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Direitos humanos

- Publicada em 19 de Dezembro de 2018 às 22:42

Refugiado venezuelano toca na Orquestra Sinfônica de Porto Alegre

Trombonista diz que convite deu motivação para seguir praticando

Trombonista diz que convite deu motivação para seguir praticando


/MARIANA CARLESSO/JC
De terno, gravata e trombone empunhado, o venezuelano Nelson Franceschi, de 23 anos, parecia em casa na terça-feira, em meio aos quase 100 músicos da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (Ospa). O dia era de celebração, pois marcava o último concerto de um 2018 já festivo para o grupo, que ganhou a Casa da Música, sua primeira "casa própria" em 68 anos de existência. A cereja do bolo da noite ficou por conta dos convidados - o acordeonista Renato Borghetti, a soprano Elisa Machado, o grupo Expresso 25, o Coro Sinfônico da Ospa e o tímido venezuelano, o primeiro refugiado a tocar junto à orquestra em toda a sua história.
De terno, gravata e trombone empunhado, o venezuelano Nelson Franceschi, de 23 anos, parecia em casa na terça-feira, em meio aos quase 100 músicos da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (Ospa). O dia era de celebração, pois marcava o último concerto de um 2018 já festivo para o grupo, que ganhou a Casa da Música, sua primeira "casa própria" em 68 anos de existência. A cereja do bolo da noite ficou por conta dos convidados - o acordeonista Renato Borghetti, a soprano Elisa Machado, o grupo Expresso 25, o Coro Sinfônico da Ospa e o tímido venezuelano, o primeiro refugiado a tocar junto à orquestra em toda a sua história.
O convite da Ospa não veio do nada. Professor de trombone na Orquesta Sinfónica de Ciudad Bolívar, na Venezuela, Franceschi contou ao Jornal do Comércio, em matéria publicada em 5 de dezembro, que um de seus planos ao se estabelecer no Estado era ingressar na Ospa como trombonista. Sensibilizados pela história do jovem, os músicos o convidaram para participar do concerto.
> VÍDEOS JC: Veja alguns momentos de como foi a participação de Franceschi
A expectativa de Franceschi é conseguir trabalhar mais continuamente com música, por meio de convites da orquestra, ou de oportunidades surgidas dessa participação. "A Ospa é uma orquestra com talento demais. Havia tempo que eu não praticava, e esta experiência me dá energia e motivação para seguir estudando, praticando e ensaiando", revela.
A ideia de convidar o venezuelano veio do trombonista da Ospa Julio Rizzo, que mostrou a reportagem a Evandro Matté, maestro e diretor artístico da sinfônica. "Eu já vinha com a intenção de convidar a violoncelista (Dulce Martinez, também venezuelana), mas ela não pôde vir, e Rizzo sugeriu que Franceschi viesse. Soube que ele não estava trabalhando com música e eu disse 'claro, vamos sim', porque dali podem se abrir portas para ele", recorda o maestro. O migrante visitou a Ospa na sexta-feira e, na terça-feira, participou do ensaio geral e do concerto. Tocou junto ao naipe de trombones nas três últimas músicas, de temática natalina.
Sobre futuras eventuais participações, Matté não descarta. "Sendo um músico com condições de tocar aqui, pode participar outras vezes, sim. Agora, estamos nos aproximando dele, queremos também convidar a violoncelista e, no futuro, quando tivermos algum cachê, podemos contar com ele", avalia. O maestro salienta que a Venezuela foi, nas duas últimas décadas, o país que mais produziu músicos de concertos e possui grupos de muito respeito, como a Orquesta Sinfónica Simón Bolívar, "modelo para o mundo inteiro".
Ingressar de vez na Ospa, contudo, Franceschi só poderá almejar quando for feito um novo concurso. Como o chamamento do certame é internacional, não sendo necessário ser brasileiro nato para ingressar na sinfônica, a condição de estrangeiro não será um empecilho. O último concurso foi feito em 2014 e um novo já foi solicitado, com previsão, entre outras, de uma vaga para trombonista. "Esperamos que ocorra em algum momento de 2019", calcula o maestro.

'Vale a pena estender a mão a um venezuelano'

A vida de Franceschi e de sua esposa, Zara D'Franceschi, de 25 anos, mudou muito nos últimos seis meses. Cansados de trabalhar em dois a três empregos e não ter dinheiro nem para se alimentar, os dois partiram do estado venezuelano de Bolívar em julho e rumaram a Boa Vista, capital de Roraima, onde ficaram três meses. "Mochila nas costas, trombone em uma mão e minha esposa na outra", lembra o jovem. Lá, ao fazer um exame de sangue, Zara descobriu estar grávida, o que deu prioridade ao casal para a transferência, via governo federal, para o Rio Grande do Sul
No Estado, a dupla se estabeleceu em um dos Centros Temporários de Acolhida de Canoas. Mas, desde domingo, a família vive em uma casa alugada no bairro Harmonia. A mudança só foi possível graças à contratação do jovem como funcionário de um hotel. "Graças a Deus, muitas bênçãos chegaram à minha família. Estou tocando com a Ospa por um convite pelo qual estou muito orgulhoso e emocionado. Fico agradecido a todos os integrantes da Ospa", revela Franceschi.
O venezuelano agradece à prefeitura de Canoas pela acolhida, e aos amigos que fez, que ajudaram a alugar a casa e conseguir um emprego. E manda um recado: "Esse agradecimento demonstro tocando aqui, mostrando que somos pessoas que merecemos ajuda. Vale a pena estender a mão a um venezuelano. Assim como fizeram comigo e minha esposa, espero que sigam ajudando aos refugiados que ainda chegam", diz. Na terça-feira, mais 107 migrantes chegaram ao Estado. Outros 734 já tinham vindo nos últimos meses.
Além de trabalhar com música, Franceschi, que fazia faculdade de Medicina na Venezuela, quer cursar Psicologia. Se inscreveu em um edital para refugiados da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs). Foi selecionado, mas depende de uma mudança de status na Polícia Federal para poder cursar. "Nos deram residência por dois anos no Brasil e uma faculdade de Psicologia dura mais tempo que isso, então preciso de uma expansão desse visto", explica.