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Jornal da Lei

- Publicada em 11 de Janeiro de 2021 às 20:17

Com legalização na Argentina, Brasil retoma debate sobre aborto

Gabriela acredita que vitória na Argentina é exemplo de luta

Gabriela acredita que vitória na Argentina é exemplo de luta


/CLAITON DORNELLES /JC
A legalização do aborto é um debate antigo no Brasil. Após dezenas de projetos de lei e de discussões a respeito, o assunto voltou à tona com a legalização da prática na Argentina, na última quinzena de dezembro. A decisão veio depois de anos de reivindicação de movimentos de mulheres argentinas - outros países da América Latina, como Cuba e Uruguai, já haviam legalizado. No Brasil, o caminho até essa resolução é polêmico. Nesta entrevista ao Jornal da Lei, a advogada especializada em advocacia para mulheres Gabriela Souza fala sobre o cenário desse debate jurídico e social.
A legalização do aborto é um debate antigo no Brasil. Após dezenas de projetos de lei e de discussões a respeito, o assunto voltou à tona com a legalização da prática na Argentina, na última quinzena de dezembro. A decisão veio depois de anos de reivindicação de movimentos de mulheres argentinas - outros países da América Latina, como Cuba e Uruguai, já haviam legalizado. No Brasil, o caminho até essa resolução é polêmico. Nesta entrevista ao Jornal da Lei, a advogada especializada em advocacia para mulheres Gabriela Souza fala sobre o cenário desse debate jurídico e social.
Jornal da Lei - Com a legalização do aborto na Argentina, como podemos olhar para esse assunto aqui no Brasil?
Gabriela Souza - A América Latina caminha sempre em bloco. A vitória das "hermanas" argentinas é de uma luta de décadas, as fotos mais emocionantes dessa vitória são das avós. E isso pode inspirar o Brasil a olhar para os seus vizinhos Chile, Argentina e Uruguai e entender que o estado laico não pode intervir no corpo da mulher. Aborto não é uma questão de religião. Essa é uma pauta feminista desde sempre. O Brasil precisa deixar de hipocrisia e dizer que não há aborto, milhares de mulheres abortam. A questão é que as mulheres ricas sobrevivem e as pobres morrem ou são presas. O debate do aborto precisa ser avaliado de forma interseccional, falando de gênero, raça e classe. As mulheres que mais morrem e que mais são encontradas pela polícia são as mulheres negras e as mulheres pobres. Precisamos falar de aborto no Brasil como política pública para que as mulheres se sintam seguras, confiem no sistema de saúde público e consigam ter o direito de decidir sobre os seus corpos.
JL - Como funciona o processo de penalizar uma mulher por abortar?
Gabriela - O aborto é um crime tipificado e a pena de detenção é de um a três anos para a gestante e um a quatro anos para o médico. Então se uma mulher entra em abortamento feito com um cabide, por exemplo, ao chegar no hospital para socorro, muitos médicos reportam à polícia e, não raramente, essas mulheres são conduzidas à delegacia após a saída do hospital. E essas mulheres normalmente são as mulheres pobres, mulheres negras e mulheres que não têm condições financeiras de um aborto seguro, que acontece muito.
JL - O aborto é permitido apenas em algumas situações, como no caso de risco à gestante ou de estupro. Ainda assim, é comum que haja uma comoção contra essa alternativa. Por que o aborto ainda é visto dessa forma?
Gabriela - Há também um equívoco muito grande de achar que as mulheres vão gostar de abortar. Um aborto vai continuar sendo uma questão séria, um impacto na vida da mulher. Mas é algo que cabe somente a ela. Depois disso tem toda uma repercussão da maternidade solo, da falta de saúde, assistência e educação. Temos o exemplo do Uruguai, onde o aborto é legal, e quando a mulher vai no serviço de saúde público ela é convidada a conhecer o sistema de serviço social do país e passa uma semana pensando para depois marcar o procedimento. Nesse período, muitas desistem porque se sentem seguras.
JL - O caminho para a legalização do aborto no Brasil ainda é longo?
Gabriela - Ainda tem uma luta muito grande pela frente. Precisamos começar a pensar antes de eleger deputados e governantes porque eles têm competência legislativa para modificar essa criminalização. Não vai ser fácil legalizar o aborto no Brasil. Tem vários projetos de lei positivos sobre o assunto, mas também tem projetos ruins, que querem criminalizar o aborto até em casos de estupro. Então temos que estar atentos aos nossos direitos. A legalização do aborto passa por uma mudança política e uma articulação nossa enquanto sociedade.
JL - E como os operadores de direito podem ajudar?
Gabriela - Precisamos começar a estudar os direitos das mulheres. O Judiciário não pode mais ser omisso ao enfrentar uma questão envolvendo direito das mulheres. Quando se discute o aborto, tem que entender a situação de forma macro e não romantizada. Tem que entender o que significa a descriminalização aborto e o que significa para uma mulher ter que seguir com uma gestação que não deseja. Nós devemos estudar muito e conhecer a sociedade como ela é, entendendo o que acontece de fato como operadores do Direito. Não devemos ficar só em cima dos livros, devemos ir à campo, conversar com mulheres, ouví-las e levar essas questões para o Judiciário. A magistratura e o Ministério Público também têm que entender essas questões sob a perspectiva de um novo pensamento jurídico, que observe o direito das mulheres.
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