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Agricultura

- Publicada em 19 de Agosto de 2021 às 21:39

Cerveja artesanal incentiva a produção de lúpulo no RS

País importa quase a totalidade do volume utilizado pela indústria

País importa quase a totalidade do volume utilizado pela indústria


/Lúpulo Gaúcho/Divulgação/JC
Nos últimos anos, um fenômeno passou a se destacar no mercado cervejeiro: os produtos artesanais. De sabores e aromas variados, eles chegaram para dar mais variedade a um rol de alternativas que contava, basicamente, apenas com produtos de grandes marcas ou rótulos caros e importados. A proposta de diversidade agradou aos paladares e, literalmente, caiu no gosto dos clientes.
Nos últimos anos, um fenômeno passou a se destacar no mercado cervejeiro: os produtos artesanais. De sabores e aromas variados, eles chegaram para dar mais variedade a um rol de alternativas que contava, basicamente, apenas com produtos de grandes marcas ou rótulos caros e importados. A proposta de diversidade agradou aos paladares e, literalmente, caiu no gosto dos clientes.
Em todo o Brasil, a curva de novas cervejarias vem em uma crescente nos últimos 10 anos e o Rio Grande do Sul desponta como um dos expoentes, com 258 marcas registradas no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), de acordo com o Anuário da Cerveja de 2020. O Estado fica atrás apenas de São Paulo, com 285 estabelecimentos. Quando observadas as capitais, no entanto, Porto Alegre é líder. Em três anos, dobrou o número de fabricantes da bebida, chegando a 40 cervejarias registradas em 2020.
O crescimento do mercado tem trazido reflexos na cadeia produtiva como um todo. Enquanto os brewpubs, bares que produzem e comercializam a sua própria cerveja e, por isso, tem custos menores que o de uma indústria tradicional, acenam ao cliente final como um possível e mais viável futuro do segmento, na outra ponta, a agricultura também ensaia um processo de diversificação para atender ao fornecimento de insumos demandados pelo mercado. Isso porque o Brasil ainda não é autossuficiente no que tange os dois principais ingredientes da bebida, o lúpulo e a cevada.
Atualmente, segundo o presidente da Associação Gaúcha das Microcervejarias (AGM) e CEO da Salva Craft Beer, João Giovanella, o País possui uma produção relativamente grande de cevada, mas importa praticamente a totalidade do lúpulo utilizado na fabricação da bebida. "Ainda não temos uma cadeia com fornecimento de lúpulo nacional. Os distribuidores de cerveja ainda não podem trabalhar com lúpulo plantado aqui porque estão atrelados a contratos com produtores de fora, em negócios que são bilionários. Então, há um mercado no Brasil que é um mar azul e não tem ninguém nadando. Estamos começando a criar esse elo da cadeia. É embrionário, mas promissor", aponta.
A cultura nacional do lúpulo é, de fato, embrionária. Não há sequer dados oficiais que apontem a dimensão do que tem origem em solo brasileiro. Apenas no ano de 2018, um grupo de produtores se juntou e formou a Associação Brasileira de Produtores de Lúpulo (Aprolúpulo), que visa organizar e concentrar informações sobre o assunto.

