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Jornal da Lei

- Publicada em 02 de Março de 2020 às 19:05

Falta tipificação para assédio no Código Penal

Códigos Penal e de Processo Penal são documentos da década de 1940

Códigos Penal e de Processo Penal são documentos da década de 1940


/ANTONIO PAZ/arquivo/JC
Em Viamão, na Região Metropolitana de Porto Alegre, uma corrida de Uber gerou uma onda de indignação nacional. A passageira, uma adolescente de 17 anos, sofreu assédio do motorista, gravou e postou nas redes sociais. O caso teve grande repercussão por causa da seriedade da situação, mas, no âmbito jurídico, levantou a discussão quanto à falta de tipificação, tendo em vista que o motorista foi indiciado por perturbação da tranquilidade, uma contravenção penal. O Código Penal e o Código Processual Penal são documentos da década de 1940 e, embora já tenham sido alterados desde então, precisam passar por atualizações.
Em Viamão, na Região Metropolitana de Porto Alegre, uma corrida de Uber gerou uma onda de indignação nacional. A passageira, uma adolescente de 17 anos, sofreu assédio do motorista, gravou e postou nas redes sociais. O caso teve grande repercussão por causa da seriedade da situação, mas, no âmbito jurídico, levantou a discussão quanto à falta de tipificação, tendo em vista que o motorista foi indiciado por perturbação da tranquilidade, uma contravenção penal. O Código Penal e o Código Processual Penal são documentos da década de 1940 e, embora já tenham sido alterados desde então, precisam passar por atualizações.
Nesse âmbito, o Código Penal conta com três artigos: estupro, importunação sexual e assédio. O primeiro, enquadrado como crime hediondo pelo artigo 213, refere-se ao constrangimento mediante violência ou ameaça grave para obter conjunção carnal.
O segundo é sobre a prática de atos libidinosos sem a anuência da vítima, envolvendo contato físico. O último se assemelha muito à importunação sexual, exceto por dois adicionais: não precisa haver contato físico e deve acontecer dentro de uma relação de hierarquia. Todos contam com pena de reclusão, podendo chegar a 30 anos.
A perturbação da tranquilidade, contravenção penal criada para resolver brigas de vizinhos, por exemplo, é prisão simples de 15 dias a dois meses ou multa. "Temos que fazer equilibrismo para advogar, tentando colocar de um jeito ou de outro. É um desafio grande e acaba ficando difícil trabalhar em algumas situações", afirma Gabriela Souza, advogada especializada em atendimento de mulheres. Apesar da dificuldade, ela reconhece que o Direito avançou nos últimos anos.
Segundo o advogado especialista em Direito Penal e Direito das Relações Sociais Leonardo Pantaleão, a tendência do legislador é alcançar o maior número de condutas. "Mas nunca será o suficiente para prever toda e qualquer situação da sociedade", contrapõe.
Para o professor de Direito Penal e Processo Penal da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul Marcelo Peruchin, esse caso pode movimentar a Câmara dos Deputados caso continue tendo forte repercussão. "Sempre que existe lesão a um valor que não está protegido no sistema, é o momento de pensar na proteção. Agora, as pessoas tiveram noção de que o assédio contra menor, sem violência, grave ameaça ou contato direto, não tem proteção."
O professor defende que o Código Penal é a fotografia de uma época e é natural - inclusive, esperado - que envelheça. "Já está passando da hora de o Brasil revisar o seu Código Penal contemplando os novos valores", defende Peruchin.
Os valores de 1940 não são os mesmos presentes na sociedade de 2020. Gabriela lembra que, até pouco tempo, o Código Penal não permitia o divórcio e apresentava termos como "mulher honesta".
"Há lacunas que precisam ser preenchidas. Nesse caso, acredito que há espaço na legislação para criminalizar o assédio contra menor de idade, independentemente do sexo da vítima", argumenta Peruchin.
Já para a presidente da Associação do Ministério Público do Rio Grande do Sul, Martha Silva Beltrame, a lacuna principal é na aplicação das leis já existentes. "Junto com a criminalização e a modernização das legislações, temos que trabalhar a prevenção e a efetividade das punições. A Lei Maria da Penha, uma das três melhores leis do mundo, garante, além de todos esses requisitos, as medidas protetivas. É importante trabalhar nisso."
Ainda que o especialista em Direito Processual Penal e presidente do Movimento do Ministério Público Democrático, Ricardo Prado, acredite que uma atualização seja uma boa ideia, ele atenta para que isso aconteça com a participação de debate e com o objetivo de obter certo consenso. "O Parlamento simplificou a forma de fazer legislação e, hoje, tem leis que não vão mais a debate no plenário. Isso é ruim para a sociedade, mesmo que o consenso seja algo difícil de ser produzido."
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