Distanciando-se da postura de confrontação total com a Venezuela, o novo comando do Itamaraty abandonou os ataques ao governo de Nicolás Maduro, sinalizou apoio a que a ditadura abra uma mesa de negociação com a oposição e reduziu contatos com aliados do líder antichavista Juan Guaidó.
Com isso, o novo chanceler Carlos França marca uma diferença de seu antecessor, Ernesto Araújo, que desde 2019 promoveu uma política de amplo apoio a Guaidó e manteve as portas da chancelaria abertas para seus aliados no Brasil.
A mudança de rumo foi arquitetada por diplomatas para afastar o Brasil de choques considerados desnecessários com a administração Maduro, um pleito que vinha sendo feito pela ala militar e por setores pragmáticos no governo.
Também é um reflexo das alterações no cenário internacional. A linha patrocinada por Ernesto - que frequentemente denunciava uma narcoditadura e um "complexo criminoso-político" chavista - perdeu seu principal fiador com a
saída do ex-presidente Donald Trump da Casa Branca.
No lugar do republicano, Joe Biden pretende enfrentar o tema Venezuela mantendo a ofensiva diplomática e econômica, mas abrindo a possibilidade de algum tipo de negociação com o governo. A avaliação interna no novo comando do Itamaraty é que a administração chavista se solidificou no poder, apesar da estratégia de pressão máxima exercida nos anos Trump.
Nesse sentido, os constantes ataques de Ernesto a Maduro serviam para o ex-chanceler atender a base mais radical do bolsonarismo, mas não traziam benefícios para o Brasil no contexto regional. A nova postura não significa, afirmam interlocutores, um endosso a Maduro, mas aponta para um reconhecimento da realidade. Goste o Brasil ou não, Maduro segue no poder, e canais mínimos de comunicação com o governo vizinho precisam ser cultivados.
Porém, isso não quer dizer que o Brasil tenha mudado a essência da sua política em relação à Venezuela. Pessoas envolvidas no tema dizem que o Itamaraty segue sem acreditar em nenhuma promessa de abertura feita pelo chavismo e que continua reconhecendo Guaidó como presidente venezuelano.
Descartam ainda que o Brasil planeje voltar atrás e deixar de tratar Guaidó como líder de direito do país vizinho. Em janeiro, a União Europeia retirou seu reconhecimento ao opositor venezuelano como presidente interino.
Há mais de um mês no cargo, França ainda não conversou com Julio Borges, que atua como chanceler da oposição venezuelana. O contato não ocorreu mesmo ele tendo realizado videoconferências com diversos homólogos vizinhos.