As mulheres já são a maioria na Medicina Veterinária em território gaúcho e agora dominam 100% da diretoria do Conselho Regional de Medicina Veterinária do Rio Grande do Sul (CRMV-RS). O fato é inédito na autarquia, que também abrange os profissionais de Zootecnia, no Estado e começa a dar o tom da ação das dirigentes. A presidente Lisandra Dornelles, empossada na última quinta-feira (6) com a zootecnista Angélica Pinho (vice-presidente) e as médicas veterinárias Marianne Lamberts (secretária-geral) e Eliane Goepfert (tesoureira), aponta que a direção já começa a agir para barrar a proliferação de cursos a distância e ampliar a presença dos profissionais em áreas ainda restritas, como a rede de saúde pública voltada à população.
Jornal do Comércio - A senhora foi eleita na eleição com maior participação na história do CRMV-RS - qual é o peso disso na gestão?
Lisandra Dornelles - Na verdade, fico bastante emocionada, foi tudo muito novo nesta eleição. Teve o segundo turno, teve a votação pela internet, além da questão da nossa chapa ter uma diretoria toda feminina. É bem emocionante para nós. Recebi um áudio de um colega veterinário emocionado por sermos quatro mulheres, e acho que ele definiu bem a nossa função daqui para frente. Ele disse que o conselho seria como um filho e que, nós mulheres, seríamos ao mesmo tempo doces e firmes, e o CRMV-RS estava em um momento que precisava ser acolhido.
JC - Que temas serão prioritários?
Lisandra - Primeiro serão as faculdades com ensino a distância na saúde, que é inviável. Não tem como formar um bom profissional com ensino a distância nesta área. Nossa ideia é conversar com presidentes dos conselhos dos outros estados e o Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV), e os órgãos que representam outras profissões da saúde para pressionar o MEC contra a disseminação de cursos EAD. Tem a questão da saúde pública também, queremos aumentar a nossa participação no SUS. O ideal é que cada unidade de saúde contasse com um médico veterinário, para lidar com a questão das zoonoses, que são doenças transmitidas de animais para humanos e vice e versa. Precisa ter profissionais mais habilitados para lidar com isso. O médico veterinário e o zootecnista também são importantes desde o início da cadeia produtiva até o consumidor. Todos os alimentos de origem animal têm um veterinário por trás e muita gente não sabe disso. Daí fica aquela imagem de que os veterinários são doutores só de “cachorrinho”, só de “bichinho”, e vai muito além e a população não sabe.
JC - Como farão para barrar a ampliação do EAD?
Lisandra - Não vai ser fácil, a luta vai ser grande. Já conversamos com o presidente do CFMV, que está nos apoiando. Se a pressão for mesmo grande, além de todos os conselhos estaduais, mais os conselhos das outras áreas da saúde, não vai ter como o MEC manter a decisão, eles vão ter de recuar.
JC - Como está o mercado de trabalho para veterinários e zootecnistas e as perspectivas?
Lisandra - Há muito a ser explorado. Em algumas áreas como a de inspeção, têm profissionais de outras áreas ocupando um lugar que teoricamente deveria ser nosso. Acho que a profissão tem de se fortalecer, as duas, de Zootecnia e Veterinária, para que os profissionais ocupem os postos de trabalho. Tem muito lugar que precisaria de um veterinário e não tem. Profissionais de Nutrição, Engenharia de Alimentos e Agronomia acabam atuando em locais em que seria ideal ter um veterinário ou um zootecnista.
JC - Quais são as primeiras medidas na entidade?
Lisandra - Já começamos a contactar os coordenadores de cursos universitários de Medicina Veterinária e Zootecnia e conselhos das outras profissões da área da saúde para tomar uma ação junto ao MEC para que primeiro pare a abertura de cursos e queremos que os de EAD que foram liberados sejam revogados. Já temos muitas faculdades presenciais e ainda liberam mais a distância. A questão é que formam um monte de profissionais sem qualificação, uma mão de obra que não irá se adaptar ao mercado de trabalho porque não têm condições. Isso é ruim para todo mundo.
JC - O grupo assume após a atuação de uma junta governativa, nomeada com a intervenção do CFMV. O que levou à intervenção?
Lisandra - Na verdade, a gente não sabe bem ao certo, está sendo feito uma auditoria. Agora vamos tomar conhecimento do que realmente aconteceu.
JC - Um dos temas que gerou a crise na entidade foi a terceirização de fiscais nos abates no Estado. Como vocês vão agir neste tema?
Lisandra - Em princípio, somos contra essa terceirização. Agora que é lei cabe ao conselho fiscalizar fortemente o serviço e dar apoio ao profissional que vai trabalhar na área porque a pressão das indústrias e do comércio já existia antes quando eles eram funcionários públicos. A tendência é que a pressão aumente por interesse financeiro. Ninguém vai querer descartar mercadoria, mas não podemos colocar os interesses financeiros do mercado acima da saúde da população.