Com as dificuldades e mudanças na forma de consumo trazidas pela pandemia, empreendedores estruturaram novas operações

Negócios mudam o foco para se manter em meio à pandemia


Com as dificuldades e mudanças na forma de consumo trazidas pela pandemia, empreendedores estruturaram novas operações

Frente à crise e às restrições impostas pela pandemia, recalcular a rota foi um movimento imprescindível para quem estava à frente de um negócio. Para as sócias do Estômago, café vegano que operava desde 2017 em Porto Alegre, não foi diferente. O casarão na rua Miguel Tostes fechou as portas ainda em março do ano passado. Agora, as irmãs Julia e Lidia Fraguas dedicam seus esforços para o recém-inaugurado Café Angélica, espaço especializado em frutas e vegetais no bairro Bom Fim.
Frente à crise e às restrições impostas pela pandemia, recalcular a rota foi um movimento imprescindível para quem estava à frente de um negócio. Para as sócias do Estômago, café vegano que operava desde 2017 em Porto Alegre, não foi diferente. O casarão na rua Miguel Tostes fechou as portas ainda em março do ano passado. Agora, as irmãs Julia e Lidia Fraguas dedicam seus esforços para o recém-inaugurado Café Angélica, espaço especializado em frutas e vegetais no bairro Bom Fim.
Quando iniciou a pandemia, rapidamente, as sócias agiram para minimizar os impactos no negócio. Julia afirma que, na época, contavam com 12 colaboradores na operação, que funcionava em um imóvel com mais de 200m². "Tivemos que ir desligando um por um, aos pouquinhos, porque não dávamos conta de pagar tudo", lembra Julia. A saída do imóvel e o desligamento da equipe trouxeram para a dupla o sentimento de descaracterização do empreendimento, provocando a busca por uma nova trajetória. "Saindo daquela casa e sem a nossa equipe, que era muito querida, toda aquela atmosfera que não existia mais, não fazia mais sentido", explica Julia.
Para finalizar os pagamentos da equipe e de fornecedores, as duas alugaram um novo imóvel, dessa vez menor, e continuaram operando por delivery, enquanto se preparavam para a transição de um projeto para o outro. "Quando saímos da Miguel Tostes, as dívidas se acumularam de uma maneira que eu nunca tinha visto na minha vida. Alugamos o imóvel novo e ainda estávamos com as dívidas. Focamos em pagar as pessoas que trabalhavam conosco. A parte boa é que, ao invés de vendermos os móveis, a decoração e a cozinha em um ato de desespero, guardamos tudo. Ao surgir o imóvel novo, estávamos com tudo basicamente pronto. Fizemos questão de pegar um lugar que não precisaria de grandes reparos, e o que precisou foi feito pelo meu pai. Foi um momento que uniu a família. Nosso investimento foi praticamente zero, usamos o que já tínhamos", conta Julia.
Dessa forma, em março, as duas deram vida ao Café Angélica, na rua João Telles, n° 301. Diferente da primeira operação, o negócio agora não é exclusivamente vegano.
A mudança era um desejo de Julia, com o objetivo de se aproximar mais dos produtores locais e trabalhar com o conceito de sazonalidade, valorizando os ingredientes de cada estação. Por essa razão, elas definem o espaço como um local especializado em frutas e vegetais. "O carro-chefe no Estômago era a coxinha de jaca, o que era um grande conflito porque, por mais que vendesse horrores, jaca não é uma fruta que dá o ano inteiro, não é um fruto nativo. Sentia que íamos contra essa ideia de sazonalidade. Agora, desde que abrimos, quando faço o cardápio, vou para a tabela de sazonalidade, falo com os fornecedores, vejo o que eles têm. Ser especializado em frutas e vegetais é ter um cardápio baseado na sazonalidade, no que vou receber", contextualiza Julia, que é responsável pela cozinha do Angélica, enquanto Lidia fica responsável pela parte administrativa.
Operando por delivery e retirada, em função do momento da pandemia, o negócio, segunda Julia, funciona com um cardápio de confeitaria, com tortas doces e salgadas, pães de fermentação natural e torradas - sempre alterados semanalmente de acordo com a oferta de insumos.
"Trabalhamos com uma fazenda familiar, de amigos nossos, e eles só nos passam o excedente da produção. Ou seja, usamos um leite que sobra, que eles não têm o que fazer com isso porque é uma fazenda familiar, não tem outros clientes. Com os ovos é a mesma coisa. Estamos trabalhando muito pouco com esses produtos. Nosso cardápio é majoritariamente vegano, mas não temos mais esse compromisso em não usar insumos de origem animal", pontua a empreendedora.
Mirando também no conceito de sazonalidade, elas lançaram um clube experimental, com o objetivo de testar receitas e ingredientes. Na primeira edição, foram vendidas 50 assinaturas.
"No dia a dia do restaurante, muitas vezes, temos ideias muito criativas e interessantes, com algum ingrediente diferente, mas quando vai para o cardápio ninguém compra. A ideia do clube é justamente trazer itens que não são convencionais e trabalhar com parceiros locais. Os assinantes subsidiam esse teste", explica Julia, contanto que a ideia foi muito bem recebida pela clientela, que gosta do conceito de experimentar uma exclusividade.
O Café Angélica funciona de terça-feira a sábado, das 12h30min às 19h. Com tele-entrega própria, os pedidos, tanto para delivery como retirada, podem ser feitos pelo WhatsApp (51) 99769-1899.

