto. Imagino que temos sim, para algumas matérias, o reconhecimento de uma maioria. Mas só vou ter certeza absoluta quando os votos forem externados no painel. Não posso adiantar que para determinada matéria já se tenha número suficiente, mesmo que em matéria semelhante, recentemente, tenhamos tido expressiva maioria. Principalmente porque estamos em nova legislatura. Há uma tendência desses novos deputados a convergirem com as prioridades que o governador está tratando. Precisamos agora que seja executada essa maioria.
JC - O tema que provavelmente vai render mais debate é a PEC para retirar a obrigatoriedade do plebiscito para a venda das estatais. O governo vê ambiente para aprová-la?
Antunes - O Estado hoje consegue, mais que a fala do governador ou de qualquer governante ou defensor de mudanças, ter certeza dessas necessidades quando analisamos os números reais. E contra números há muito pouca margem de discussão. Um Estado que está com um nível de endividamento e com o déficit do orçamento vigente como o nosso não pode se dar ao luxo de esperar mais tempo. Não posso ter constrangimento em responder porque os valores que deveriam ser repassados aos hospitais não estão sendo repassados, porque o salário de alguns profissionais, importantes nas suas atividades, são pagos diferentemente dos salários do Legislativo, do Judiciário ou de outros órgãos de apoio do governo. Não posso mais me constranger em dizer porque não existem profissionais da área de segurança no número e com treinamento capaz de atender aquilo que a Constituição determina como dever do Estado. O governador não pode ter esse constrangimento. É preciso agir. As companhias ou já tiveram papel importante, ou continuam sendo órgãos importantes, mas não para terem o controle do Estado.
JC - Por exemplo...
Antunes - O caso da CEEE, que ajudou a colocar luz no campo. Hoje temos produção primária pujante por causa da CEEE. Não estamos esquecendo esse passado. Mas, de uns tempos para cá, a companhia começou a ter problemas nas suas finanças. Consequentemente, passa isso, de alguma forma, para o seu acionista majoritário, quando, por exemplo, não paga os seus tributos. Uma das coisas que a gente ouve é que uma das formas de realinhar as finanças do Rio Grande do Sul, e isso é quase um jargão, é acabar com a sonegação, impedir que alguém deixe de pagar os tributos para o Estado. E o Estado que quer acabar com a sonegação para evitar uma evasão fiscal tem uma companhia, no seu comando acionário, que faz o que ele diz que não pode acontecer. Porque o Estado, que deve mais de R$ 100 bilhões (projetado pelo governo em passivos de longo prazo, que compreendem dívidas com precatórios, com a União, depósitos judiciais e financiamentos), que é três vezes a Receita Corrente Líquida (RCL) em comprometimento, mantém uma companhia com essas dificuldades? Não pode mais ter tempo para discutir o que é imprescindível ou o que não é. Tem que tomar uma decisão, baseado nos relatórios, nos números e nas decisões dos cidadãos no "plebiscito mor", a maior das consultas que tem, que é a eleição, em que os candidatos passam 60 dias falando com os cidadãos, respondendo perguntas em debates sobre vários temas, inclusive esse: "o que fará com essa matéria se for eleito?". O governador foi eleito com a responsabilidade de dar celeridade à entrega de ativos que não estão servindo como deveriam.
JC - E tem a ver com o ingresso no RRF.
Antunes - Ele também tem que apresentar isso como um dos requisitos para demonstrar que o dever de casa está sendo executado e merecer, por parte de quem controla o caixa maior, que é a União, a permissão para a adesão de um plano de recuperação, que não é o melhor dos mundos, mas é o melhor que tem para o Estado acessar. Não sou casuísta, mas procuro fazer, quando necessário, a revisão de uma posição minha com a maior humildade possível, mas com uma boa altivez. Não dá mais para se ter o luxo de continuar do jeito que está. Votei a favor (pela necessidade de plebiscito para venda ou federalização das estatais), mas uma coisa era há 20 anos, outra é hoje. Na legislatura passada, quando defendi fazer o plebiscito, vendo que não íamos conseguir fazer a mudança da Constituição, teve muita gente que hoje fala da necessidade do plebiscito que foi contrária.
