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Cultura

- Publicada em 08 de Janeiro de 2020 às 03:00

Peça 'O jantar com a Senhora Beckett' entra em cartaz na Casa Godoy

Encenação parte da imagem enigmática de uma mulher encobrindo seu rosto com um prato

Encenação parte da imagem enigmática de uma mulher encobrindo seu rosto com um prato


Foto de Claudio Etges e arte de Liege Grandi/Divulgação/jc
Daniel Sanes
O texto nas redes sociais é enigmático. "Em breve a cidade receberá convite e poderá conhecer essa senhora, de quem não se conhece o rosto e se sabe apenas o sobrenome: Beckett. Ela prepara o jantar para aguardar seus convidados. Quando esse dia chegar, é provável que abra a janela da casa para espiar. Mas desde já seu tempo é o da espera", diz um trecho. A imagem, de uma mulher segurando um prato de forma a cobrir-lhe o rosto, torna a coisa toda ainda mais misteriosa. Sabemos que se trata de um espetáculo teatral, chamado O jantar com a Senhora Beckett. Mas não muito mais que isso. Quem seria ela? Teria alguma ligação, mesmo que espiritual, com o influente dramaturgo e escritor irlandês Samuel Beckett?
O texto nas redes sociais é enigmático. "Em breve a cidade receberá convite e poderá conhecer essa senhora, de quem não se conhece o rosto e se sabe apenas o sobrenome: Beckett. Ela prepara o jantar para aguardar seus convidados. Quando esse dia chegar, é provável que abra a janela da casa para espiar. Mas desde já seu tempo é o da espera", diz um trecho. A imagem, de uma mulher segurando um prato de forma a cobrir-lhe o rosto, torna a coisa toda ainda mais misteriosa. Sabemos que se trata de um espetáculo teatral, chamado O jantar com a Senhora Beckett. Mas não muito mais que isso. Quem seria ela? Teria alguma ligação, mesmo que espiritual, com o influente dramaturgo e escritor irlandês Samuel Beckett?
Não se trata de uma simples estratégia publicitária, mas uma forma de instigar o público. Afinal, a peça de Naiara Harry Companhia Teatral, que entra em cartaz nesta quinta-feira (9), às 20h, na Casa Godoy (Independência, 456), tem apenas oito sessões previstas, cada uma delas para 16 pessoas. A entrada é gratuita, com retirada de senhas meia hora antes do espetáculo.
Em um ambiente intimista como esse, a intenção é fazer com que os espectadores se sintam convidados para o jantar, como explica o diretor Decio Antunes. "Faz parte do meu processo de investigação atual no teatro. Romper com a separação entre o espaço da representação e a plateia. No caso desta encenação, esse é aspecto necessário e especialmente instigante. Quem sabe intrigante para os convidados da Senhora Beckett?", indaga ele, que, em sua proposta de ocupação de diferentes espaços, apresentou espetáculos em galerias de arte, no Solar Conde de Porto Alegre (Espaço IAB) e no Museu Julio de Castilhos, entre outros locais.
Para o novo trabalho, Antunes poderá explorar a bela estrutura da Casa Godoy, uma rara construção no estilo art noveau ainda de pé em Porto Alegre. "Ela sempre foi um enigma para mim, com sua arquitetura diferenciada e sua história. E, por conta disso, na minha pesquisa de espaços, alimentava a expectativa de um dia realizar uma obra ali. Chegou o momento", afirma, entusiasmado. "Há um aspecto que se somou ao longo do tempo, ser a única fachada arquitetônica no estilo art noveau. E veja só: Samuel Beckett opta pela França - Paris, em especial - para viver, e o francês para escrever sua obra. Conexões...", compara.
Sobre uma suposta ligação entre sua personagem e o notório dramaturgo, Antunes ressalta que "a primeira coisa a dizer é que a Senhora Beckett é uma personagem de ficção". "Nada tem a ver com a Senhora Beckett real, Suzanne Deschevaux-Dusmenoil, a grande companheira da vida do Samuel Beckett. Claro, no entanto, que ao optar por dar esse sobrenome à personagem, evidencio reconhecimento a um criador que é referência artística fundamental para mim. E impressionante a atualidade de sua obra neste turbulento século XXI. Poucos se detiveram com tanto rigor e profundidade à análise da condição humana sob a luz do nosso fracasso", elogia.
Voltando à personagem, ela é interpretada por Naiara Harry, amiga e parceira profissional de Antunes há quase 40 anos. Foi a própria atriz que, durante um ensaio, ao manusear um prato, acabou encobrindo seu rosto. "Fiquei de imediato atraído pela imagem, pedi que ela repetisse e fotografei. Ao examinarmos a imagem produzida, percebemos sua potência e que, ao longo do processo dos ensaios, iria se fortalecer cada vez mais como signo. Ela fala muito ainda do meu fascínio por personagens inacabadas. E por obras que não apresentem um ponto final, mas deixem incógnita provocadora", ressalta o diretor.
O tempo é um aspecto relevante no roteiro. Ao mesmo tempo que ele fica suspenso em silêncios e relógios marcam a passagem das horas, a Senhora Beckett é uma personagem atemporal. Mesmo assim (ou justamente por isso), Antunes acredita que o espetáculo dialoga com o Brasil contemporâneo.
"A alegoria de um jantar, a criação de um rito de convívio que se instaura, provoca na relação da personagem e seus convidados momento de encontro, com todos os riscos que tal acontecimento gera. Hoje, no País - e quem sabe estendamos ao mundo -, criamos sob a égide do medo à arte. Por sua capacidade de revelar as relações humanas em sociedade, estimular o pensamento e a reflexão", pondera o diretor, lembrando que, em tempos de "discriminação do outro, da diversidade, do considerado estranho", uma personagem convida estranhos para um jantar. E eles aceitam o convite. "Esse é o público que me interessa. Capaz de espelhar-se por uma obra artística sem medo. De viver e proceder à imersão em uma experiência."
Depois da estreia, O jantar com a Senhora Beckett segue em cartaz até domingo. Na próxima semana, as sessões ocorrem de quarta-feira a sábado. Além de Decio Antunes e Naiara Harry, a equipe de criação tem Daniel Lion, nos figurinos; Guto Greca, no desenho de luz; Gustavo e Ricardo Pavão, na criação sonora; e Juliane Senna, na maquiagem. O espetáculo conta com os benefícios da Lei Rouanet e patrocínio do Banrisul Vero.
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