Delivery de hambúrguer substitui atividades pausadas

Com um negócio recém-inaugurado em março de 2020, os produtores de festas, djs e sócios Gil Czarneski, 30, e Rafael Schutz, 40, tiveram de criar alternativas para seguir. O Cortex Bar, que fica no 4° Distrito, em Porto Alegre, era a nova aposta da dupla, que viu as portas se fecharem antes mesmo de cativar o público. Foi nesse contexto que surgiu a ideia de criar o Smashinho, delivery de hambúrgueres no formato smash, que são um pouco menores e prensados, com valores mais acessíveis e competitivos.
"Quando começamos a cogitar fazer um delivery, pensamos logo de cara em hambúrguer, mas descartamos porque achávamos que já estava saturado, com muita oferta. No entanto, conversamos sobre um hambúrguer bom e barato, com um preço médio de R$ 10,00, e a ideia nos empolgou", lembra Gil, explicando que, apesar dos preços mais baixos, o foco do produto é a qualidade. "Mesmo com uma margem de lucro menor, a ideia era construir um produto com bom custo benefício, na onda do 'low cost', sem abrir mão da qualidade", garante.
Presente nas plataformas de delivery, o Smashinho opera todos os dias, das 18h à 1h. Os hambúrgueres partem de R$ 14,90 e têm opções com uma, duas ou três carnes, além da versão vegetariana. "O estilo Smash Burger é basicamente quando a carne é esmagada na chapa, e o legal desse estilo é a crostinha que se forma com o queijo derretido. É um hambúrguer mais simples, geralmente a pessoa come dois ou mais, o que ajuda muito no volume de vendas", explica Gil, que é o responsável pela cozinha do negócio, enquanto  Rafael fica à frente da parte administrativa e faz as entregas. "A operação funciona no imóvel vizinho, que estava desativado, mas que tem acesso por dentro do nosso bar. No começo, conseguimos uma chapa emprestada para começar os testes e vender para os amigos. Na primeira semana, vendemos uma média de 50 Smashinhos por dia, o que nos motivou a levar ele mais a sério e investir numa chapa profissional", lembra o empreendedor.
Gil conta que a maior dificuldade para estruturar o negócio foi migrar para uma nova área de atuação e investir nessa ideia mesmo em um contexto adverso como o da pandemia. "O desafio foi acreditar de verdade no potencial de algo novo, ainda mais numa área que não é a nossa. Dá um pouco de receio, pois você tem uma reserva de dinheiro para segurar as contas, e se vê pensando em comprar um equipamento para delivery. Mas tem que acreditar. Nós acreditamos e estamos felizes com o feedback das pessoas. Quando voltar ao normal, o Smashinho vai somar forças com o bar, em operações separadas, mas juntas. Se o cliente estiver no Cortex, curtindo um drink, poderá pedir um Smashinho para comer na hora ou para viagem", revela Gil.
Com o bar fechado, no momento, em virtude da pandemia, os sócios estão dedicando seus esforços para a nova operação e pretendem, no futuro, dar ainda mais fôlego e autonomia para o Smashinho. "No início, era algo temporário, mas agora, com certeza, iremos continuar. O Smashinho ganhou vida própria. Ainda é cedo, mas como a operação é minimalista, pensamos em formatar um modelo de franquia, ou abrir outras unidades. Quem sabe?", projeta Gil. 

