Na segunda-feira (1º), o premiê Boris Johnson anunciou que 90% das pessoas com mais de 80 anos já receberam a primeira dose, e ela foi oferecida a todos os mais de 10 mil asilos do país - moradores e funcionários estavam entre principais grupos prioritários.
Johnson também divulgou a compra de mais imunizantes, consolidando doses suficientes para imunizar o triplo de toda a população do país. Com os 40 milhões de novas doses do imunizante desenvolvido pela Valneva, ainda em fase de testes, chegam a 407 milhões as já contratadas.
Só com as três vacinas já em uso - Pfizer/BioNTech, Moderna e Oxford/AstraZeneca - o governo britânico já garantiu 157 milhões de doses, suficientes para as duas injeções necessárias em 78,5 milhões de pessoas. Mais que seus 52,9 milhões de residentes adultos, a partir dos 18 anos. Mais até mesmo que a população total, de 66,7 milhões de habitantes.
Igrejas, estádios, teatros, estacionamentos, clínicas e estações transformados em centro de vacinação parecem indicar que a campanha de Johnson tem tudo para
cumprir a meta estabelecida para 15 de fevereiro: aplicar a primeira dose em 15 milhões de cidadãos, entre os mais vulneráveis a complicações pela Covid.
O recorde de injeções diárias do sábado fechou uma semana em que dois outros imunizantes encomendados por Boris - os da Novavax e da Janssen - demonstraram ser eficientes contra o Sars-Cov-2 (completam a lista de fornecedores a GSK/Sanovi e a Valneva, que está sendo fabricada na Escócia).
O premiê investiu em sete vacinas de tecnologias e fontes diferentes para ter flexibilidade tanto na campanha atual quanto se houver necessidade de revacinar parte da população no futuro. Com fábricas em seu próprio país e a decisão de adiar a administração da segunda dose para alcançar o maior número de pessoas com ao menos uma injeção, ele também ganhou velocidade.
Enquanto as taxas de vacinação sobem, as de ocupação de leitos hospitalares e de UTI caem sucessivamente nos últimos dias. Não há ligação direta ainda estabelecida, mas estima-se que, no Reino Unido, os 20% prioritários para receberam a vacina são os mesmos grupos em que acontecem 90% dos casos mais graves e mortes por Covid-19. Se eles estiverem imunizados, deve se reduzir a pressão sobre os hospitais.
Uma análise do banco Goldman Sachs publicada no dia 18, quando o ritmo de vacinação no Reino Unido não era tão forte como o desta semana, calculava que os imunizantes já tinham reduzido as hospitalizações em 7%. No melhor cenário, em abril a queda chegaria a 75%, elevando o potencial de recuperação da economia britânica. O impacto é da mesma ordem do estimado pelo JPMorgan: mantido o passo da imunização, o número de pessoas no hospital passaria de 40 mil em janeiro para 10 mil em abril.
O sucesso do governo de Johnson no programa de vacinação ainda não se traduziu em popularidade - de acordo com o levantamento mais recente do instituto YouGov, ele era desaprovado por 55% e aprovado por 39% -, mas já inverteu a direção da curva e reverteu uma sucessão de medidas erráticas e ineficientes, que levou o Reino Unido ao topo dos países mais afetados pela Covid-19 no mundo: 3,8 milhões de casos e mais de 100 mil mortes desde o começo da pandemia.
Em relação ao tamanho da população, o país é o terceiro com mais mortes, 156 por 100 mil habitantes, atrás da Bélgica e da Eslovênia. Mas agora ele é o terceiro do mundo em um ranking muito mais favorável, o de doses aplicadas por 100 habitantes. Até domingo (31), eram quase 14, atrás de Israel e dos Emirados Árabes Unidos e muito à frente de seus vizinhos europeus - o mais avançado deles é a Sérvia, com 6,4/100.
O caminho de Johnson para reverter o histórico de fracassos, porém, ainda não está totalmente desimpedido. A recente disputa por vacinas lançada pela União Europeia, por exemplo, pode afetar o fluxo de suprimentos que vêm da Bélgica, reduzindo a produção britânica.
Uma interrupção severa na disponibilidade de imunizantes detonaria uma bomba ainda mais grave: a administração da segunda dose de vacina, que o Reino Unido adiou justamente para fazer deslanchar o número dos que receberam ao menos a primeira injeção. Pelos planos do governo, a segunda dose começará a ser dada no início de julho, o que lhe dará alguma folga para administrar um eventual gargalo.
É o índice mais alto registrado pelo estudo desde seu início, em maio do ano passado. Os números "são um lembrete gritante da necessidade de permanecer alerta", disse o secretário da Saúde, Matt Hancock. Estudos feitos no ano passado calcularam que, entre junho e julho, apenas 6% dos britânicos haviam tido contato com o vírus. Trabalhos recentes especulam que esse número poderia ser o dobro, mas, ainda assim, quase 9 em cada 10 habitantes ainda poderia ser infectado.
Com o programa de vacinação em marcha, a nova frente de batalha de Johnson é isolar todos os casos da variante identificada primeiro na África do Sul. Nos últimos dias, o governo identificou 105 casos desse mutante, 11 deles sem ligação com viagens internacionais, e
botou todos em isolamento, incluindo seus contatos. Como parte da operação abafa, funcionários do governo bateram de porta em porta nesta terça (2) para testar ao menos 80 mil pessoas.
Johnson também terá que resolver a questão da desigualdade na proteção de seus habitantes: estudos mostram que minorias e os mais pobres estão mais suscetíveis à contaminação pelo coronavírus e têm menos acesso às vacinas, e torcer para que não surjam novos mutantes resistentes às suas injeções.