Em maio de 2021 completam oito décadas de um dos maiores eventos naturais da região do Vale do Taquari. Conhecida como uma das mais severas cheias já registradas no rio Taquari, a inundação ocasionada por semanas de chuva naquele ano não tornou a se repetir ou ser superada. Registros históricos apontam que, naquela ocasião, choveu por 22 dias consecutivos no Estado e o rio Taquari atingiu 29,92 metros, causando grandes impactos socioeconômicos e ambientais em toda a região hidrográfica do Guaíba - mais da metade do Rio Grande do Sul.
Outras cheias,
como a mais recente, de julho de 2020, no entanto, lembram da importância do registro e do conhecimento sobre o comportamento dos cursos d'água - rios e arroios, especialmente - e também do volume de chuvas para a previsibilidade de inundações. Por isso, um estudo recentemente publicado com participação de uma professora da Universidade do Vale do Taquari - Univates buscou avaliar, por meio de um cálculo, qual é a antecedência mínima necessária para a previsão de inundações na região de Lajeado. O trabalho é da docente do Centro de Ciências Exatas e Engenharias (CEE) Sofia Royer Moraes em conjunto com Walter Collischonn, Fernando Mainardi Fan, Ayan Fleischmann, Lucas Giacomelli e Vinícius Alencar Siqueira.
O Vale do Taquari é uma área baixa da bacia hidrográfica do Taquari-Antas. Só a área de drenagem do rio Taquari tem cerca de 22,4 mil quilômetros quadrados. A água dessa chuva converge, naturalmente, para um mesmo ponto - o rio Taquari. Em termos de estatística, os registros históricos indicam que a região enfrentou uma inundação a cada 1,5 anos nas últimas sete décadas.
As informações coletadas pelos instrumentos oficiais sobre o nível da água do rio ao longo de diferentes pontos da bacia hidrográfica, em caso de cheias, já são atualmente cruzadas para a criação de modelos e previsões acerca do nível provável que a inundação pode atingir em outros pontos à frente. "Para ser mais assertivo, a gente precisa de mais estações de monitoramento do nível da água e do volume de chuva", afirma a professora Sofia Royer Moraes.
O cálculo desenvolvido, que considera um intervalo de tempo entre 6 horas e 25 horas, leva em conta também o início da cheia no local de interesse. Por exemplo, numa enchente, se às 2h da manhã o nível do rio Taquari em Lajeado começou a aumentar, o intervalo entre 6 horas e 25 horas a partir daquele ponto se torna crucial para determinar o nível máximo que a cheia pode atingir naquele local.
A conta funciona bem para cheias cuja origem está associada ao escoamento de maiores volumes de precipitação na área de drenagem da bacia-hidrográfica a montante de
Encantado, que teve a maior cheia da sua história em 2020, mas não para eventos em que maiores índices pluviométricos estão concentrados em regiões de cabeceira de rios que trazem as suas águas para o Taquari, o caso do rio Forqueta, a jusante de Encantado. Por estar situado depois de Encantado, todo esse volume de água não pode ser considerado, pois é imprevisto. "Encantado não recebe a influência do rio Forqueta, e, quando passa pela cidade, o Taquari já recebeu a água dos dois rios anteriores, o Guaporé e o Carreiro. O rio Forqueta é uma carga de água adicional".
Para organizar um sistema de previsão com uma antecedência de 25 horas, são necessários investimentos tanto no desenvolvimento de um sistema de modelagem chuva-vazão, que expanda o cálculo apresentado pelos pesquisadores, quanto na instalação de estações de monitoramento de chuva e vazão com dados telemétricos ao longo de toda a bacia hidrográfica do rio Taquari-Antas.
De acordo com as estimativas apresentadas pelo estudo,
na cidade de Lajeado, somando a vazão do rio Forqueta e de outros afluentes de ordem inferior, em períodos de elevadas precipitações e de grandes cheias, a vazão do rio Taquari pode ultrapassar 12.000 metros cúbicos por segundo (m³/s), e o nível da água pode subir até 15 metros em pouco tempo.
Em julho de 2020, uma grande inundação atingiu as cidades do vale do rio Taquari. A inundação atingiu a marca de 27,39 metros no linígrafo automático do Sistema de Alerta de Eventos Críticos (Sace), instalado no Porto Fluvial de Estrela e mantido pela Agência Nacional das Águas (ANA), do Serviço Geológico do Brasil (CPRM). A inundação de 9 de julho de 2020,
que trouxe uma série de estragos, é a quarta maior desde o início da série histórica e a maior nos últimos 64 anos.
Na ocasião, a vazão passou de 14.000 m³/s, subindo de um patamar de 2.000 m³/s até o pico em um intervalo de 30 horas. Os níveis nesse evento demoraram 19 horas para subir 5 m (cerca de 0,26 m/h). Para a inundação de julho de 2020, que teve seu pico às 2h da madrugada do dia 9 de julho, as previsões erraram de forma significativa tanto o nível da inundação quanto o momento da estabilização, dificultando ainda mais as ações de resposta pelas defesas civis municipais.