Os robôs de investimentos são plataformas que exercem, por meio de inteligência artificial, a atividade de consultoria para investidores em aplicações financeiras. No Brasil, empresas como Banco do Brasil e Warren já utilizam desse serviço, que segue em desenvolvimento. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) - entidade ligada ao Ministério da Economia - traz nas instruções 592/2017 e 558/2015 os deveres de um assessor de investimento, os quais são pautados sob uma ótica humana de transparência, diligência e lealdade. Diante de toda responsabilidade dada a esses mecanismos, surgem questionamentos sobre o preparo desses robôs no caso de situações atípicas como falhas, e até mesmo sobre a real culpabilidade das empresas que oferecem o serviço. Para debater o assunto, o Jornal da Lei entrevistou o advogado da área de Resolução de Conflitos, Yan Viegas Silva.
'É difícil percebermos um prejuízo resultante de falha', ressalta Yan Viegas Silva, advogado da área de Resolução de Conflitos
Jornal da Lei - Os robôs são suscetíveis à regulação vigente da CVM (Instruções 592/2017 e 558/2015) sobre deveres dos assessores de investimento?
Yan Viegas Silva - Os robôs são suscetíveis à regulação da CVM porque ela é a agência reguladora responsável pelas questões do mercado de capitais. Quanto a essas instruções específicas, que não são diretamente direcionadas para os robôs e sim para os assessores humanos, entendo que haveria de acontecer uma modulação delas para que sejam usadas em uma resolução mais adequada a esses casos envolvendo robôs de investimento.
JL - Encontramos algo a respeito desses robôs nas instruções 592/17 e 558/15?
Silva - As únicas coisas que encontramos e que abordam as questões de automatização são os artigos 16 e 16A. Eles basicamente falam que, embora as questões de assessoria de investimento sejam realizadas por algoritmo ou plataformas automatizadas, a responsabilidade ainda é do administrador, porém não estabelecem limites e responsabilidades claras para os robôs. Isto é, mesmo que, por exemplo, se aplique o dever de transparência previsto naquelas instruções, quais os requisitos objetivos que a plataforma pode aplicar para garantir que o investidor tenha a compreensão adequada daquelas orientações automatizadas?
JL - Como saber se uma pessoa foi prejudicada por conta de uma falha?
Silva - No mercado de capitais é muito difícil percebermos que certo prejuízo foi resultante de uma falha. Nesse caso, temos que olhar para o antes do ocorrido para realmente entendermos o que levou a isso. Por exemplo, um cliente faz consulta com determinada plataforma, ela sugere um portfólio de investimentos e garante certa rentabilidade em determinado tempo. Chegando no final de determinado tempo, o cliente acaba tendo prejuízo ou não ganha a rentabilidade antes garantida. Esse problema acabou sendo causado no começo do processo, por conta da falta de transparência da plataforma que não teve essa noção de prevenir o cliente de possíveis riscos. Outro caso é quando a plataforma, sem a autorização, acaba mudando o investimento do usuário, causando prejuízo ao mesmo. Havendo essa mudança, sem que o cliente tivesse o consentimento ou a devida ciência de que isso poderia acontecer, caracterizaria uma possível responsabilidade da empresa devido a um erro que levou a um prejuízo não esperado.
JL - Aplicar a legislação da Defesa do Consumidor pode ser uma saída?
Silva - Na ausência de uma norma mais concreta da CVM a respeito desses robôs, ler as instruções da CVM em conjunto com a legislação consumerista pode ajudar a se ter um conhecimento mais amplo a respeito disso.
JL - Quais os procedimentos que uma empresa que oferece esse tipo de serviço poderia seguir para se isentar da responsabilidade legal?
Silva - Como ainda não se tem uma resolução específica para esses casos, o que a plataforma deveria adotar para se proteger são as instruções 592/17 e 558/15 e usar como complemento as questões da relação de consumo, como adotar a máxima transparência nos procedimentos. A ideia é que essa transparência seja de uma forma que pessoas com expertise razoável ou moderada consigam entender o que está acontecendo com seus investimentos.
JL - Deve haver limites para a aplicação desta tecnologia?
Silva - É muito complicado de prever uma limitação a essas tecnologias porque estamos vivendo em pleno desenvolvimento tecnológico. Nesse momento, devemos buscar entender e aprender com essas ferramentas para que, no futuro, possamos chegar a uma possibilidade de limite. Essa tecnologia tem muito a se desenvolver aqui no Brasil.