Ao defender um "posicionamento técnico" sobre a adoção da cloroquina no combate ao novo coronavírus, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, fez, nesta quarta-feira (8), uma clara defesa política do governo Jair Bolsonaro (sem partido) sobre o assunto. O ministro também rebateu o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), e disse que "não existe ninguém que é o dono da verdade".
Mandetta não poupou críticas ao posicionamento de Doria, que hoje defendeu o epidemiologista e coordenador do Centro de Contenção do vírus em São Paulo, David Uip, alvo de pressão de Bolsonaro para que revelasse se fez uso da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19, da qual se curou.
"Não existe ninguém que é o dono da verdade. Não existe Estado que possa falar que é melhor que o outro. Hoje esse medicamento não tem paternidade. Não tem que politizar esse assunto", disse Mandetta, referindo-se diretamente ao governo de São Paulo.
Como não fazia há muito tempo, Mandetta fez questão de citar o nome de Bolsonaro em sua defesa do governo. "Para todos aqueles com ânimos mais exaltados, aqui está tudo bem", disse o ministro. "Essa estrada vai ter dias muito duros. Quem comanda esse time é o presidente Jair Messias Bolsonaro", acrescentou, mencionando o nome completo do presidente da República.
Na tentativa de tentar afastar de vez o clima ruim com o presidente, Mandetta disse ainda que Bolsonaro "em nenhum momento fez qualquer movimento de imposição" em relação à adoção da cloroquina no tratamento das pessoas. Bolsonaro defende o medicamento, disse Mandetta, mas também "sabe que precisamos que os conselhos de medicina avaliem esse uso."
A polêmica em torno da cloroquina diz respeito a quem deve tomar o remédio, e em qual momento. O Ministério da Saúde tem defendido desde o início que se trata de uma substância que ainda não foi devidamente testada, com contraindicações sérias e que deve ser ministrada apenas pelo médico, em casos graves ou críticos de pacientes com Covid-19.
Bolsonaro, porém, sempre defendeu o medicamento usado no combate à malária como um tipo de "cura" do coronavírus, e que deve ter seu uso massificado a toda a população. Os primeiros testes com paciente com sintomas leves da doença, porém, sequer tiverem início.
Na manhã desta quarta-feira, Bolsonaro recorreu às redes sociais para dizer que "dois renomados médicos" recuperados da doença se recusaram a divulgar se usaram a hidroxicloroquina durante o tratamento, referindo-se a David Uip e ao cardiologista Alexandre Kalil, que pouco depois disse que usou o medicamento.
A postura do presidente motivou ataques virtuais de apoiadores de Bolsonaro aos dois médicos, em especial à Uip, por sua ligação com o governo de São Paulo, comandado por Doria, que protagoniza atritos com o chefe do Planalto durante a crise do coronavírus.
David Uip reagiu e, em entrevista coletiva, pediu ao presidente que ele respeitasse seu direito enquanto paciente de não revelar o que usou durante seu tratamento, afirmando que respeitou Bolsonaro quando ele preferiu não mostrar os resultados de seus exames para Covid-19. O médico disse ainda que os ataques que recebeu serão levados à Justiça. "Tomarei providências legais por essa invasão à minha privacidade e à dos meus pacientes", disse o infectologista, ao afirmar que a privacidade de sua clínica particular também foi agredida.
Uip ainda lembrou que, durante reunião com o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, foi ele quem recomendou ao governo que autorizasse o uso da hidroxicloroquina para pacientes internados com Covid-19, mas sempre sob receita médica e autorização formal do paciente. A recomendação foi acatada pelo Ministério.
João Doria também reagiu, com repúdio ao "gabinete do ódio em Brasília" e seus ataques aos médicos, técnicos e autoridades da saúde "Nós precisamos de paz e não de confronto. Que País é esse onde o confronto através das redes sociais é feito para destruir as pessoas e a reputação?", disse o governador.
Durante entrevista no Palácio dos Bandeirantes, Doria ainda voltou a fazer referência ao presidente Jair Bolsonaro. "Não foi nenhum médico no Brasil que disse, por várias vezes, que a gravíssima crise do coronavírus era uma gripezinha ou um resfriadinho", disse o governador. "Portanto, respeito com os médicos do Brasil", disse.