Fase inicial dos negócios é decisiva

Como passar pelo primeiro ano de empreendedorismo


Fase inicial dos negócios é decisiva

Dar início a um negócio não é uma missão fácil. Quando o projeto está na rua, no entanto, surgem novas demandas e dificuldades que, se mal administradas, podem provocar o fim precoce dele.
Dar início a um negócio não é uma missão fácil. Quando o projeto está na rua, no entanto, surgem novas demandas e dificuldades que, se mal administradas, podem provocar o fim precoce dele.
Falta de planejamento, dificuldade na captação de clientes e custos fixos elevados são alguns dos aspectos que pesam na hora de manter a operação. Luciano Francisco, analista de relacionamento com clientes do Sebrae-RS, pontua que o principal motivo do encerramento das atividades de uma empresa, na maioria dos casos, é a falta de gestão de recursos adequada. Dados da entidade apontam que 7% dos negócios fecham nos dois primeiros anos de atividade por falta de lucro e 20%, por falta de capital.
"Cerca de 50% dos pequenos empresários do Brasil não sabem precisar se têm lucro ou prejuízo. Esses dados nos fazem constatar que as empresas fecham por falta de uma gestão adequada dos seus recursos. Percebo que os pequenos empreendedores têm uma grande carência de informações no que diz respeito aos critérios considerados fundamentais para uma boa gestão, a começar pelos conceitos básicos da administração, como ponto de equilíbrio, fluxo de caixa, capital de giro", destaca Luciano, definindo quatro pontos que todo empreendedor deve ficar atento. Veja:
» 1. Valide a ideia de negócio
Avaliar todos os pontos positivos e negativos do projeto antes de colocar a mão na massa é uma maneira de antever possíveis crises e dificuldades. Entenda o mercado em que deseja ingressar e procure o feedback do projeto com possíveis clientes. “É interessante ter uma ideia de todo o negócio. Existem ferramentas de design thinking, como o Canvas, em que é possível montar todo o conceito, desde público, produto, como se conectar com essas pessoas e estrutura de custos. O empreendedor consegue fazer essa modelagem rápida, em, no máximo, uma hora, com o apoio de Sebrae”, afirma Luciano.
» 2. Viabilize a questão financeira do negócio
Ter ciência do quanto é necessário investir no negócio e conseguir estimar o tempo de retorno desse montante é fundamental para saber se o empreendimento cabe no orçamento. Luciano pondera que os empreendedores, em alguns casos, não se aproximam de conceitos básicos de administração e, por isso, não conseguem mensurar o ponto de equilíbrio, o fluxo de caixa e o capital de giro. “A principal causa de erro de planejamento financeiro é a falta de domínio”, pondera Luciano.
» 3. Planeje o marketing e a gestão de pessoas
O especialista do Sebrae-RS ressalta que, antes de planejar ações de marketing, é preciso estruturar os processos de gestão. “Todo mundo está preocupado em vender mais, ter mais faturamento, mas poucos estão preocupados em vender bem para ter melhor resultado. Pensa-se muito em marketing, redes sociais, principalmente quem trabalha em aplicativos como iFood, UberEats, Rappi. Quem trabalha com competitividade de preço está tendo dificuldades, porque não tem os indicadores bem trabalhados. Muitas vezes, nem sabe se pode dar a promoção”, expõe Luciano, reiterando a importância do domínio de gestão. “Antes de pensar em marketing, jogar-se na internet, onde provavelmente vai vender muito e faturar um monte, procure saber se tem lucro e resultado”, conclui.
» 4. Pense com estratégia
Mesmo para empreendedores e empreendedoras que iniciaram seus negócios sem ter domínio dos indicadores administrativos, Luciano acredita ser importante parar e planejar os próximos passos. “Tem que sentar e determinar os objetivos e as metas. Não dá para ignorar o ambiente externo. Quem não estabelece uma rota, fica à deriva do mercado. Aconselho buscar ajuda de um profissional qualificado na área. A tendência dos empresários, quando têm uma ideia inovadora, é querer ficar sozinho, não compartilhar, mas é preciso trocar informações. O Sebrae está aqui para apoiar. Não pode desistir antes de tentar todas as alternativas. Muitas vezes, é o sonho da pessoa, não é só um negócio. Temos uma expertise para entender, validar o negócio para dar certo. Não desista e busque ajuda o quanto antes. Não espere chegar no ponto em que não tem mais volta, quando está devendo, vendendo bens. Se buscar ajuda no início, é mais fácil encontrar uma rota para navegar.”

