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Teatro

- Publicada em 03 de Julho de 2020 às 03:00

A história enquanto farsa: teatro e política

Antonio Hohlfeldt
Se observarmos a história da dramaturgia, de um modo geral, e a história do espetáculo, mais especialmente, vamos observar que, a exemplo de outras realidades do universo da humanidade, certas práticas e certas características aparentemente se repetem. Se prestarmos mais atenção, contudo, vamos descobrir que elas se repetem falsamente, ilustrando uma afirmação de Karl Marx de que a História acontece duas vezes, a primeira enquanto tragédia, e a segunda enquanto farsa. É claro que a expressão "farsa" acabou ganhando, entre nós, uma conotação pejorativa, negativa. Mas deve-se lembrar que o termo, originalmente, tinha outro sentido. No latim, a palavra implicava o sentido de recheio (de farcire/rechear). A palavra foi utilizada sobretudo no teatro, desde a Grécia, e ganhou especial relevo na Idade Média, enquanto um gênero específico de espetáculo. Se o sentido mimético do espetáculo tinha a ver com a imitação (mais ou menos fiel e realista, neste sentido) de uma determinada ação, a farsa pressupunha um recheio, quer dizer, acréscimos, e tinha a ver com as máscaras que originalmente eram realizadas com esta denominação. "Recheava-se" o personagem ou a situação original, acrescentando-lhe detalhes e elementos. Com que fim? Com o fim de criticar aquele personagem ou situação. Ou seja, o recheio "aumentava" ou ampliava a qualidade ou a característica do personagem ou da situação, com o fito de, aumentando-a, torná-la mais visível e, em consequência, mais evidente no seu desvio, na sua má qualidade, no seu mau comportamento, etc., servindo de crítica e de mofa para os que a assistissem, atuando, assim, com juma função social de moralidade.
Se observarmos a história da dramaturgia, de um modo geral, e a história do espetáculo, mais especialmente, vamos observar que, a exemplo de outras realidades do universo da humanidade, certas práticas e certas características aparentemente se repetem. Se prestarmos mais atenção, contudo, vamos descobrir que elas se repetem falsamente, ilustrando uma afirmação de Karl Marx de que a História acontece duas vezes, a primeira enquanto tragédia, e a segunda enquanto farsa. É claro que a expressão "farsa" acabou ganhando, entre nós, uma conotação pejorativa, negativa. Mas deve-se lembrar que o termo, originalmente, tinha outro sentido. No latim, a palavra implicava o sentido de recheio (de farcire/rechear). A palavra foi utilizada sobretudo no teatro, desde a Grécia, e ganhou especial relevo na Idade Média, enquanto um gênero específico de espetáculo. Se o sentido mimético do espetáculo tinha a ver com a imitação (mais ou menos fiel e realista, neste sentido) de uma determinada ação, a farsa pressupunha um recheio, quer dizer, acréscimos, e tinha a ver com as máscaras que originalmente eram realizadas com esta denominação. "Recheava-se" o personagem ou a situação original, acrescentando-lhe detalhes e elementos. Com que fim? Com o fim de criticar aquele personagem ou situação. Ou seja, o recheio "aumentava" ou ampliava a qualidade ou a característica do personagem ou da situação, com o fito de, aumentando-a, torná-la mais visível e, em consequência, mais evidente no seu desvio, na sua má qualidade, no seu mau comportamento, etc., servindo de crítica e de mofa para os que a assistissem, atuando, assim, com juma função social de moralidade.
Por isso os poderosos a temiam e a população a adorava. Além de se divertir, o espectador da farsa pode ainda, de certo modo, vingar-se de uma certa situação de humilhação que lhe teria sido causada pelo personagem representado na farsa e que estaria sendo, obviamente, ridicularizado, criticado, desqualificado.
Quando Marx diz que a tragédia transforma-se em farsa, na verdade, pode-se entender que, para ele, aquilo que, talvez, numa primeira vez era impossível de ser evitado, na segunda poderia sofrer evidentemente uma derrota, desde que não fosse, uma vez mais, considerado "natural", pois tornara-se uma falsa repetição, porque, na verdade, poderia ter sido evitado. Mais claro: deveria ser evitável se a sociedade se antenasse a respeito do ocorrido.
Ora, o que estamos assistindo ao longo dos últimos vezes, em nosso País, tem sido exatamente uma tragédia travestida em farsa. Na primeira vez, as coisas são consideradas a sério e assumem um ar de tragédia. Quando falsamente parecem se repetir, na verdade ganham contornos ridículos, porque estão apenas a expandir, a encher, a ampliar - até fazer rir, e não mais chorar - o que já se vivenciou 1234. Eis o momento em que o campo do teatro (1234 no conceito clássico de Pierre Bourdieu) acaba se cruzando com o campo da política. E só lançando mão do conceito dramático conseguimos entender o que está exatamente acontecendo com o Brasil.
Não é a primeira vez, evidentemente, que nosso país vive farsescamente o que, na verdade, seria uma tragédia: basta lembrar-se a desastrosa renúncia de Jânio Quadros, em 1961. Hoje, repetimos farsescamente, o que poderia ser trágico: nomeação de ministros que surgem carregados de títulos e que depois descobrimos serem falsos. Presidentes da República que registram teses que jamais escreveram. Secretários de Estado que pretenderam ter soluções mágicas para os desafios da pandemia e que logo revelam-se responsáveis por desvios fraudulentos de verbas públicas dirigidas justamente à saúde, etc., etc., etc. Tenho aproveitado este período para reler alguns clássicos, como François Rabelais e Laurence Sterne, sem esquecer o inolvidável Miguel de Cervantes. Aliás, uns citam aos outros, dependendo de seu surgimento na cronologia artística. Todos se leram, todos se inspiraram uns nos outros e todos, uns mais ou outros menos, não se levaram tão a sério quanto nós os tornamos: eles sabiam que, o primeiro era original, todos os demais, eram farsas. Mas quem teria sido, de fato o primeiro?
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