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Cultura

- Publicada em 09 de Julho de 2018 às 01:00

Terror além das convenções: nova leva de produções não aposta em sustos fáceis

Filmes como Hereditário são aclamados por jornalistas mas criticados por espectadores

Filmes como Hereditário são aclamados por jornalistas mas criticados por espectadores


DIAMOND FILMS/DIVULGAÇÃO/JC
Você vai ao cinema assistir ao que é, supostamente, uma história aterrorizante. Espera levar susto e pular da cadeira. Para sua frustração, nada disso acontece. Termina a sessão se perguntando por que o filme, elogiado por críticos, foi rotulado como um terror.
Você vai ao cinema assistir ao que é, supostamente, uma história aterrorizante. Espera levar susto e pular da cadeira. Para sua frustração, nada disso acontece. Termina a sessão se perguntando por que o filme, elogiado por críticos, foi rotulado como um terror.
Não é de hoje a discrepância de opinião entre público e crítica, mas essa polarização tem se manifestado de forma mais curiosa de uns tempos para cá. A razão são as obras indies, que, nos últimos cinco anos, convencionou-se chamar de "pós-terror". Aclamadas por jornalistas, mas em parte espinafradas pelos espectadores - sendo Hereditário, atualmente em cartaz, um dos exemplos mais emblemáticos -, elas frustram a expectativa do que se espera do gênero. Em vez de susto fácil (normalmente acompanhado por um boom da trilha sonora), investem em narrativas dramáticas e artísticas. E voltam a levantar a pergunta: o que, afinal, um filme precisa ter para ser considerado um terror?
Mesmo pesquisadores do assunto não chegam a um consenso. Mas há certos elementos comumente atribuídos ao gênero. Um dos mais importantes é a presença, na trama, de uma ameaça inexplicável ou iminente aos personagens, conforme explica a cineasta Gabriela Amaral Almeida, que traça uma linha entre terror e horror.
"Se os personagens estão diante de fenômenos que escapam à explicação científica, como fantasmas, provavelmente é um horror. É o medo do desconhecido, do inominável. Já o terror é ligado a um medo mais palpável, como violência e sofrimento, visto em filmes com assassinos e psicopatas", afirma a diretora, que assume "com orgulho" o rótulo de terror em seu longa O animal cordial, em cartaz a partir de 9 de agosto.
Já a pesquisadora Laura Loguercio Cánepa, cuja tese de mestrado fala sobre o terror no cinema brasileiro, rejeita essa separação. Mais importante do que amedrontar o espectador, ela argumenta, o terror deve afligir seus personagens. "É essa a definição técnica, porque o medo é um sentimento subjetivo. Uma coisa só é assustadora de acordo com o local e a época em que é produzida. Se você diz 'ah, não fiquei com medo', não interessa", coloca ela, dando como exemplo comédias de terror como Gremlins (1984). "A graça aí vem justamente do descompasso entre o que você julga assustador e como os personagens reagem à ameaça."
Para ela, muitas pessoas confundem terror com "filme de susto" e acabam se decepcionando ao se deparar com algo diferente. "O jump scare trabalha com o impacto sensorial. É divertido, mas não é uma obrigação do terror", afirma Laura.
No caso de Hereditário, a falta de sintonia entre crítica e público ainda é alvo de debate. O longa de Ari Aster recebeu nota D (numa escala que vai de A a F) na CinemaScore, empresa norte-americana que pesquisa a opinião dos espectadores. "O crime do filme foi ser mais artístico do que sensacionalista", contra-atacou o crítico Owen Gleiberman na revista Variety.
Com isso, a publicação alega que, hoje em dia, os terrores que conseguem se tornar hits tendem a ser barulhentos e exagerados. Para a Hollywood Reporter, Hereditário joga fora convenções do gênero e põe o espectador num "território desconhecido", o que explicaria muita gente ter torcido o nariz. "Terror é mais do que medo, susto, carnificina e escuridão. É perda, luto e sensação de impotência", diz a revista, referindo-se aos principais temas da trama.
Também aclamados pelos especialistas, A bruxa (2015) e Ao cair da noite (2017) foram classificados com os selos C- e D, respectivamente, no CinemaScore. Mãe! (2017) entrou para o panteão dos 19 títulos a receber nota F desde a criação da empresa, em 1978. A parábola bíblica de Darren Aronofsky foi vendida como terror, algo que sofreu questionamentos.
 "É um gênero cíclico. Há ondas de terror asiático, depois sobre fantasmas, então os psicológicos... Fico imaginando como seriam recebidos, hoje, filmes como Repulsa ao sexo (1964), O inquilino (1976) e O bebê de Rosemary (1968)", pondera Carlos Primati, pesquisador de cinema de terror. Ele explica que o "pós-terror" resgatou ideias apresentadas na trilogia de Roman Polanski e em outros clássicos, nos quais havia, no centro da trama, dramas familiares.
Uma das características do gênero, diz Primati, é mexer com medos inconscientes do espectador. Atire a primeira pedra quem nunca dormiu de luz acesa após ver um filme aterrorizante. É exatamente isso o que diferencia o terror do suspense. "Um dos objetivos do terror é despertar medos irracionais que você nem sabia que tinha", afirma.
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