A crença no poder do bairro ajuda a consolidar as vendas

Passar pelo primeiro ano e olhar de forma positiva para a etapa. Foi assim que Verediani Dias, 32 anos, encarou o último 26 de janeiro, quando completou um ano de empreendedorismo. À frente do Le Suisse Cafe com os sócios Allex Titton, 29, e Flaubert Pereira, 28, ela produzia doces em casa para pagar sua festa de formatura em Administração de Empresas. "Depois de formada, saí do emprego que eu estava e fiquei trabalhando em casa com doces. Percebia que a demanda estava crescendo, que não tinha mais como fazer sozinha. Meu noivo, o Allex, é o mais empreendedor dos três e ele me incentivava muito a abrir um negócio", conta. Para concretizar o projeto, o casal chamou um terceiro sócio, que supriu outra área.
"Nos juntamos com o Flaubert, que é primo do meu noivo e trabalha há oito anos com gastronomia. Unimos o útil ao agradável. Estávamos os três em um momento meio sem rumo e aí juntamos a ideia de abrir uma unidade física", explica Verediani. 
Operando na Gomes de Freitas, nº 122, no bairro Jardim Itu-Sabará, em Porto Alegre, o local foi planejado durante 11 meses pelos sócios. O prazo de estruturação foi uma consequência da escolha do ponto que abriga o negócio.
"É um bairro que tem bastante movimento, mas não tem nada nesse perfil. Queríamos esse ponto aqui, mas a loja estava ocupada. Ficamos esperando 11 meses até a loja desocupar. Acabamos ganhando tempo para estruturar o negócio", pontua Verediani.
Os sócios estimam que o investimento inicial de R$ 75 mil deve ser recuperado em dois anos de operação. O primeiro ano, para eles, foi positivo. "Sabemos a dificuldade do período e de abrir um negócio hoje em dia, mas foi muito bom. Foi um ano de muito crescimento e aprendizado. O retorno está sendo muito positivo. Ainda não estamos no patamar que desejamos, mas ver o pessoal voltando, indicando, e o negócio se pagando é muito motivador", expõe. Para Allex, a saúde financeira da operação nos meses iniciais foi uma surpresa. "Esperávamos muito mais dificuldade. Pensamos que tiraríamos dinheiro do próprio bolso e não aconteceu. Estamos sempre reinvestindo no negócio", afirma Allex. 
As tortas são o carro-chefe da cafeteria, e custam, em média, R$ 10,00 a fatia. Até julho do ano passado, quando contrataram a primeira funcionária, os sócios operaram sem nenhum colaborador.
"Nos dividimos: eu fiquei mais na parte de atendimento, estoque, o Flaubert, na cozinha e o Allex, no financeiro", comenta Verediani. Após o tempo de estruturação, os sócios desejam, agora, o crescimento da operação. "Até aqui, foi acúmulo de aprendizado e de organização. O segundo ano é para crescimento. A ideia é aumentar faturamento, quadro de funcionários, diversificar mais em produtos e serviços", revela Verediani.

Hamburgueria recém-aberta aposta em open de fritas

Estrear no universo do empreendedorismo não é uma tarefa fácil mesmo quando há planejamento. Quando a oportunidade do negócio próprio chega inesperadamente, a empreitada pode ser ainda mais desafiadora. Melissa Renz, 28 anos, e Solon Almeida, 24, sentiram na pele essas adversidades quando inauguraram, há três meses, a hamburgueria Food Lover, na avenida Érico Veríssimo, nº 472, em Porto Alegre. Mas eles apostam em um diferencial: open de batata frita.
Solon trabalhava há cinco anos com o pai em uma lancheria no mesmo bairro, e, quando o negócio encerrou as atividades, o casal se viu em uma situação profissional similar. "Sou jornalista e não encontrava nenhuma oportunidade na área, e o Solon ficou sem o emprego com o pai", conta Melissa, explicando que o término do negócio do sogro foi fundamental para que os dois iniciassem sua trajetória no empreendedorismo. "O pai dele tinha estrutura, mesas, equipamentos. Foi um incentivo para a gente", pontua. Em menos de um mês, e com investimento de R$ 11 mil, a dupla colocou o projeto em prática com a ajuda dos familiares. "O cunhado dele é empreiteiro, então deu toda a mão de obra para a reforma, só pagamos o material. Meu pai é eletricista, fez toda a parte elétrica", expõe Melissa.
A velocidade com que o negócio tomou forma foi motivo de preocupação no início da operação. Os sócios contam que, nas primeiras semanas, não sabiam como atrair clientes.
Além da divulgação por meio das redes sociais, a dupla apostou em fazer o open (consumo livre) das batatas para fidelizar a clientela. "No início, fiquei com bastante medo que acabassem as batatas, mas o Solon tem experiência e me garantiu que as pessoas uma hora paravam de comer e que dava sede. Ou seja, iam consumir mais bebidas. Fizemos um evento no Facebook, e as pessoas o encontraram. Veio muita gente que nunca vimos na vida. Foi uma loucura", lembra. O serviço, que acontece toda sexta-feira, custa R$ 15,00 e inclui batata frita com queijo cheddar, requeijão, bacon e calabresa.
O casal planeja recuperar o investimento inicial no primeiro ano da operação. Por isso, decidiu encorpar o faturamento oferecendo o serviço da hamburgueria para eventos. "Para o primeiro ano, o objetivo é consolidar a loja como um ponto do bairro, mas sabemos que, para alcançar algumas metas pessoais, precisamos fazer algo mais. Por isso, abrimos um buffet de festa", explica Solon.
Estreantes no empreendedorismo, eles avaliam de forma positiva os meses iniciais. "O fato de ser nosso, de ter todas as responsabilidades, é uma carga maior, mas traz mais satisfação quando os resultados chegam", afirma Solon.