Os alunos chegam às salas de aula diferentes, munidos de tecnologia. Como isso transforma a rotina de estudos?

As novas formas da educação desafiam empreendedores


Os alunos chegam às salas de aula diferentes, munidos de tecnologia. Como isso transforma a rotina de estudos?

Como será a escola do futuro? De que maneira a tecnologia será usada em sala de aula? Quais aptidões serão exigidas pelo mercado de trabalho? Esses e muitos outros questionamentos fazem parte das reflexões de pais, professores e, obviamente, empreendedores e empreendedoras. O que pessoas que atuam no ramo da educação estão criando para atender estudantes que sempre tiveram contato com a tecnologia, os chamados nativos digitais?
Como será a escola do futuro? De que maneira a tecnologia será usada em sala de aula? Quais aptidões serão exigidas pelo mercado de trabalho? Esses e muitos outros questionamentos fazem parte das reflexões de pais, professores e, obviamente, empreendedores e empreendedoras. O que pessoas que atuam no ramo da educação estão criando para atender estudantes que sempre tiveram contato com a tecnologia, os chamados nativos digitais?
Processos analógicos - como a folha recém-saída do mimeógrafo, a expectativa da revelação de um filme fotográfico e o tema de casa baseado em enciclopédias - não fazem parte do imaginário desses jovens. Hoje, o acesso rápido à informação faz a sociedade repensar a educação.
Com isso em mente, Marcos Piangers e Gustavo Borba lançaram o livro A escola do futuro, parceria que surgiu após um evento juntos. "Fomos convidados para fazermos uma palestra no Rio de Janeiro com foco em educação. O Piangers é um cara que escreve há muito tempo sobre essa questão da tecnologia, e eu pesquiso a área de engajamento entre aluno e professor. Gostamos tanto da dinâmica que surgiu a ideia de montar, a partir daquele debate, um livro", conta Gustavo, que é diretor de Graduação da Unisinos.
Na obra, Piangers apresenta a perspectiva de um pai que vive o momento em que os filhos têm pleno acesso à tecnologia e que, provavelmente, devem trabalhar em profissões que ainda não existem. Já Gustavo ressalta a maneira como professores podem ressignificar as relações em sala de aula em prol do engajamento.
"Além da competência técnica, da profissão que o aluno vai escolher, pesquisamos quais competências horizontais ele precisa ter", conta Gustavo. O desenvolvimento dessas habilidade, aliás, é estimulado (ou não) na escola. "Uma sala de aula clássica, como a que eu estudei, em que o professor está transmitindo uma coisa e não construindo um diálogo, não tem mais muito espaço hoje, tanto nas universidades quanto nas escolas", acredita.
Trabalhar a tecnologia de maneira interessante pode ser, segundo Gustavo, um aliado para captar a atenção dos estudantes. "A tecnologia tem que ser um espaço para mediar uma conversa, e não um fim. Quando a aula não está legal e o aluno pega o celular para olhar uma coisa nada a ver, ele se afasta daquele lugar e usa a tecnologia como um fim para ir para um outro espaço. Agora, se o celular é um elemento que o professor, por exemplo, faz uma pergunta e pede que os alunos consultem para trazer a resposta, a tecnologia passa a ser um meio entre o professor e o aluno", pondera.
Nesses casos, o professor assume um papel de curador da informação, que é buscada pelo estudante. "O aluno tem um recurso que nunca tivemos disponível, tem acesso a uma informação, muitas vezes, mais qualificada que eu tenho no próprio livro. O professor pode fazer uma curadoria, por exemplo, se o aluno for num site equivocado. É uma potência que pode se revelar", acredita Gustavo.
Assim como na sala de aula, a interação entre pais e filhos ocupa novos espaços nesse momento de transformação. A dinâmica de sentar e fazer o tema acaba se perdendo dentro da rotina atribulada. "Saímos do lugar onde o pai era minha única fonte para uma dinâmica onde o pai fica dispensável. Quando eu era guri, minha mãe me ajudava a fazer os temas. Hoje, o aluno chega em casa e pode trocar ideia com o colega no WhatsApp, consultar o Google", entende.
Nenhum dos dois sistemas, no entanto, é o ideal na relação entre pai e filho. "Acredito que o papel dos pais não é só estar à disposição dos filhos nesse processo, mas mostrar interesse em estar próximo. É muito fácil pensar 'ah, meu filho está lá fazendo os temas, ele pode consultar e, se precisar, me chama'. Mas o pai ajuda a criar interesse em um assunto contando a sua experiência com aquele tema."
Ou seja: os responsáveis pelas crianças assumem, então, o papel de contadores de histórias, uma das habilidades que é destacada pelos autores como ferramenta para os professores gerarem o tão falado engajamento. De forma geral, essas táticas são as mesmas para professores desde o Ensino Fundamental até a universidade, e também independem se são feitas em uma escola pública ou privada. "Na escola pública, por exemplo, construir projetos que estão vinculados aos interesses dos alunos, projetos que resolvem problemas que os alunos têm no seu dia a dia ou têm interesse em construir coletivamente, é a chave para uma experiência inovadora. Independentemente de ter mais ou menos recursos, a grande questão é o engajamento, e ele está ligado a questões práticas da rotina do aluno. Se o professor consegue construir essa conexão, a experiência vai ser muito mais rica", acredita Gustavo.
Basicamente, o que se enxerga é que as aptidões que os alunos devem ter para o mercado de trabalho do futuro estão relacionadas com a comunicação e a um entendimento mais amplo de sociedade. "São competências que fazem que eu saia do meu lugar técnico e vá para um espaço de construção horizontal, de compreender o outro, de entender o papel do outro na minha atividade e de me conectar com ele." Além disso, a velha dicotomia entre exatas e humanas deve ter cada vez menos espaço. "Essa história de que se tu és isso tu não és aquilo se perdeu ao longo do tempo. Temos que ter competências que são mais transversais em qualquer profissão", acredita o especialista.

