Trabalho em modo eterno

“Quando você chega próximo do fim, pensa no início" - é frase do filme Mr. & Mrs. Smith que reflete quando estamos próximos a linha de chegada em algum aspecto da vida.

A reflexão que faço diz respeito a minha aposentadoria e a de milhões de brasileiros no contexto catastrófico de uma reforma da previdência que tirará direitos de décadas dos trabalhadores.

No meu caso, hoje faltaria em torno de cinco anos para me aposentar. Com a reforma, esse tempo aumenta para mais que o dobro, e ainda para receber um "benefício" que mais parece gorjeta. O que me colocaria numa posição de trabalhadora em modo eterno.

Iniciei aos 14 anos vendendo os tricôs que fazia para amigos e parentes próximos, até entrar oficialmente para o mercado de trabalho aos 17 anos. Meu sonho é de que na velhice estivesse numa situação confortável sentada junto à lareira tricotando como distração e acreditando ser a mulher da ‘alma peregrina’ versada por Yeats no poema: “Quando fores velha”. Todavia visualizo o futuro como reedição do passado: os tricôs como acréscimo financeiro.

Estamos vivendo no Brasil uma necropolitica - termo utilizado por Ulysses Ferraz – visto que mata-nos um pouco todos os dias. E não se trata de identificação com ideologia de esquerda ou de direita, mas de perdas de direitos laborais conquistados por décadas.

Se faz urgente que acordemos para esses acordes desafinados de um desgoverno que nos deixa à deriva, e que vai levar mais alguns milhões ao estado de miséria ou morte prematura.

Não poderemos ficar doentes, com senilidade, indispostos, porque não seremos produtivos economicamente, e precisaremos ser até o fim da vida.

Não carrego essa culpa, assim como milhões de nós, mas seremos castigados da mesma forma: trabalho em modo eterno. Somos um povo que "não vive apenas agüenta". Faz-se urgente enxergarmos a grave situação, até porque mais tarde nem teremos dinheiro para fazer óculos novos.