JC - O governador argumentou que é um debate muito complexo para a população fazer. O senhor concorda?
Antunes - A população já se manifestou sobre isso. Inclusive 100% de quem se manifestou no segundo turno eleitoral admitiu isso: os que votaram no Leite e os que votaram no (ex-governador José Ivo) Sartori (MDB). Admitiram que não temos outro caminho que não seja seguir o plano de recuperação fiscal e, para isso, precisamos dar celeridade ao processo da etapa que está colocada hoje. Na próxima etapa, os projetos de privatização ou federalização virão para a Assembleia e serão aprovados ou não.
JC - Caso seja retirado o plebiscito, vai precisar de um projeto de lei para autorizar a venda?
Antunes - Sim, projeto de lei complementar, com maioria absoluta para a aprovação, ou seja, 28 votos.
JC - Durante a campanha o governador falava que tentaria a retirada do plebiscito e, caso não conseguisse, faria o plebiscito. Trabalham com essa hipótese?
Antunes - Não. Estamos trabalhando hoje com uma meta, que é fazermos a mudança e retornarmos o artigo 22 da Constituição Estadual (que a PEC pretende alterar). O constituinte fez a Constituição sem essa necessidade, e houve um amplo debate na época. E lá na frente, por algumas situações do momento, foi sugerida a indicação (da necessidade do plebiscito), que a Assembleia, por unanimidade, acatou. Hoje estamos revisando isso por uma vontade das urnas, e por uma necessidade premente de sobrevivência do Estado. No momento que fizermos isso estaremos começando a dar uma resposta para o cidadão.
JC - O senhor falou da CEEE, que apresenta o maior desequilíbrio financeiro. Por outro lado, a Sulgás, incluída nesse pacote é uma empresa superavitária e retorna parte dos lucros ao governo.
Antunes - Há empresas que não têm a situação da CEEE e que estão colocadas lá porque, se mudarem de mão, não vai mudar o que elas servem ao Estado. Vai mudar alguma coisa na nossa vida?
JC - Talvez não na do cidadão, mas do retorno financeiro que o Estado tem.
Antunes - Mas não tem um retorno hoje que possa ser considerado expressivo. Se quiser fazer um acordo com quem te pede para se livrar de alguns anéis para não perder os dedos, não pode dar para ele só o que não tem valor. Alguma coisa tem que ter de valor. Apesar de ser pequeno, para garantir, por exemplo, uma carência e dilatação de prazo para pagamento da dívida. Não posso dar só uma companhia que tem hoje números que não são bons. Tem que dar também alguma coisa que, apesar de pequeno, tem algum valor, mas não vai mexer na vida do Estado e dos cidadãos. Não considero que o serviço de gás só possa ser tocado pelo Estado. Também o serviço de mineração, inclusive com todas as restrições que temos hoje para continuar a exploração carbonífera.
JC - O Banrisul não está nesse pacote e o governador já falou que não tem interesse em privatizar, mas argumentos em contrário dizem que o mesmo caminho adotado com as estatais de energia pode ser feito com o Banrisul. Como o governo lida com esses argumentos?
Antunes - O governador foi muito claro. Acredito muito na palavra de um homem eleito, e o governador disse isso publicamente: o Banrisul não está para troca.
JC - Por mais que seja de interesse do próprio governo federal?