Técnicas de programação para crianças e adolescentes

As transformações na educação fazem desse campo um mercado em ascensão. Foi por esse motivo que Pedro Wolf, Guilherme Deppermann e Bruno Lain investiram na franquia da Happy Code, escola de tecnologia, inovação e programação para crianças e adolescentes.
Os sócios já tinham experiências com franquias e, por isso, decidiram buscar um novo modelo que tivesse possibilidade de crescimento de mercado. "Fomos para a feira da Associação Brasileira de Franchising, em São Paulo, para ver as novidades. Conversamos com mais de 50 franquias de diferentes segmentos. Optamos pela Happy Code por ter um bom retorno financeiro e pelo propósito diferente. Não tem gratificação maior que participar da educação e do desenvolvimento da nova geração", acredita Pedro. A Happy Code foi criada em 2015, em Valinhos, São Paulo, e conta com mais de 100 unidades no Brasil e 15 na Europa. Além disso, o grupo conta com um escritório de inovação no Vale do Silício.
A primeira escola em Porto Alegre foi inaugurada em janeiro de 2018, no bairro Moinhos de Vento. Com o fluxo de alunos, os sócios abriram, em janeiro de 2019, a segunda unidade, desta vez na Zona Sul (avenida Wenceslau Escobar, nº 2.320). São oferecidas três modalidades: cursos de férias, colônia de férias e disciplinas anuais.
Os alunos, que podem ter de cinco a 17 anos, aprendem desde técnica de programação até como ser um youtuber. "Para cada faixa etária a gente utiliza softwares e recursos adequados para o ensino. A mensalidade dos cursos anuais é de R$ 325,00, e o valor do material é R$ 360,00. Para crianças de cinco e seis anos, a gente tem o curso de gamers juniors, que usa softwares bem lúdicos", explica.
O importante, segundo Pedro, é ter contato com a lógica de programação. "Ensinamos em blocos, sem ter aquela linguagem mais complexa."
Em todos os cursos, os alunos recebem problemas que estão ligados às demandas da Organização das Nações Unidas (ONU), como pobreza e desigualdade. "Trazemos elementos dos games, que são tão interessantes para as crianças, para dentro de sala de aula. O fato de eles terem o feedback rápido com períodos menores e mais constantes faz eles entenderem o que estão desenvolvendo."
LUIZA PRADO/JC
 

Orlando City promove prática do inglês em meio aos passes de futebol

Educar também tem que ser uma atividade prazerosa. E é nisso que acredita Pedro Viana, representante do Orlando City Soccer School no Rio Grande do Sul. Com sete unidades no País, a grife do time norte-americano chegou a Porto Alegre em agosto de 2018 em parceria com a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Pucrs). A escolinha, além de futebol, aproxima os alunos da língua inglesa.
"A nossa ideia era tornar o espaço da área externa mais utilizado e ter um projeto com maior impacto. Como universidade, sempre temos a preocupação com o ensino e vimos, no Orlando City, uma possibilidade que estaria muito casada com o nosso propósito", diz Márcio Müller, coordenador do Parque Esportivo.
"Aqui, prevalece a diversão com o conteúdo. A gente preza que a criança sorria, grite, brinque, se divirta. Sempre orientamos os pais para perguntarem se os filhos estão felizes e querem voltar", afirma Pedro, que enxerga nessa premissa muito de sua trajetória profissional como atleta. Natural de Curitiba, ele começou a jogar futebol com sete anos. Aos 13, foi para o Flamengo e de lá saiu para atuar na Europa, onde passou por mais de oito países e 25 cidades. "Comecei a jogar muito cedo, então perdi a infância, a adolescência. O mais importante que levo dessa trajetória é aprender a cuidar das crianças para que elas sejam crianças e não carreguem as expectativas dos pais. Quando você já é quase um profissional, não pode brincar mais."
Por isso, a escola não faz seleção das habilidades técnicas. Com nove professores, as aulas têm uma hora de duração para crianças até 11 anos e de uma hora e meia após os 12 anos. Nos primeiros anos, o contato com o inglês fica somente nos comandos. A partir dessa idade, a aula é toda ministrada em inglês. "É uma conversação de futebol em inglês. Você realmente está inserido na educação de uma cultura diferente", acredita Pedro. Para ele, aliás, esse é o grande diferencial da operação. "O gaúcho é muito Grêmio e Inter. Quando chega uma marca nova, eles já acham que é para rivalizar. Mas quando o pai entende que isso é usado como educação, que o filho vem para cá e assiste a aulas em inglês, faz futebol em outro idioma, ele entende a diferença."
A escola também aposta no futebol feminino, já que, nos Estados Unidos, a modalidade profissional é mais forte entre as mulheres. Hoje, 5% dos alunos são meninas, mas o desejo é aumentar esse número. A escola em Porto Alegre, inclusive, é a única no Brasil que está vinculada a uma universidade, e soma mais de 200 alunos entre dois e 20 anos.
"A possibilidade de troca entre a escola e a universidade é muito grande. Aqui, se produz um conhecimento prático, e lá, na academia, um conhecimento teórico", celebra Márcio.
MARCELO G. RIBEIRO/JC