O Projeto Meu Querer tem mudado a rotina de adolescentes mulheres que cumprem medida socioeducativa em Porto Alegre. Diferentemente dos outros deveres e programas oferecidos no Centro de Atendimento Socioeducativo Feminino (Casef), nesse projeto as socioeducandas podem escolher o que querem aprender.
A menina interessada em participar do projeto conversa com o agente socioeducador, em um encontro individual, para descobrir qual o seu querer. Depois, ela e o agente, que agora exerce função de mediador, estudam e trabalham esse querer juntos. “O facilitador não dá aula, apenas ajuda a mediar o aprendizado. Eu não preciso ter a habilidade ou conhecimento sobre o que ela quer aprender, eu só preciso saber como buscar essas informações para que nós possamos, juntas, construir esse conhecimento”, conta a agente responsável pelo projeto, Estela Junges.
Através de palestras com convidados especiais, aulas on-line em plataformas que oferecem cursos ou, ainda, aulas com professores voluntários, as meninas estão se propondo a aprender sobre temas como música, arte, feminismo, saúde do idoso, educação e, até mesmo, sobre a Lei Maria da Penha. “No início, imaginei que elas iriam querer fazer coisas que eu não teria perna para conseguir fazer”, conta Estela.
Mas elas escolheram coisas simples, como origami (uma dobradura de papel). “Elas escolheram atividades que fariam elas não verem o tempo passar, mas que iriam fazê-las felizes e mais acolhidas. Coisas que tornariam esse tempo em que elas estão privadas de liberdade mais saudável”, continua.
A agente aponta, ainda, que é notável que as meninas que estão há mais tempo na instituição escolhem quereres focados na construção do currículo, para quando voltarem para a sociedade. As recém-chegadas, porém, escolhem estudar temas que proporcionem lazer, como a arte.
“Tem uma adolescente que está aprendendo teclado. É super legal ela aprender as notas, mas isso é secundário. A grande sacada do projeto é a menina ter mais autonomia. É ela sair daqui capaz de buscar seus próprios desejos, sabendo que tem ferramentas para buscar o que ela quer para a vida dela”, explica. Atualmente, as 12 meninas da Casef participam do projeto.
Estela lembra de outra adolescente, que está aprendendo a pintar quadros e sobre o feminismo para produzir artes feministas. “O mais importante, para mim, é ela sair daquele encontro mais empoderada, mais dona de si. O grande produto não é o quadro, é ela. Quando abrirmos os cadeados, o produto vai estar nela e é isso que importa”, complementa Estela.
“Um alívio. Uma sensação boa. Uma terapia. Uma forma que achei de expressar meus sentimentos. Um jeito de me acalmar”, conta uma das adolescentes participantes do projeto. A jovem de 16 anos está aprendendo a desenhar e pintar. Para ela, a parte mais legal do projeto é ter experiências novas.
“Se qualquer pessoa parasse para fazer uma atividade que gosta, sem prestar atenção no tempo passando no relógio, também iria gostar. É difícil não gostar de algo que escolheu fazer”, defende Estela.
Além de ter a aprovação das adolescentes, o projeto também é positivo para os agentes. “Me sinto muito privilegiada de ter a oportunidade de, junto com elas, aprender novas habilidades e competências que extrapolam a Fase (Fundação de Atendimento Socioeducativo do Estado do Rio Grande do Sul). Hoje eu sou mais feliz com o meu trabalho e tenho mais autonomia para procurar os meus quereres.”