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Previdência

- Publicada em 27 de Novembro de 2020 às 03:00

Reformas devem ser priorizadas, defendem analistas

Pessôa afirma que crise levou a esgotamento de contrato social

Pessôa afirma que crise levou a esgotamento de contrato social


MOGLIA/DIVULGAÇÃO/JC
As perspectivas do cenário político brasileiro para 2021 e os caminhos para a recuperação econômica foram os temas do segundo dia do Connect Caminhos para o Futuro e do 22º Seminário Econômico da Fundação Família Previdência.
As perspectivas do cenário político brasileiro para 2021 e os caminhos para a recuperação econômica foram os temas do segundo dia do Connect Caminhos para o Futuro e do 22º Seminário Econômico da Fundação Família Previdência.
Segundo o mestre em Ciência Política Silvio Cascione, que abriu o evento, o governo deve priorizar as reformas planejadas já desde antes da pandemia. "A pressão do mercado é o que gera a urgência no governo e também no Congresso para tomar medidas impopulares", afirma. "O ambiente global está mais calmo hoje, depois das eleições dos Estados Unidos em um governo dividido, a vacina chegando, o ambiente está mais favorável para países com o Brasil".
Cascione, que é analista político da consultoria Eurasia, acredita que é baixo o risco de uma guinada populista que traga uma nova matriz econômica, ou que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o Congresso Nacional deixem de lado a política do teto de gastos e estimulem um aumento no gasto público. "A dúvida é se haverá flexibilidade na política fiscal para poder permitir mais gastos ano que vem, mas aprovar reforma pra trazer confiança dos investidores", diz. O que ele ressalta é que a aprovação das reformas estruturais do Estado vão depender do comprometimento do próprio Bolsonaro em defender as propostas.
Ele destacou a eleição para presidente da Câmara, a qual o atual presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ), depois de quase três anos e meio na titularidade do cargo, não pode concorrer. Cascione explicou que há uma briga dentro do Centro político, entre uma facção que deseja se aliar ao governo, capitaneada pelo deputado Arthur Lira (PP-AL), e a facção de Maia, que já se articula pensando em um projeto alternativo para 2022. "Se o Lira é Presidente da Câmara, o governo dita a pauta. Se for aliado do Maia, eles tem agenda própria, convergentes em muitos casos, mas independente", explica.
Um dos pontos que o cientista político destaca é a autonomia do Banco Central, que deve ser aprovada pela Câmara, e que ele acredita que vai gerar mais previsibilidade dos juros a longo prazo. Cascione é mais cético em relação à privatização da Eletrobras e de outras empresas públicas, que segundo seus cálculos de previsão tem uma probabilidade de 45% de ocorrer. Dentre as variáveis para a aprovação das medidas econômicas estão a popularidade do presidente e a demora no tempo de tramitação e aprovação. Cascione usa como exemplo o governo de Michel Temer (MDB), que mesmo impopular conseguiu organizar a coalizão mais ampla da República Moderna e ter uma agenda política funcional no Congresso - até 2017, quando denúncias de corrupção contra Temer acabaram derrubando mais ainda sua popularidade. "Para (os parlamentares) ficarem ao lado de um presidente impopular, vão precisar de outros recursos para ser populares localmente", diz.

Para especialistas, desancoragem pode aumentar desigualdade e inflação

A retomada da confiança externa no Brasil é parte necessária para a recuperação econômica, de acordo com os dois economistas consagrados que participaram do painel. Segundo Samuel Pessôa, doutor em Economia e pesquisador da FGV-Rio, a crise político-econômica enfrentada pelo Brasil é resultado de dois fenômenos. Um deles seria o intervencionismo econômico praticado entre 2006 e 2014, que resultou em acúmulo de capital e investimentos ruins.
Ele cita como exemplo prejuízos para o setor sucroalcooleiro por conta dos investimentos em gasolina, junto com sobreinvestimento no setor automobilístico. O outro é a crise fiscal, que o economista chama de "esgotamento do contrato social da redemocratização" - esse contrato oriundo do desejo da sociedade de construir no Brasil um Estado de bem-estar social no padrão europeu continental. "Este segundo elemento da crise, o esgotamento desse contrato está com a gente até hoje", aponta Pessôa. Posteriormente à remoção do PT do poder em 2016, o crescimento de pouco mais de 1% do PIB é motivado por um setor produtivo que segue danificado pelas incertezas dos problemas fiscais. Para o futuro, ele acredita que há dois caminhos, a reancoragem ou desancoragem da política fiscal. "Se a opção for em reancorar a política fiscal, o câmbio volta a patamares anteriores e se alivia o processo inflacionário. No caso de desancoragem, pode haver a quebra do teto de gastos sem contrapartida, o que provocaria descontrole do câmbio e aumento da inflação. Mas, mesmo neste cenário pior, não vejo inflação explodindo, não vejo ruptura", argumenta.
O evento encerrou com a participação do economista Maílson da Nóbrega, que atuou como ministro da Fazenda do governo José Sarney (MDB) entre os anos de 1988 e 1990. Para o ex-ministro, em caso de desancoragem, uma alta na relação entre dívida e PIB pode alimentar os temores de insustentabilidade e levar a um aumento da inflação e queda da confiança. "Não acredito que o governo proponha o fim do teto, seria um suicídio político, mas, mesmo que isso venha a ocorrer, a economia brasileira tem capacidade de resistir", argumenta.
Maílson afirmou que não há sinais que a democracia esteja sob risco no País. Segundo ele, nos últimos 35 anos o Brasil vive o maior período de estabilidade política de sua história desde a República Nova (1945-1964), contando com um judiciário independente e investigações autônomas de corrupção, "uma das conquistas do período pós-regime militar", e uma imprensa que ele define como "livre, independente, competitiva e agressiva. A imprensa brasileira tem qualidade e independência que não deixa a ver a de países ricos".