Com 21 anos de existência, Venezianos aposta em feira para sobreviver

O Venezianos Pub Café, ou o Venê, como é chamado pelos seus clientes, precisou apostar em uma nova frente de atuação para manter as portas abertas desde o início da pandemia. Operando há 21 anos da mesma maneira, hoje o local recebe os clientes de outra forma. No lugar das mesas e cadeiras do pub no bairro Cidade Baixa, está uma feirinha de artigos produzidos em parceria com outras empreendedoras. A iniciativa, conta Clarice Decker, sócia do espaço, foi uma alternativa para dar continuidade ao Venê. "A feirinha surgiu da necessidade de sobrevivermos na pandemia. A última noite que trabalhamos nos moldes dos 20 anos anteriores foi em 14 de março de 2020. Mesmo com as flexibilizações que chegaram a ocorrer, mantivemos a postura de não atendermos mesas dentro da casa. Assim, pensamos na feirinha como uma forma de comprarmos de produtores locais, principalmente mulheres, que também haviam sido afetadas, de alguma forma, com a pandemia", explica a empreendedora.
Na Feirinha do Venê, que funciona de terça-feira a sábado, das 16h às 20h, encontram-se produtos diversos. "De empanadas a panos de prato, de empadinhas a salame, de orgânicos a mel, de pizzas a brigadeiros, de queijo a rapadurinhas de leite, de bebidas requintadas (resquício do estoque do bar) à cachaça artesanal orgânica, de erva-mate às louças do restaurante que colocamos à venda porque não estão sendo usadas", detalha Clarice. Outra adaptação trazida pela pandemia foi o sistema de tele-entrega, que antes não fazia parte da rotina do restaurante. "Ainda não estamos em aplicativos de delivery, mas buscamos alternativas para entregar os produtos que oferecemos diretamente na casa das pessoas, para elas não precisarem sair."
Estar há mais de 20 anos de portas abertas torna o Venezianos parte da história dos clientes fiéis do espaço. Clarice afirma que esse laço afetivo entre o restaurante e os frequentadores foi fundamental para a manutenção do negócio, já que a clientela abraçou o novo modelo da operação. "O público do Venê não nos abandonou nunca. Aliás, sem os clientes do Venê, a casa não teria chegado até aqui, abril de 2021, um ano e um mês sem funcionar como bar e restaurante. Nesses 21 anos, muitas pessoas construíram histórias afetivas lindas no Venê. Precisávamos, mesmo que em outro formato, continuar contando histórias com elas. Hoje, clientes que comemoravam seus aniversários aqui, compram a Torta Zuzu - que oferecíamos para o parabéns - para comemorar em casa, isolados", conta Clarice.
Mesmo com a boa receptividade do novo modelo do negócio, o objetivo, para o futuro, é retomar o formato anterior, o que, segundo Clarice, é um desafio, pois exige jogo de cintura para conciliar uma operação possível e rentável no contexto atual com a manutenção da estrutura para a retomada no futuro. "O maior desafio é criar alternativas para sobreviver e conseguir manter uma estrutura de negócio para que, no dia que a vacina chegar para todos e a vida pulsar normalmente, o Venezianos possa voltar como espaço cultural, fazendo parte da história de Porto Alegre", pontua Clarice, que acredita que o grande legado desse momento para o futuro do negócio é entender que uma empresa não pode ser feita de clientes, e sim de pessoas que compartilham dos mesmos valores. "Mesmo de portas praticamente fechadas, continuamos acreditando nos nossos ideais. O Venezianos sobreviveu até aqui porque tem mais que clientes, tem uma legião de pessoas que, como ele, acredita nos mesmos ideais. É esta legião que está nos mantendo com esperança e nos dando força, dia após dia, para conseguirmos chegar até aqui", afirma Clarice.