Antunes - O governador tem repetido que o Banrisul não está nas contrapartidas, assim como ele afirma da Corsan (Companhia Riograndense de Saneamento). Isso ele deixou bem claro, que o Banrisul, se porventura houver novamente uma valorização das ações possíveis, que não são as ordinárias, o governador também vai fazer disso um ativo para poder colocar as contas em dia, coisa que não mexe no controle acionário do Estado. Uma coisa é o plebiscito, a outra é o projeto de privatização. Está tendo uma certa tentativa de confusão, principalmente de um campo que não contribui em nada para reverter as dificuldades que o Estado tem, que é o campo ideológico. Tenho a minha ideologia e respeito quem tem a sua, mas, para algumas questões, se colocarmos isso na frente é como colocar alguma coisa na frente da dignidade humana. Tem gente que quer fazer essa mistura de temas. O plebiscito é uma limpeza constitucional necessária para passar para o segundo passo. E se alguém quiser falar sobre necessidade de plebiscito, também sugiro que volte atrás no tempo e veja o quanto foi tentado e não foi permitido.
JC - O governo está sustentado numa liminar para não pagar o que deve em precatórios, de acordo com exigência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O senhor acompanha o tema, presidindo a frente parlamentar e as comissões para discutir o tema. Como pretendem lidar com essa situação?
Antunes - Continuo com a mesma convicção. O Estado não pode continuar sendo o maior caloteiro de plantão. Tem que pagar as suas contas assim como nos faz pagar as que temos com ele. Tenho o mesmo pensamento, independentemente de ser líder do governo. Agora, a forma de pagar e o tempo têm que estar adequados à possibilidade de pagar. Não posso tirar do essencial para pagar outro essencial. A PEC 62 dava o prazo até 2020 e exigia pagamento de no mínimo 1,5% da RCL ao mês. Mas vimos que havia um distanciamento por muitos motivos, como a incapacidade do Estado e os mecanismos não estarem adequados para chegarmos ao volume que só cresce de dívida do Estado com precatórios. A partir da PEC 99 (que alterou o entendimento da PEC 62), o prazo, que todos se deram conta que não seria possível de ser cumprido, foi alongado para 2024. E o Judiciário, através do CNJ, decretou que temos que dividir R$ 18 bilhões (passivo dessa dívida) por seis anos, que dá R$ 3 bilhões por ano, e esse valor por 12 meses, que representaria o valor da parcela. Queremos propor que isso não seja medido por mês, mas sim por períodos mais dilatados nos quais se possa ir crescendo (o pagamento) conforme a recuperação financeira do Estado ou até vendendo patrimônio para pagar. No momento que veio o sequestro - e foi avisado pelo Tribunal de Justiça, isso é verdade - o Estado conseguiu a liminar porque deve, reconhece e assume que irá pagar, só que dentro do prazo dado, até 2024, e também porque apresentou a sua situação financeira. O Estado deverá fazer o esforço para o cumprimento da PEC, mas não necessariamente a partir do primeiro mês.

Perfil

Frederico Cantori Antunes tem 50 anos e é natural de Uruguaiana. É graduado em Agronomia pela Pontifícia Universidade Católica (PUC), campus de Uruguaiana. Iniciou sua carreira política junto aos arrozeiros da sua região. Em 1992, já filiado ao PP, foi eleito o vereador mais votado de Uruguaiana. Entre 1996 e 1998, Frederico ocupou a diretoria de Fomento e Patrimônio do Banrisul. Em 1998, conquistou pela primeira vez uma cadeira na Assembleia Legislativa, sendo reeleito em 2002, 2006, 2010, 2014 e 2018. Foi secretário Estadual de Obras Públicas e Saneamento na gestão de Germano Rigotto (MDB, 2003-2006). Durante este período, presidiu o Fórum Nacional dos Secretários Estaduais de Saneamento e o Conselho Administrativo da Corsan. Foi presidente da Assembleia Legislativa em 2007. Tem atuação marcada pelo debate de temas como o pagamento de dívidas do Estado com precatórios e requisições de pequeno valor e pelo desenvolvimento econômico da região de fronteira. Atualmente, é líder do governo Eduardo Leite (PSDB)no Parlamento e presidente da Comissão Mista Permanente do Mercosul e Assuntos Internacionais.