Falta de estrutura e experiência são os principais desafios da cultura

Um dos responsáveis por capitanear a iniciativa da Aprolúpulo foi Natanael Moschen, de Gramado, proprietário da Lúpulo Gaúcho. Admirador de cervejas, ele produzia a própria bebida por hobby e acabou se interessando pelo lúpulo durante o processo. Hoje, tem em torno de meio hectare plantado e um viveiro de mudas, que comercializa para interessados em dar início ao cultivo. "Eu não tinha ligação com a agricultura e, agora, vivo do lúpulo. São, em média, 2,5 mil plantas. É uma área pequena e a propriedade em que cultivo não tem um relevo adequado para o plantio. Então, parte do que é obtido fica para produção da cerveja feita por mim e o resto é vendido, sobretudo para pequenas indústrias e quem faz fabricação caseira. Mas o meu principal negócio é o viveiro das mudas", explica. Moschen também entende que há um caminho pela frente, de modo que se possa visualizar o lúpulo como uma alternativa de negócio mais sólida. Isso porque é de produtores como ele que essa cultura ganhará uma base para se estabelecer no Brasil. "Mesmo com pouca área, sempre procurei testar diversos formatos de plantio, para ir entendendo cada um deles. Agora, estou adaptando a estrutura da plantação à treliça alta, porque eu construí uma peladora, que ajuda na colheita, na separação e dá mais rendimento. Então, só é possível processar o que é plantado com essa máquina que eu mesmo construí", conta.
A falta de conhecimento e experiência prática em relação à cultura do lúpulo é um dos principais desafios de produtores que estão iniciando esse movimento. Mesmo havendo um grande mercado cervejeiro, a busca pelo profissionalismo cabe inteiramente ao agricultor. "Entre as dificuldades, as principais são a falta de mão de obra, porque o plantio e a colheita são processos bem complexos. Também a falta de maquinário, que eu mesmo tive que construir, no meu caso. Há alguns lugares no País que vendem, mas é tudo muito caro. E, aqui na região, pelo menos, não contamos com nenhum incentivo direto das cervejarias", afirma Moschen.
Questões semelhantes são encaradas pelo cervejeiro Fábio Mezzomo, de Serafina Corrêa, que também cultiva em torno de meio hectare de lúpulo. No caso dele, que começou há apenas dois anos, o que é obtido no plantio é usado para testes, produção própria da bebida e, eventualmente, vendido para pequenos fabricantes de cerveja. "A planta, em si, tem um tempo de maturidade. Ela atinge melhor qualidade a partir do terceiro ano. Então, para mim, ainda não é muito rentável. De qualquer modo, o que dá para perceber é que há uma restrição do mercado cervejeiro ao lúpulo nacional. Para ser utilizado, ele precisa de processamento, então, temos que nos adaptar para entregar o que o mercado demanda."

Projeto do governo deve apontar rumos para o cultivo no Estado

Objetivo é fomentar cultivo para abastecer microcervejarias

Objetivo é fomentar cultivo para abastecer microcervejarias


/Maria Ana Krack/PMPA/JC
A perspectiva de uma solidificação na cultura do lúpulo é uma esperança para produtores como Mezzomo, a partir de um projeto iniciado pelo governo do Estado para estudar o tema. "Acho legal o Estado se preocupar em entender essa cultura, porque significa que ela é promissora, e, de certa forma, apoia o nosso trabalho. Passamos por uma análise da terra e da qualidade do lúpulo plantado. É um início para eles e para a gente também, uma troca de ideias importante", diz.
Segundo o pesquisador da Secretaria da Agricultura, Pecuária e Desenvolvimento Rural (Seapdr) Alexander Cenci, o crescimento da fabricação de cervejas caseiras e artesanais foi o que motivou o interesse pela cultura do lúpulo e estimulou o governo a buscar mais informações. "Formamos uma equipe para elaborar esse projeto-piloto, que durou um ano e vai ser encerrado neste mês. Nele, exploramos três regiões do Rio Grande do Sul. A da Serra, os Campos de Cima da Serra e a das Hortências. Foram nove produtores e com os dados pudemos perceber o cenário e, bem claramente, o potencial que há para expansão dessa cultura", afirma.
Uma das constatações da pesquisa é que as regiões dos Campos de Cima da Serra e das Hortênsias concentram o maior número de produtores e também têm bastante potencial para o plantio em razão do clima. De acordo com Cenci, as condições de temperatura são semelhantes às de regiões no exterior em que o lúpulo também é cultivado. "É importante destacar que essas duas zonas lembram os locais de fora em que se produz mais, mas não limita as demais localidades. E o fato é que o lúpulo passou a ser produzido em todo o Brasil e pode ser produzido em qualquer região, tanto frias como quentes. Há um potencial diverso", destaca. O cenário favorável colabora para o pesquisador acreditar que o Estado deve observar, no futuro, o nascimento de uma região com características semelhantes à do vinho. "Vejo como uma tendência chegarmos a um momento em que teremos um terroir da cerveja, assim como existe o da uva. Isso tende a acontecer, e o lúpulo produzido aqui será determinante para definição do sabor da bebida que será produzida", prevê Cenci.